Yangon é flanqueada a sul e oeste pelo delta fértil do imenso rio Yangon, que fica apenas a 33Km do oceano e que faz dela uma das mais poderosas cidades portuárias do Sudeste Asiático. A capital estende-se por uma região com mais de 350Km2. Uma cidade tão cheia de árvores e sombras que, em alguns dos seus arredores, a floresta mágica de Mowgli não parece ser assim tão longe. Porque foi nas florestas de Burma que Rudyard Kipling se inspirou para escrever “O Livro da Selva”.
O centro, que fica na área próxima do rio Yangon, é formado por uma rede compacta de ruas, dispostas de forma acessível, que permite percorrê-lo a pé. Estas ruas são largas, com edifícios do tempo do colonialismo inglês, imensos parques, muitas árvores, flores e sombras agradáveis, onde quase a cada esquina tropeçamos com templos, mosteiros e pagodes e até uma sinagoga e a Igreja Católica da Santíssima Trindade. Para norte e perto do Shwedagon fica o imenso Parque do Povo e na zona das embaixadas no meio de uma cidade movimentada, encontramos o Kandawgyi Lake (que significa Lago Real), muito recortado, cheio de re-entrâncias, muito verde e aprazível, onde se encontra a Barca Karaweik. É uma cópia feita em cimento e pedra da barca real usada pelos reis birmaneses e uma obra notável de arte tradicional. É enorme e na proa tem representados os lendários dois pássaros Hintha, que acasalam em total monogamia e ficam de tal forma ligados um ao outro que, se um for morto, o outro deixa de comer até à morte. Chamado de Palácio Karaweik, é imprescindível uma visita. Até porque, para além de ser usado para festas e cerimónias, tem um restaurante excelente (onde jantei um ótimo buffet de comida típica e mesmo com show, paguei uma ninharia). Durante o jantar são exibidas danças tradicionais birmanesas, executadas a solo ou em conjunto, por bailarinas que se movem ora lentamente, ora muito depressa, usando a cabeça, os braços e os pés, que estão calçados apenas de meias e com os quais vão afastando as caudas longas dos vestidos, à medida que se movem, para criarem movimentos únicos que lembram vagamente um estilo chinês.
Este parque encantador ficava apenas a cinco minutos do primeiro hotel onde ficámos, o “Nikko Royal Lake Yangon”, pertencente a uma cadeia nipónica associada à cadeia do Meridien, e que tinha uma fabulosa vista do nosso quarto para o Shwedagon além de uma das mais originais piscinas onde, no dia em que chegámos, cansadas da viagem, me soube a paraíso, nadar e descansar ali! Até dormi uma sesta!
E foi à noite que o visitei, cheio de pessoas que passeavam e festejavam a Lua Cheia, (sorte a minha!), aproveitando para namorar, casais com os filhos, idosos cheios de atenções para comigo e uma enorme curiosidade e jovens que se juntavam em agrupamentos com bandas de música. E eu senti-me uma atração! Porque não encontrei ocidentais ou turistas, pareceu-me um lugar muito tradicional e muito popular entre os habitantes locais. Fizeram-me imensas perguntas (o que aliás sucedeu por todo o lado e em que o primeiro de todos era o nosso guia). A curiosidade dos birmaneses em relação aos estrangeiros e ao que se passa no mundo, é imensa! Mas são de uma simpatia contagiante, têm um charme gracioso e uma gentileza enorme na forma como nos abordam e muitos pediram-me se me deixava fotografar com eles. Claro que sim! Foi uma honra!
Apesar de se notar uma certa repressão (como quando ao passar de carro nos indicaram a residência onde Aung San Suu Kyi se encontrava em prisão domiciliária, nos foi dito pelo guia, apontando para o motorista e colocando o dedo nos lábios, em sinal de silêncio, que não era permitido mencionar o seu nome), não vimos muita polícia e espantosamente, o único incidente ocorreu com a Embaixada dos EUA. Vínhamos calmamente a passear, quando junto a uma esquina se encontrava uma mulher sentada no chão e a vender uns frutos redondos desconhecidos. Claro que a fotografámos e então reparámos que o guia estava numa enorme discussão com um guarda birmanês fardado e com um chapéu de abas tipo mosqueteiro, que gesticulava apontando para as nossas máquinas fotográficas fazendo menção de que lhas tínhamos que entregar. Gerou-se uma confusão e como não nos entendíamos acabou por chamar um segurança americano. Ora o problema era que na rua que se cruzava ficava a Embaixada dos EUA (de que ainda nem nos tínhamos apercebido e que, bizarramente em frente dela, tinha a rua dividida ao meio por bidões atados com cordas e onde à frente, realmente, havia um sinal de proibição de fotografar). Depois de conversarmos e de lhe ter mostrado na minha máquina, que era digital, as fotos tiradas e que não tinham nada a ver com a “sua” embaixada, lá nos deixou seguir! Apeteceu-me pedir-lhe para lhe tirar uma foto de recordação! Se calhar ia presa!!! E tudo isto devido ao imenso medo de ataques terroristas! Então o guia explicou-nos, tardiamente, que não era permitido fotografar edifícios públicos, etc.
No regresso da volta que fizemos pelo Myanmar, ficámos num outro hotel, pertencente à luxuosa cadeia Pansea Orient Express, o “The Governor’s Residence”, em tempos um marco da grandeza colonial e que não posso deixar de mencionar, que pertenceu ao governador dos Estados Shan. Uma imponente mansão birmanesa, feita em teca, que foi restaurada na sua glória original, com quartos luxuosos, decorados com materiais tropicais, algodões e sedas, debruçado sobre um jardim privado de lótus e uma espetacular piscina que contornava o edifício principal.
Mas as surpresas agradáveis iam continuar ao longa da nossa viagem que teve um não sei quê de conto de fadas… Tudo era tão surpreendente e diferente de tudo o que já tinha encontrado por esse mundo fora! Na próxima crónica vou-lhes falar do maravilhoso Lago Inle – um autêntico paraíso perdido.