Quando fechou os seus últimos reatores nucleares, em abril deste ano, a Alemanha passou a ter de queimar (muito) mais gás e carvão para compensar as perdas na produção de eletricidade. Além disso, passou a ter de comprar energia elétrica aos seus vizinhos, sobretudo a França – energia essa produzida, na sua maioria, ironicamente, por centrais nucleares.
Esta decisão, tomada na sequência do acidente nuclear de Fukushima, em 2011, obrigou ao aumento das importações de combustíveis fósseis (carvão e gás), e numa altura em que estes se encontram a preços muito elevados, o que decorre, em grande parte, da invasão russa da Ucrânia, pressionando a indústria germânica, que paga hoje 160% mais pela eletricidade do que pagava em 2019, antes da pandemia.
Mas o encerramento dos reatores está também a ter impactos tremendos no clima, devido ao aumento das emissões de dióxido de carbono resultantes da queima de carvão (a energia nuclear não emite gases com efeito de estufa). Durante o verão, a energia solar foi suficiente para cobrir as perdas do nuclear, mas no inverno – o primeiro em décadas no país sem energia nuclear própria – a produção fotovoltaica será mínima, o que obrigará à queima de milhões de toneladas de carvão.
Face aos efeitos negativos do descomissionamento das centrais que se estão a verificar, a organização não governamental RePlanet lançou, esta sexta-feira, uma petição para “Reiniciar a energia nuclear alemã”https://www.replanet.ngo/germannuclearrestart.
“É uma emergência climática!”, lê-se na página da campanha. “O inverno levará a Alemanha a consumir mais carvão e gás. No entanto, a Alemanha tem seis reatores que podem ser reiniciados em pouco tempo para produzir eletricidade com baixo teor de carbono… A eliminação progressiva da energia nuclear alemã foi um desastre para a Alemanha, visto que o país não conseguiu atingir os seus objetivos climáticos, impactando gravemente a indústria e causando elevados custos de energia desnecessários e socialmente injustos para os consumidores.”
A associação internacional, que tem uma delegação em Portugal, sublinha que, já em abril, no mês do encerramento dos reatores que ainda restavam, 25 cientistas, entre os quais dois prémios Nobel da Física, assinaram uma carta aberta pedindo ao governo alemão que mantivesse os reactores nucleares em funcionamento “para aliviar a crise energética e ajudar a alcançar as metas climáticas da Alemanha”.
Na base da petição, encontra-se um relatório a concluir que, ao contrário do que tem sido veiculado, é relativamente fácil e rápido (em alguns casos, em apenas nove meses) reativar as centrais nucleares encerradas. O mesmo relatório, publicado em julho, diz que dois terços dos alemães são favoráveis à continuação da energia nuclear no país, de acordo com os resultados de um inquérito realizado a 11 de julho.
A análise estima ainda que, sem o fecho gradual dos reatores, a Alemanha teria conseguido produzir, o ano passado, 74% da sua eletricidade a partir de fontes sem emissões; em vez disso, ficou-se pelos 50%.
“Reiniciar oito dos reactores nucleares da Alemanha é possível e praticável”, remata o relatório, no sumário exercutivo. “Não foram identificados obstáculos intransponíveis. São necessárias decisões rápidas e consistentes a nível político e administrativo. O mais importante é decretar um congelamento das atividades de desmantelamento das centrais elétricas enquanto se aguardam alterações à Lei da Energia Nuclear. Os serviços públicos e os parceiros industriais devem então negociar contratos de compra de energia que apoiem o custo e o calendário dos reinícios.”
O encerramento das centrais e a necessidade de recorrer ao carvão não tem sido um tema pacífico na Alemanha. Em janeiro, a mina de Garzweiler foi alvo de grandes manifestações, para tentar impedir o alargamento. Atualmente, a mina produz 25 milhões de toneladas de carvão por ano, o que resulta na emissão de 40 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (62,5% das emissões totais de Portugal). Durante os protestos, a ativista sueca Greta Thunberg foi detida e identificada.