Um novo estudo, realizado por investigadores da Universidade Temple e da Universidade de Pittsburgh, ambas na Pensilvânia, EUA, concluiu que variar o que estudamos e espaçar as nossas aprendizagens ao longo do tempo é benéfico para a memória, dependendo daquilo que estamos a tentar apreender ou recordar.
O efeito de espaçamento tem sido estudado há muitos anos: no século XIX, o psicólogo alemão Hermann Ebbinghaus relatou este fenómeno de aprendizagem no seu livro “Memória: uma contribuição para a psicologia experimental”, de 1885. Nele, explicou que a retenção de uma lista de materiais verbais, repetida seis vezes no mesmo dia, era inferior a outra situação em que a lista era repetida uma vez por dia, durante seis dias.
Esta observação, que sugeriu que a informação é mais eficazmente codificada na memória a longo prazo quando as sessões de aprendizagem são intercaladas com grandes pausas, tem sido apoiada por vários estudos realizados nos últimos 100 anos, mas ainda não se percebeu exatamente como a memória é reforçada neste fenómeno.
Um estudo do Instituto Max Planck publicado na revista científica Current Biology em 2021 tentou compreender, através de testes em ratos, como funciona este efeito de espaçamento. Na experiência, os animais tiveram de encontrar um pedaço de chocolate num labirinto em três tentativas, com diferentes períodos de tempo entre elas.
Annet Glas, neurobióloga e uma das autoras desse estudo, salientou que, a curto prazo, “os ratos que foram treinados com os intervalos mais longos entre as fases de aprendizagem não foram capazes de se lembrar da posição do chocolate tão rapidamente”, mas, “no dia seguinte, quanto mais longas foram as pausas, melhor foi a memória dos ratos”.
“Por exemplo, se estudar na noite anterior a um teste, pode lembrar-se das informações no dia seguinte a esse teste, mas vai esquecer-se delas em breve”, refere Benjamin Rottman, professor associado de psicologia e um dos autores do novo estudo.”Em contraste, se estudar em dias diferentes antes do teste, será mais provável lembrar-se do conteúdo durante um longo período de tempo”, acrescenta.
O este estudo traz de novo
A maioria das investigações sobre o efeito de espaçamento tem-se focado na ideia de que aquilo que se está a tentar aprender repete-se de forma idêntica todas as vezes mas isso raramente acontece na vida real, ou seja, alguns fatores das nossas experiências reais podem permanecer iguais, mas outros não – ir a um café com regularidade, por exemplo, pressupõe certas caraterísticas externas iguais e outras diferentes.
Nesta nova investigação, publicada na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), os investigadores realizaram duas experiências com voluntários, pedindo-lhes que estudassem repetidamente pares de itens e cenários que eram idênticos em cada repetição ou então em que o item permanecia o mesmo, mas o cenário mudava.
Numa das experiências, foi realizada uma abordagem diferente: os participantes deviam testar a sua memória através dos seus smartphones, estudando pares de amostras – amostras que são emparelhadas para comparação num estudo conjunto- várias vezes ao dia, ao longo de 24 horas, o que permitiu perceber com maior exatidão a forma como se apreende a informação. Já na segunda experiência, a equipa recolheu e analisou dados online apenas numa única sessão.
Emily Cowan, autora principal do artigo, refere que “a combinação destas duas experiências em grande escala” permitiu “analisar o momento destes “efeitos de espaçamento” em escalas de tempo longas”: de horas a dias, na experiência nº 1, e em escalas de tempo curtas, e de segundos a minutos, na experiência nº 2. “Utilizando estas duas concepções, poderíamos examinar de que forma o material que se assemelha mais às nossas experiências de repetição no mundo real – em que alguns aspetos permanecem os mesmos, mas outros diferem – tem impacto na memória se formos expostos a essa informação numa sucessão rápida versus em intervalos mais longos… de segundos a minutos, ou de horas a dias”, acrescenta.
Uma das conclusões da equipa foi, sem surpresa, que a aprendizagem espaçada é benéfica para a memorização de itens. Além disso, deu conta de que a memória era melhor nos itens que tinham sido emparelhados com “cenas” diferentes, em comparação com os que eram mostrados com a mesma cena. Como exemplo, a equipa explica que se quisermos recordar o nome de uma pessoa nova, repetir o nome mas associá-lo a informações diferentes sobre essa pessoa pode ser útil.
Por outro lado, “a memória associativa – memória para o item e para a cena com que foi emparelhado – beneficia da estabilidade”, diz Rottman. Neste caso, o efeito de espaçamento apenas foi benéfico para a memória “para os pares que se repetiam exatamente, e apenas se houvesse intervalos muito longos – horas a dias – entre as oportunidades de estudo”. “Por exemplo, se estivermos a tentar lembrar-nos do nome de uma nova pessoa e de algo sobre ela, como a sua comida favorita, é mais útil repetir o mesmo par exato de nome e comida várias vezes, com espaçamento entre cada uma delas”, diz Rottman.
“Em teoria, as nossas descobertas devem ser amplamente relevantes para diferentes tipos de tarefas, como recordar o nome de alguém e coisas sobre essa pessoa, estudar para um teste e aprender vocabulário novo numa língua estrangeira”, acredita Rottman. “Ao mesmo tempo, como todos estes tipos de tarefas têm muitas diferenças, é difícil dar conselhos concretos. Teríamos de fazer investigação de acompanhamento para dar orientações mais concretas para cada caso”, ressalva.