O setor da construção é o terceiro mais poluente, depois dos transportes e da energia. Mas o facto de os materiais que lhe servem de base – o aço e o cimento – serem difíceis de descarbonizar pode levar a construção para o cimo do pódio, um lugar onde ninguém quer estar.
“Temos de tomar medidas”, avisa António Carlos Rodrigues, diretor-executivo do Grupo Casais, na Conversa Verde. “O setor dos transportes e da energia estão a fazer investimentos massivos. Eles vão deixar de estar à nossa frente. Não gostaria de ter a mesma conotação das indústrias ligadas à exploração petrolífera. A construção vai ser um alvo a breve trecho, porque somos de facto uma indústria muito extrativa.” Se, com sete mil milhões de pessoas já esgotámos os recursos, acrescenta, “como será quando formos dez mil milhões?”.
Já estão a ser feitos ajustes, nomeadamente através da eletrificação e do recurso a fontes de energia renováveis. Mas uma das apostas com melhores resultados, no que respeita à sustentabilidade, é a aposta na construção off-site, em que os componentes são produzidos numa fábrica e depois montados no local, diz o gestor. “O que faz sentido é que este ciclo de crescimento das próximas décadas seja com soluções de materiais e soluções construtivas que podem ser reutilizadas. O off-site vem dar uma resposta à mentalidade do “design for change”: o que estamos a construir tem de ser pensado para a mudança. Se não pensarmos nos edifícios como algo adaptável, estamos a criar um problema para as gerações futuras. Este é um tipo de construção que acrescenta património com elementos e componentes que podem vir a ser reutilizados nos próximos milénios.”
Esta mudança não se faz, no entanto, de um dia para o outro. Mas substituir o cimento e o aço por outros materiais é essencial, e passa por voltar às bases – utilização de madeira. “Começamos por aí. Para descarbonizar o planeta, temos de utilizar um material que é um armazém de carbono. A próxima geração de edifícios tem de ser cada vez mais com madeira. O Norte da Europa há muito tempo que não tem mão-de-obra e por isso elevou a qualificação das pessoas há mais tempo, o que levou ao treino de técnicas mais próximas destes processos off-site.”
O nosso país ainda segue no pelotão, lamenta António Carlos Rodrigues. “A madeira é pouco valorizada em Portugal. O fim de vida da madeira é de baixo valor. Biomassa, para aquecer as nossas casas, cofragens… A nossa madeira, maioritariamente eucalipto, liberta um valor de 20 a 30 euros por metro cúbico. Quando olhamos para o spruce [abeto], é 80, 100. A valorização para o produtor é três ou quatro vezes mais. Áustria, Alemanha, Bélgica estão todos 15 anos à frente.” Este atraso português pode vir a ficar-nos caro, devido aos objetivos a que estamos comprometidos com a União Europeia na reciclagem e reutilização. “Podemos vir a ter sérios problemas para cumprir as metas de economia circular.”
O motor da mudança não podem ser (apenas) os consumidores, avisa o CEO do Grupo Casais, porque a maioria ainda não está preparada para pagar mais por produtos “verdes”. “Um inquérito da IKEA perguntava aos clientes quantos estariam interessados se os produtos fossem mais sustentáveis, e 97% disseram que estavam interessados. Segunda pergunta: mas quantos estão disponíveis para pagar mais? A resposta foi inversa: 3%. A alavanca do consumidor é importante, mas não tem expressão.”
Há outras alavancas fundamentais, e algumas estão já em marcha. “Os fundos imobiliários estão muito atentos às metas de longo prazo, já estão a descontar no valor do ativo a desvalorização futura. Eles sabem que um ativo construído com materiais pouco sustentáveis vai ser um passivo. Estes drivers acabam por funcionar.”
A nível político, a caminhada é mais lenta no caso das administrações centrais. “Os governos ainda vão muito por reação. Os municípios são os que mais rapidamente esta a legislar. Em França, há municípios que atribuem mais 30% de área de construção se o edifício for neutro em carbono. Isso está a levar a que a reabilitação de edifícios possa acrescentar mais um ou dois pisos, o que é um incentivo para a reconstrução urbana.”
Para ouvir em Podcast