Diz o ditado popular que amor com amor de paga. “Mas na política nacional, há quem aposte noutra versão: rancor com amor se paga. Se Costa fez duras críticas a Marcelo Rebelo de Sousa e disse, explicitamente, que este fez uma avaliação errada quando entendeu dissolver a AR, o Presidente respondeu acenando com um lenço branco, e afirmando que o seu preferido na corrida à liderança do PS era o próprio AC, que não queria que tivesse saído”, arranca Mafalda Anjos diretora da VISÃO, no Olho Vivo desta semana.
Para Filipe Luís, ao dizer que quem preferia ver como secretário-geral do PS era António Costa, em vez de qualquer um dos candidatos à liderança, “Marcelo está a menorizar esses candidatos, insinuando que eles não chegam aos calcanhares do primeiro-ministro demissionário”. Diz o editor-executivo da VISÃO: “Mas Marcelo também está a ser sincero: ele só lidou com este primeiro-ministro, sabe como trabalha e como pensa, e qualquer dos outros – se ganhar eleições – será uma incógnita. Mais, no caso de Pedro Nuno Santos, há, até, um histórico de atritos. Por outro lado, há uma dimensão pessoal a realçar na relação institucional com Costa, que foi seu aluno e com quem sempre se deu bem, mau-grado as tensões políticas”.
“Depois de anos em que António Costa fez tudo para se colar a Marcelo, agora parece ser ao contrário, num momento de fragilidade do Presidente”, aponta o jornalista Nuno Aguiar. “António Costa agarra-se ao seu grande trunfo: as pessoas não queriam eleições. E ele quer encarnar essa imagem de estabilidade”, acrescenta Nuno Aguiar. “É de um grande cinismo o primeiro-ministro insistir num cenário inviável em que não houvesse eleições. O que pretende é afastar a responsabilidade por elas.”
Mafalda Anjos concorda. “António Costa não tem razão em depositar em Marcelo Rebelo de Sousa toda a responsabilidade pelo desfecho da sua maioria absoluta quando é ele que se demite. É pura manipulação para não ficar mal no retrato, esta tentativa de transferência de responsabilidade para outros de culpas que são próprias. Alguém imagina que um hipotético António Costa Presidente fizesse outra coisa nestas circunstâncias? É impensável”, sublinha.
Diretas no PS
Hoje e amanhã, cerca de 60 mil militantes socialistas escolhem o próximo secretário-geral do PS nas eleições internas do PS. “Tirando o outsider Daniel Adrião, são duas visões distintas de partido e de governação que se confrontam: uma mais à esquerda, impetuosa e radical, outra mais ao centro, conciliadora e moderada. Pedro Nuno Santos ou José Luis Carneiro, quem vai ganhar? Não restam muitas dúvidas de que será Pedro Nuno Santos – os partidos têm dinâmicas próprias, e ele conseguiu um élan de vitória, andando há muito a trabalhar as bases, que faz ninguém queira ficar de fora”, diz Mafalda Anjos.
Filipe Luís destaca que, nesta campanha interna, Pedro Nuno Santos falou quase sempre para o País, como se já estivesse na campanha para as legislativas. “O seu adversário pareceu ser sempre Luís Montenegro e não Jose Luis Carneiro, que fez por ignorar. Já José Luís Carneiro, ciente de que precisava de conquistar os militantes, falou muito mais para dentro do PS. E, no encerramento da campanha, prometeu que os militantes poderão escolher nomes para incluir nas listas de deputados o que, parecendo que não, é um trunfo interno forte…”, analisa. “Pedro Nuno tem mais dotes oratórios e é um tribuno, mas Carneiro falou com mais genuinidade, fazendo lembrar, nalguns momentos, o estilo popular e terra a terra que tinha Jerónimo de Sousa. Mas não sei se isso conta – ou o que conta mais.”
Nuno Aguiar considera que “Pedro Nuno Santos fez uma campanha mobilizadora, com muita gente”, mas identifica algumas “bandeiras vermelhas”. “É bem melhor no púlpito do que nas entrevistas, onde se tem mostrado mais aborrecido, repetitivo, por vezes mal preparado e irritando-se com facilidade.” O jornalista acrescenta: “Devemos todos refletir como é que, depois de tantos casos, da queda do Governo devido a uma investigação criminal e num momento em que o PS ainda tem três líderes, os socialistas continuam à frente nas sondagens”.
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