Os enfermeiros portugueses estão a travar uma luta desigual, disso já ninguém duvida (segunda-feira 23, soube-se que dos 1600 infetados, 165 eram profissionais de saúde, 86 médicos e 37 enfermeiros, 8% do total). Eles agradecem as palmas da população, descartam o epíteto de super-heróis e aproveitam as redes sociais para desabafar e nos mandar ficar em casa. Nos últimos dias, esses lamentos têm subido de tom e as razões são quatro, além do evidente cansaço acumulado: as notícias de que alguns portugueses continuam a passear-se como se nada se estivesse a passar, a entrevista de António Costa à TVI, declarando que não faltam meios no Serviço Nacional de Saúde, a questão do isolamento profilático que se descontará nas horas extra e da baixa que não será paga a 100% em caso de infeção.
“Estamos num pais da brincadeira…. os profissionais de saúde a fazer tudo o que podem, a maior parte da população a cumprir o isolamento… meia dúzia de “inteligentes” vão passear para a praia… Póvoa de Varzim. Não será a hora de o governo adoptar medidas duras para esta gente tola???”, é assim que Fernando Felgueiras reage, no grupo Enfermeiro.pt, depois de ler acerca da invasão de pessoas à marginal desta cidade do norte do País, no domingo, 22.
“Será preciso andar-se de altifalante em todos os locais, ruas e esquinas a alertar a população/cidadãos para ficarem em casa, perante a pandemia Covid-19 e o estado de emergência decretado pelo Sr. Presidente da República? É triste ver-se os profissionais de saúde, hospitais e centros de saúde em desespero pela falta de recursos e meios e muitos destes profissionais a ficarem também contagiados e doentes e, em contra-ponto, ver-se o povo a desfrutar de passeios, de forma irresponsavelmente aglomerada nas marginais, cafés a jogar cartas e outros locais, perfeitamente descontextualizados da realidade que estamos a viver”, assim escreve Humberto Domingues, enfermeiro especializado em saúde comunitária, no seu blogue Enfermagem nas Letras.
Há outras questões a preocuparem estes profissionais de saúde, como se percebe por estas palavras de Mauro Vicente: “Alguns hospitais e centros de saúde estão a chamar para trabalhar de forma indiscriminada as colegas que ficaram em casa com os filhos por força do fecho das escolas. Estão cheios de vontade de aplicar a medida de enfiar os filhos de profissionais de saúde numa escola qualquer, como se não houvesse risco de contágio.”
E, em resposta às declarações do Primeiro-ministro, a enfermeira Ana Paiva alerta para o facto de ela e os seus colegas estarem “a trabalhar sem material de proteção adequado, pondo-nos em risco e a toda a população com que estamos em contacto.” Ela garante, que “as denúncias são aos milhares, ditas pelos profissionais do terreno e pelos bastonários da Ordem dos Enfermeiros e dos Médicos. Temos já uma taxa de 10% de profissionais infetados com Covid-19 e uma das causas é a falta de equipamento adequado.” Basta uma leitura em diagonal num grupo destes profissionais de saúde e percebe-se as condições em que têm trabalhado, a que se junta, muitas vezes, o afastamento profilático das suas famílias.
E depois, ainda há questão dos testes, que não estão a ser feitos ao ritmo que deveriam: “Sou enfermeira, estou neste momento em isolamento profilático porque tive contacto próximo com um caso positivo. Tenho tosse, rinorreia e cefaleia e não fui validada para teste”, escreve Clara Duarte na rede Twitter.