É a primeira vez que tal acontece: um paciente totalmente paralisado e impossibilitado de comunicar com o mundo exterior, em virtude de sofrer da doença degenerativa ELA (esclerose lateral amiotrófica), conseguiu expressar-se com a ajuda de dois implantes cerebrais.
A ciência ainda não havia conseguido demonstrado que um ser humano totalmente incapaz de movimentar qualquer músculo do corpo de forma voluntária, inclusive os olhos, poderia dar ordens a um computador, de modo a processar palavras e frases indicadoras dos seus desejos e necessidades, só através da força do pensamento. Ao ritmo de uma letra por minuto, sensivelmente, o paciente de 36 anos submetido a esta experiência é capaz de construir frases por via de respostas do tipo “sim” ou “não”, em reação ao som de cada letra.
Durante os testes que se seguiram à cirurgia para implantar os dois chips no cérebro, realizada em 2019, foi pedido a este cidadão alemão que imaginasse movimentos com as mãos ou a língua, por exemplo, de forma a gerar estímulos elétricos distintos para cada uma das duas respostas possíveis, sem sucesso. Mas, quando começou a projetar movimentos com os olhos, as palavras começaram a formar-se.
Foi o próprio paciente quem informou a equipa de investigadores que estava a imaginar movimentos com os olhos para transmitir as mensagens. Sopa de ervilhas e de goulash (húngara) foram dos primeiros pedidos para saciar a gula. Quanto à sede, fez saber: “Quero uma cerveja.” Uma massagem na cabeça, solicitada à mãe, é outro exemplo de um desejo expresso, assim como a manifestação de sentimentos: “Amo o meu filho.”
Nem tudo são boas notícias, porém. O paciente, que vive na Alemanha, tem vindo a sentir maiores dificuldades para comunicar à medida que o tempo passa, sem que os motivos estejam determinados. No entanto, a experiência deixa a comunidade científica na expectativa de poder abrir caminho a um novo método de comunicação a pessoas que não o conseguem estabelecer contacto com familiares e amigos de outra maneira, inclusive de pacientes que sofrem de outras doenças altamente incapacitantes, a este nível.
Este estudo foi publicado na passada terça-feira, 21, no jornal científico Nature Communications. O paciente em causa deu autorização à cirurgia ao seu cérebro em 2018, numa fase da evolução da ELA em que ainda conseguia comunicar através do movimento efetivo dos olhos. Tinha sido diagnosticado três anos antes, aos 30. Em poucos meses, deixou de conseguir andar e falar. Em menos de um ano, ficou dependente de um ventilador para respirar. A esclerose lateral amiotrófica é a mesma doença que vitimou o conhecido físico britânico Stephen Hawking.