As crianças têm essa magnífica capacidade de abstração, que torna mais fácil colmatar ausências desde que não lhes falte o essencial. Se não têm o último modelo da nave do Star Wars, brincam com um pedaço de madeira voadora. Se não têm um parque de diversões, rodam pneus velhos, sobem às árvores, vagueiam por casas abandonadas. The Florida Project é, antes de mais, um filme sobre essa magia da infância. O realizador, Sean Baker, tem a magnífica capacidade de se colocar ao nível dos mais pequenos e captar todo o universo infantil, ainda que em ambiente aparentemente adverso. Isso não se faz apenas deslocando a câmara para um nível mais baixo, mas revelando uma eficaz empatia e intimidade com aquele universo.
Moonee vive numa espécie de bairro social à americana; a mãe, extremamente nova, está a meio caminho entre a hippie e a indigente. Um espírito selvagem. A relação entre mãe e filha chega a ser bonita. No fundo, ela projeta na infância da filha a sua sede de liberdade e um certo estar antissocial. A relação não é desafetada, há apenas uma ausência de regras sem sombra de punição e de castigos. As traquinices são lidas como uma celebração da infância em todo o seu esplendor. Mesmo que isso signifique cuspir para os carros dos vizinhos ou cortar a luz do condomínio. Ironicamente, este mundo de crianças pobres mas bem remediadas passa-se nos arredores da Disney de Orlando, onde os mais ricos vão desfrutar de sofisticados divertimentos infantis.
No meio disto tudo, está Willem Dafoe, em mais um grande papel, como gerente do condomínio (Dafoe esteve nomeado para o Oscar para Melhor Ator Secundário, mas não ganhou). É o homem das regras, um anjo da guarda infinitamente paciente, com uma conceção vasta e quase ternurenta do seu papel. E com aquela capacidade rara de resumir tudo num esgar.
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The Florida Project > TVCine 3 > 13 ago, seg 22h30