Se o tamanho importa, Portugal mostrou ser dos mais importantes na World Future Energy Summit, que decorreu entre 17 e 20 de janeiro, em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos. Do alto dos seus dois pisos, o duplex nacional destacava-se entre as largas dezenas de stands de piso térreo de outros países e de empresas do setor energético, no centro de exposições da cidade.
A imponência não era só para fazer vista. Nos outros espaços, de países e de empresas, os visitantes espreitavam as ofertas, trocavam duas palavras com os responsáveis e recebiam um panfleto; no português, os empresários acabavam os diálogos com potenciais interessados nos recatados cadeirões e salinhas de reunião do 1.º andar. O stand, estrategicamente montado junto à sala de imprensa, não era uma simples montra foi feito para fechar negócios.
A delegação de empresas nacionais presente na maior feira mundial de energias renováveis que, como habitualmente, foi patrocinada por algumas petrolíferas, sempre atentas à evolução do setor contou com a ajuda de José Sócrates. Ao contrário da maior parte dos oradores na cerimónia de abertura (entre eles Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU), que gastaram o seu tempo com clichés sobre o futuro do planeta e as criancinhas, o primeiro-ministro pronunciou um discurso pragmático, quase mercantilista, desfiado no seu inglês muito próprio. Começou por atirar à plateia uma série de números sonantes, para chamar a atenção: “Mais de 45% da eletricidade produzida é de fonte renovável”; “Somos o país com as menores emissões de dióxido de carbono per capita da Europa”; “Em 2020, 10% dos carros em circulação serão elétricos” (um número, no mínimo, otimista implica mais de meio milhão de automóveis deste tipo). E logo passou à carga, apresentando, em detalhe, o Mobi-E, o sistema de abastecimento de veículos elétricos, a principal estrela entre as ofertas portuguesas que tentam internacionalizar-se.
O certo é que Sócrates conseguiu convencer o príncipe herdeiro de Abu Dhabi a visitar o stand português antes de qualquer outro, um acontecimento com um simbolismo valioso. Resta saber se Mohammed bin Zayed Al Nahyan se deixou seduzir pelas palavras públicas do primeiro-ministro ou pelas privadas: na viagem oficial a Abu Dhabi, com uma paragem no Qatar, o Governo levava também a missão oficiosa de vender dívida soberana e apresentar a carteira de privatizações aos abastados árabes. Coincidência ou não, depois do regresso da comitiva portuguesa, surgiram notícias de que a Qatar Airways a empresa de aviação oficial da cimeira de Abu Dhabi estava interessada em comprar 40% da TAP (ver na pág. 27).
ALTAS AMBIÇÕES Poucas horas após a abertura da exposição, o secretário de Estado da Energia já se manifestava satisfeito.
“Há um interesse enorme no Mobi.E”, garantia um atarefado Carlos Zorrinho, sentado num dos sofás do stand português, enquanto almoçava meia sande. “A nossa vantagem é o valor acumulado de já termos o sistema como standard: em junho, a rede estará preparada para que se possa andar pelo País todo de carro elétrico [1 350 pontos de abastecimento].”
Zorrinho admitiu que as expectativas da viagem ao Qatar e aos Emirados Árabes Unidos eram muito altas, mas assegurou que não havia desilusões. “Assinámos um protocolo com o Qatar, na área da energia, temos bastantes sinais de investimentos em projetos concretos no turismo, na construção e na energia e estamos a apostar fortemente em Masdar.” A futura cidade de emissões zero, junto do aeroporto de Abu Dhabi e que deverá ficar concluída entre 2020 e 2025, vai precisar de uma rede de abastecimento de carros elétricos e o Governo está a tentar que o sistema seja o Mobi.E. A maior barreira aos planos portugueses é, provavelmente, o facto de Masdar estar planeada para ser uma cidade sem circulação automóvel.
Paulo Santos, da Adene (Agência para a Energia, um organismo ligado ao Ministério da Economia), confirmou os sinais “muito positivos” da presença portuguesa em Abu Dhabi, referindo-se, nomeadamente, ao Mobi.E e à certificação de edifícios. “Estamos a negociar parcerias com Masdar. E há outras em cima da mesa.”
A Adene esgrime a sua experiência de cinco anos para internacionalizar o seu produto. “Temos know how suficiente para exportar”, diz Paulo Santos. Foi com essa convicção que as outras empresas portuguesas voaram até Abu Dhabi. O objetivo é aproveitar o élan do nosso país um dos mais avançados em energias renováveis e iniciar uma onda de exportações de tecnologia, naquela que é uma das áreas mais promissoras de negócio. Para mostrar que daqui não saem só sapatos e cortiça (ainda que a cortiça também tenha estado presente, associada à eficiência energética). Conseguirá Portugal ficar entre os vencedores nesta corrida ao ouro verde?
À venda em Abu Dhabi
Mobi.E Novabase e Efacec
Figura de proa do stand português, o Mobi.E é, na prática, um sistema que permite o acesso de qualquer pessoa a uma alargada rede de abastecimento de eletricidade, através de um cartão único de pagamento (que pode ser pré-pago ou pós-pago). O conceito é simples e, até, fácil de copiar o trunfo da Efacec e da Novabase, as empresas responsáveis pela rede, está na experiência. “Quem começar isto hoje, só terá o produto pronto daqui a três anos”, diz Luís Lobo, da Novabase. Portugal espera ser o primeiro país do mundo com uma rede nacional instalada e funcional, o que servirá de montra viva para eventuais interessados estrangeiros. No final do primeiro trimestre, 1 350 pontos estarão espalhados pelas principais cidades portuguesas, um número certamente superior à quantidade de carros elétricos em circulação por essa altura. O grande senão tecnológico da rede é que só 50 destes pontos serão de carregamento rápido (20 minutos). Os outros 1 300 vão levar seis a oito horas para carregar a bateria de um carro.
Painéis fotovoltaicos Martifer Solar
Já considerada uma empresa de dimensão internacional (exporta 95% do que produz), a Martifer Solar esteve em Abu Dhabi para alargar ainda mais a sua rede de clientes estrangeiros. “A nossa fábrica é o estado da arte mundial. Isso dá-nos garantias”, assegura Gustavo Fernandes, membro da administração da empresa. Neste momento, a unidade de Oliveira de Frades tem capacidade para produzir 50 Mw por ano em painéis fovoltaicos.
Módulos solares de película fina Solar Plus
Depois de muitos anos adormecida, a energia fotovoltaica voltou a ter, nos últimos tempos, evoluções tecnológicas promissoras e diversificadas. A Solar Plus, de Oliveira do Bairro, optou por se especializar nos módulos fotovoltaicos de película fina, que permite a produção de energia através de filmes de silício aplicados diretamente em vidro. A solução é indicada para prédios de escritórios mantendo uma boa parte da transparência, as janelas com este material produzem até 70% da eletricidade consumida pelo edifício em iluminação e centrais telefónicas.
InovGrid EDP e Efacec
No futuro, tarifas bi-horárias, com dois preços de eletricidade conforme a hora a que esta é consumida, parecerão arcaicas. A InovGrid é um sistema de monitorização inteligente de energia que reduz as perdas ao mínimo equilibrando melhor os picos de procura de eletricidade e gerindo a rede com mais eficiência. Este sistema permite, por exemplo, recorrer mais a fontes de energia renováveis, diminuindo os gastos com carvão e gás natural.
Contador de eletricidade Janz
“Os países que souberem tornar a energia mais eficiente são os que vão ganhar.” Foi com esta máxima que António Papoila, administrador da Janz, tentou convencer os visitantes do stand português em Abu Dhabi a olharem duas vezes para o seu aparentemente singelo contador de eletricidade. Mas que faz mais do que parece conta, em tempo real, os consumos de eletricidade nas duas direções. Ou seja, num sistema de smart grid, um consumidor consegue ver quanto lhe está a custar a eletricidade num determinado momento e, até, injetar energia na rede quando o preço compensar (descarregando a bateria de um carro elétrico estacionado na garagem quando a eletricidade está mais cara e carregando durante a noite, quando está mais barata). Quanto maior a informação, menor o desperdício.
Mobicar CEIIA
Presente na feira de energia com um protótipo apenas ilustrativo, associado ao Mobi.E, o CEIIA (Centro para a Excelência e Inovação na Industrial Automóvel, com sede na Maia) tenta entrar no competitivo mercado dos minicarros elétricos. Até ao fi nal do ano, deverá estar pronto o primeiro e verdadeiro protótipo de três lugares, baseado no chassis de um L7 (os pequenos veículos equiparados a motociclos muito populares na população mais velha). Difícil será combater num segmento que contará, entre outros, com o Smart elétrico.
CasA+ Adene
A Agência para a Energia foi à exposição de Abu Dhabi apresentar o seu simulador de efi ciência energética em edifícios. Apesar de a certifi cação do setor ainda não existir na capital dos Emirados (embora já exista no emirado do Dubai), a viagem resultou em parcerias concretas com o projeto de Masdar, além de “estarem em cima da mesa parcerias com outras entidades”, nas palavras de Paulo Santos, representante da Adene.
Cortiça Amorim Isolamentos
O gigante português (logo, mundial) da cortiça foi aos Emirados Árabes Unidos tentar alargar o mercado de isolamento de edifícios no Médio Oriente, uma região ideal para a aplicação deste produto, pelas suas características climáticas (grandes variações de temperatura). No stand, a Amorim montou uma amostra de um telhado verde uma espécie de jardim para instalar no cimo de edifícios, com várias vantagens ambientais, montado em cima de um isolamento de cortiça. As perspetivas imediatas da empresa passam pelo uso de cortiça em Masdar, a emblemática futura cidade “emissões zero” de Abu Dhabi.