Em qualquer parte do globo, fazer o melhor possível pelos filhos é a missão de qualquer mãe ou pai consciente.
Tentar ir além das limitações da geração anterior, também.
Na verdade, também os nossos progenitores nos criaram com a intenção de quebrar barreiras e melhorar a forma de fazer as coisas herdadas dos seus.
Os nossos avós fizeram o mesmo com os nossos pais. Os nossos filhos também o farão connosco.
É esta a dança das gerações.
Independentemente do quanto amemos os nossos pais, e do trabalho excelente que tenham feito (é certamente isso que sinto pelos meus), há momentos dolorosos que, se tivéssemos a escolha, apagaríamos das nossas memórias para sempre.
Muitos desses momentos fazem de nós o que somos hoje, é certo. E podemos até encontrar justificações plausíveis que nos adormeçam as feridas. Mas, se tivermos a coragem de dizer a verdade, daríamos tudo para que não tivessem existido. Pelo menos até lidarmos totalmente com o impacto profundo que deixaram.
É natural querermos proteger os nossos filhos da mesma experiência e tentarmos fugir aos erros com tudo o que podemos. Mas esta é uma batalha que não se ganha. Por mais que nos façamos prisioneiros do mito da perfeição parental, também os nossos filhos vão ficar marcados para sempre pelas nossas falhas; também eles vão desejar que tenhamos feito algumas coisas de forma diferente. Vamos sempre cometer erros.
Mas o lado ingrato da parentalidade, às vezes tão difícil de navegar, vem com uma missão única. A ser aceite, tem uma importância extrema; a de pôr fim à dor pessoal, para que a geração seguinte não a viva. E, ainda mais crucial, a de contribuir para a reparação dos erros da nossa história colectiva, para que, também estes, não sejam perpetuados.
Esta missão não é para os mais fracos. Por mais que não queiramos admitir, às vezes é mais fácil escondermo-nos do passado, enterrarmos o que queremos esquecer e justificarmos as nossas acções, do que mexermos nas feridas.
Também é preciso muita coragem para mudarmos o curso da história. Assim se explica como a violência doméstica e outras expressões de violência e intolerância que vemos à nossa volta prevalecem. Também explica o estado do mundo e é assim que se repete a história.
A dor que não se examina (pessoal e colectiva), é infligida à geração seguinte. É um ciclo vicioso.
A oportunidade da missão parental é independente da geografia. Os problemas que nos afectam aqui são apenas uma versão do problema global. Também aqui se critica a geração de millenials, os pais helicóptero, os pais que deixam os bébés chorar. O sistema de educação, o estado da economia, o estado do ambiente, as decisões do governo, a imigração.
Só que com uma vantagem; a bagagem histórica da Nova Zelândia, apesar de ser marcada fortemente pela guerra, tem apenas 700 anos (e menos de 200 de colonização europeia). A população também é menor, o que torna a oportunidade de mudar o rumo das coisas mais tangível, mas, claro, nem por isso mais fácil.
Como se põe fim à dor de uma geração? Passa primeiro pela coragem de a enfrentar e de mergulharmos na vulnerabilidade que se segue. Mas o ingrediente mais forte é mesmo a compaixão pela geração anterior, por nós próprios, e pela geração seguinte. Afinal, todos fazemos o melhor que podemos com a vida que temos.
O resto é feito de decisões, momento a momento, que, ou contribuem para o prevalecimento do status quo, ou para a criação de um futuro diferente.
Mesmo a infância mais feliz apresenta esta oportunidade.
Os nossos pais foram os heróis que tiveram a coragem de nos tratarem de forma mais justa e aberta do que foram tratados pelos nossos avós. Nós seremos os campeões da expansão dessa abertura e amor. Os nossos filhos irão além das nossas limitações. E cada geração foi e será responsável pela resolução dos maiores problemas da história (pessoal e colectiva), e, paradoxalmente, a criação de problemas novos.
A parentalidade é um veículo poderoso de mudança. Criar seres humanos melhor, cria, inevitavelmente, um mundo melhor. Uma família de cada vez.
Uma vénia às mães e pais conscientes deste mundo. E o reconhecimento e admiração que lhes é devido.