Os relatórios sobre a falta de liberdade religiosa no mundo são cada vez mais preocupantes, dado o aumento da perseguição a milhares de pessoas por motivos religiosos a cada ano que passa. De certo modo Daniel Ortega, o ditador da Nicarágua, está a trabalhar para ficar na história ao lado de Estaline e Hitler
Um país de que estranhamente se fala muito pouco é a Nicarágua, cujos dirigentes têm sido acusados de violação sistemática dos direitos humanos e de crimes contra a humanidade. No início de Março passado foi divulgado um documento em Genebra que exigia sanções internacionais contra o país do ditador Daniel Ortega. Um grupo de especialistas em Direitos Humanos que desde 2018 estuda a situação na Nicarágua, menciona a existência de “execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, tortura e privação arbitrária da nacionalidade e do direito de permanecer no próprio país.”
A perseguição religiosa de Ortega dirigiu-se durante muito tempo essencialmente contra os católicos. Segundo um relatório compilado pela exilada Martha Molina, os 529 ataques perpetrados pelo regime desde Abril de 2018 incluíram: “Um bispo na prisão, 37 padres exilados, 32 religiosas expulsas do país, confisco de, pelo menos, 7 edifícios da Igreja, nomeadamente um convento e encerramento de meios de comunicação católicos, rádios e televisão.”
A situação é gravíssima. De acordo com os relatos, Vicente Martínez, pároco de Santa Lucía, em Matagalpa, foi ameaçado com uma metralhadora apontada à cabeça. A Igreja de San Juan Bautista, em Masatape, terá sido atacada com um morteiro. Registaram-se agressões físicas e prisão de bispos e sacerdotes.
Os frequentes ataques a religiosos, incluindo bispos, sacerdotes, diáconos, seminaristas e freiras, têm constado de “ameaças de morte, tentativas de homicídio, agressões, processos penais, desterro, expulsões, proibições de entrada no país ou de saídas do território e até vigilância permanente por parte das autoridades.”
Segundo a Fundação AIS, em entrevista a um site argentino o Papa foi duro. Referiu o desequilíbrio da liderança do país, atendendo à situação altamente repressiva, considerando o regime como uma “ditadura grosseira” comparável à tirania soviética e ao regime nazi. Em resposta foi encerrada a Sede Diplomática do Vaticano e a Santa Sé deixou de ter representação no país, com a saída do encarregado de negócios, “que ocupava o lugar deixado vago pelo núncio apostólico, ou seja, o embaixador do Vaticano, D. Waldemar Stanislaw Sommertag, que tinha sido expulso do país em 12 de Março 2022.”
Mas a repressão exercida sobre a igreja católica durante os últimos cinco anos estendeu-se recentemente às confissões evangélicas, como é o caso da Associação Missão Cristã Verbo que viu ser retirada em Maio passado a sua personalidade jurídica e os bens confiscados. O jornal digital Sete Margens cita o jornal Evangélico Digital para nos dar conta de que a referida missão, que é originária da Guatemala e está presente em El Salvador, México, Honduras e Costa Rica, teve que fechar 27 templos e inúmeros projectos sociais no país, entre eles um orfanato com 50 crianças.
Esta confissão evangélica ainda em Abril tinha realizado uma acção de colheita de sangue, em parceria com a Cruz Vermelha, que entretanto também foi extinta pelo regime.
Curiosamente, uns dias antes o regime prometera proteger as igrejas Assembleias de Deus, talvez na tentativa de dividir a campo cristão para melhor reinar. Mas agora os evangélicos confirmaram que não se pode confiar na palavra de um ditador.
A tradição latino-americana de governos autoritários tem aqui um exemplo eloquente. Quem não respeita a crença religiosa da sua população não respeita nada. Nem a vida, nem a dignidade, nem a liberdade da pessoa humana.
A ética cristã segue a linha de Pedro e demais apóstolos: “Mais importa obedecer a Deus do que aos homens” (Atos 5:29). E qualquer homem livre dirá o mesmo que Mahatma Gandhi: “O único ditador que eu aceito é a voz silenciosa da minha consciência.”
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