O melhor caminho nem sempre é o que implica uma menor distância entre o ponto A e o ponto B. Isso é por demais evidente quando nos lançamos pela Rota do Românico do Vale do Sousa (RRVS). O jornalista liga para a sede da rota e diz ao que vai. Tem menos de 24 horas para conhecer alguns dos monumentos românicos mais significativos da região (actualmente, são 21), aceitando desvios por outros períodos históricos e curiosidades, com paragem obrigatória para uma boa refeição. Passados três dias, chega-lhe a casa o programa: meia dúzia de dignos representantes patrimoniais, surpresas gastronómicas, bons vinhos a acompanhar, paisagens bucólicas. Mais do que seguir rigorosamente um mapa, traz consigo um conjunto de experiências que lhe dão uma imagem mais rica do território.
A grande vantagem da RRVS é, exatamente, elaborar pacotes à medida dos visitantes. Basta consultar a página da internet (ver caixa) para se ter uma ideia da variedade das ofertas deste românico, com sugestões pensadas para amantes da adrenalina, famílias, românticos, festeiros, bons garfos ou caminhantes. “Tentamos dar às pessoas aquilo que elas querem sentir”, diz Rosário Machado, a diretora da RRVS (ver entrevista).
O projeto, iniciado há 12 anos por seis autarquias Castelo de Paiva, Felgueiras, Lousada, Paços de Ferreira, Paredes e Penafiel tem dado os seus frutos e, este ano, conquistou três distinções: o primeiro prémio na categoria de melhor projeto de requalificação público, atribuído pelo Turismo de Portugal; o troféu Fitur Feira Internacional de Turismo que decorre em Madrid; e o prémio Novo Norte Civitas, dado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN). A qualidade foi de tal forma reconhecida que a rota foi alargada a mais seis municípios da região do Tâmega e Baixo Douro: Amarante, Baião, Celorico de Basto, Cinfães, Marco de Canaveses e Resende.
O ROMÂNICO DO VALE DO SOUSA
O alargamento faz todo o sentido, até se tivermos em conta a partilha de marcas peculiares da arquitetura românica. Sobretudo, características escultóricas. Carla Moreira, a nossa guia, vai apontando em cada monumento estas particularidades, nos temas e nas técnicas. “Vejam os capitéis e os frisos, os motivos são mais bem desenhados [devido à utilização da técnica do bisel]. E os portais, normalmente, têm temas animalistas ou vegetalistas.” Uma semelhança que se explica pelo facto das famílias nobres os grandes mecenas deste património estenderem a sua influência a ambas as regiões, que, à época, não estavam divididas administrativamente.
Contemporâneo da fundação da nacionalidade, o românico é testemunha da importância das famílias nobres do Vale do Sousa, que tiveram um papel muito ativo durante a Reconquista Cristã. Com o favorecimento de reis e de nobres, várias ordens religiosas se implantaram neste território. Daí que, embora existam exemplares da arquitetura civil, a RRVS seja, sobretudo, preenchida com mosteiros e igrejas, enquadrados por cenários bucólicos. Todos alvo de requalificação.
Veja-se o mosteiro beneditino de Santa Maria do Pombeiro, em Felgueiras, revelador da habitual implantação das comunidades monásticas nas melhores terras agrícolas. Nas suas redondezas verdejantes não se ouve vivalma. Dali partem dois percursos pedestres, para quem queira conhecer melhor este enquadramento rural. Já no Mosteiro do Salvador de Paço de Sousa, em Penafiel, encontramos um pintor a inspirar-se neste ex-líbris da rota, que guarda, no interior da capela-mor, o túmulo de Egas Moniz, o aio de D. Afonso Henriques. Na envolvente, temos um parque de merendas, com muitas sombras e um pequeno riacho. Em Paredes, somos recebidos no Mosteiro de São Pedro de Cête por Dona Ana, idosa miúda, de olhar vivo e passo lesto. “Abro as portas a quem pede, só se não puder”, conta a caseira. Sendo um dos monumentos mais tardios da rota, na transição para o gótico, encanta pelos traços singelos. Marcante será ainda, pela singularidade da construção nomeadamente, a original decoração do portal, a visita ao Mosteiro de São Pedro de Ferreira, em Paços de Ferreira.
PARA ALÉM DA ROTA
Ao longo do percurso, várias fugas ao românico são possíveis. E não faltam surpresas. Conhecíamos a fama que vem de longe do pão-de-ló de Margaride, mas não poderíamos imaginar que a sua produção se mantinha praticamente igual há 110 anos. Ao entrarmos no local, no centro de Felgueiras, parecemos invadir uma fotografia de época. A decoração profusa da escadaria, o forno a lenha, as antigas masseiras, tudo nos remete para uma viagem no tempo. A fundação da casa remonta a 1730 e, desde sempre, manteve-se na mesma família.
Outros exemplos merecem uma atenção especial. A magia e a fantasia aplicada nos jardins da Quinta da Aveleda, em Penafiel, famosa pelos seus vinhos verdes. Ou o novo museu municipal de Penafiel dedicado à história local, arqueologia e etnografia, instalado no recuperado palacete setecentista dos Pereira Lago e, curiosamente, uma das últimas obras de Fernando Távora (em conjunto com o seu filho). E ainda o castro de Monte Mozinho, também em Penafiel, um povoado fortificado, de considerável dimensão, com o devido centro interpretativo. Quanto a restaurantes, não faltam bons representantes da cozinha regional. É o caso do Cozinha da Terra, em Paredes, aberto na antiga e acolhedora Casa de Louredo, onde nasceu a proprietária, Teresa Ruão. Um exemplo de bem servir, com muita simpatia, arte e engenho. Para um programa gastronómico mais completo, Lousada criou ainda as rotas gourmet. Existem três sugestões para um dia inteiro à mesa, com passagens por algumas das mais bonitas casas senhoriais do concelho. Também integrada nesta rota está a Quinta de Lourosa. Uma paragem obrigatória para os adeptos do enoturismo, conduzida pela jovem enóloga Joana de Castro, outra excelente embaixadora da região. Existem provas de vinhos, passeios pelas vinhas com explicação técnica e, quem sabe, a partir dali, os visitantes não ficam tentados a uma estada na unidade de turismo rural. Afinal, é Rosário Machado quem diz: “A rota não se visita apenas num dia, as pessoas são sempre bem-vindas para conhecer coisas novas e diferentes.”
+ INFORMAÇÕES
O site oferece descrições sobre os monumentos da rota, a arte românica, percursos pensados de um a quatro dias, informações úteis (mapas, onde dormir e comer), além de ter um programa em que o visitante pode construir a sua própria rota. Para quem gosta de ir pelos seus próprios pés, é uma excelente ferramenta.
CONTACTO VALSOUSA
Associação de Municípios do Vale do Sousa
Rota do Românico do Vale do Sousa Praça
D. António Meireles, 45, Lousada
T. 255 810 706/ 91 811 6488
E-mail: rrvs@valsousa.pt
9h-12h30, 14h-17h30
As visitas guiadas, para mais de 20 pessoas, deverão ser marcadas com uma antecedência mínima de três dias. Mas este gabinete ou um dos quatro centros de informação, poderão também fornecer mapas e guias preciosos para um dia bem passado.