Ao anunciar o novo álbum, Bottle It In, Kurt Vile referiu-se-lhe como o “melhor”, “mais profundo” e também “mais esquisito” da sua já extensa discografia. Profundidade e esquisitice são, aliás, duas palavras que podem bem fazer parte de uma definição da obra deste cantor, compositor e exímio guitarrista de Filadélfia, que se deu a conhecer como membro dos War on Drugs, mas cuja carreira a solo (na companhia dos sempre fiéis The Violators) o transformou num dos novos heróis do folk rock alternativo norte-americano, que consegue superar-se a cada novo trabalho.
Para isso, tem-lhe bastado manter a matriz da sua música, baseada na melhor tradição do folk rock (comparações com Neil Young e Tom Petty surgem de forma recorrente, como uma espécie de carimbo de qualidade de que Kurt Vile cada vez menos necessita). Um dos seus maiores dons, enquanto escritor de canções, é o modo como transforma letras pessoais e biográficas em algo que a todos toca – seja quando conta algo tão supérfluo como as artimanhas usadas para não pagar estacionamento na cidade de Filadélfia, em Loading Zones, seja quando desbrava os recantos mais obscuros da sua confusa mente em Bassackwards, denso exercício de psicadelismo folk com quase dez minutos.
Essa é outra característica de Kurt Vile: o modo como se está nas tintas para as regras de um mercado cada vez mais virado para o consumo imediato. Três canções com cerca de dez minutos cada, num disco com quase hora e meia de duração, é coisa de outras eras, quando havia tempo para se ouvir um álbum do início ao fim, recomeçando vezes sem conta até lhe reconhecermos todos os detalhes. É o que apetece fazer com este Bottle It In.
Já com sete discos em nome próprio − um deles, Lotta Sea Lice, de 2017, em parceria com Courtney Barnett −, Kurt Vile tem-se posicionado na linha da frente do novo folk rock norte-americano. Bottle It In é mais um passo nessa direção