1 – As guerras estão a mudar. “Diante de uma larga frente de batalha, procure o ponto mais fraco e ataque aí com a sua maior força” – aquela que é uma das frases mais conhecidas do clássico A Arte da Guerra, de Sun Tzu, pode estar a ganhar agora um novo significado. E a obrigar-nos a redefinir aquilo que, até aqui, podíamos considerar como a “maior força” em termos militares.
Basta ver o que aconteceu com o ataque perpetrado, há uma semana, por pouco mais de uma centena de drones ucranianos, em alguns pontos vitais das Forças Armadas russas. Com o resultado conhecido, mesmo descontando a normal propaganda e empolamento com que é anunciada uma qualquer vitória num cenário de guerra: drones que custaram uns meros 400 euros conseguiram destruir, a muitos milhares de quilómetros de distância, aviões de combate russos avaliados em milhares de milhões de euros. Além de infraestruturas essenciais para as forças em combate.
Os drones são a versão moderna da funda com que David derrotou Golias. E, devido à sua eficácia, podem anunciar uma nova era na guerra moderna – que não pode ser descurada pelos países europeus em processo de rearmamento.
Por isso, mais importante do que discutir qual a percentagem do PIB que a Europa deve alocar aos seus orçamentos de Defesa seria talvez perceber onde e como esse dinheiro deve ser gasto. Pensar e voltar a pensar bem, antes de escolher armas e equipamentos através dos catálogos já amarelecidos dos fabricantes, muitos deles preparados para outros tipos de guerras.
É fácil cumprir as regras de contribuição para a NATO através da compra de equipamento pesado, como caças, navios submarinos ou até sistemas de mísseis. Mas, perante a evolução que se observa na arte da guerra, talvez seja conveniente apostar muito mais nos esforços e na reflexão em ciência e inovação – onde esse investimento poderá ser aproveitado para outros fins. Até porque essa pode ser mesmo a única forma de a Europa alcançar o seu objetivo primordial subjacente ao aumento dos custos em segurança e defesa: garantir a sua autonomia e independência, sem depender do escudo protetor de terceiros.
2 – O poder ainda vence o dinheiro. Nos EUA, como em muitas outras democracias modernas, o poder só está ao alcance de quem conseguir reunir o apoio de financiadores importantes e que esperam, naturalmente, ser recompensados, de uma maneira ou de outra, mais tarde. Foi essa lógica que, de forma aberta, deu combustível à associação entre Donald Trump e Elon Musk, na corrida às presidenciais de novembro passado.
A união entre o Presidente da nação mais poderosa do mundo e o homem mais rico do planeta parecia, a certa altura, o casamento perfeito entre poder e riqueza, a fórmula perfeita para desmantelar o Estado, eliminar as instituições reguladoras, abrir uma avenida para os mais diversos negócios, sem controlo, apenas em busca de maior fortuna e de satisfazer a ganância sem princípios.
Embora ainda não saibamos como vai evoluir a recente separação entre Trump e Musk – com as inevitáveis acusações mútuas, típicas de qualquer divórcio litigioso –, já se percebeu que, como sempre tem sucedido nestes casos, o autocrata no poder consegue vencer o financiador monopolista que o apoiou. Não é a primeira vez que isso sucede na América, nem em outros países do mundo. Todos assistimos à forma como Vladimir Putin eliminou os oligarcas que, a partir de certa altura, se desviaram do seu caminho, e também como Xi Jinping conseguiu silenciar Jack Ma, o milionário fundador da Alibaba, terminando-lhe com o breve estrelato mundial que chegou a granjear entre outros líderes de tecnológicas.
O mais surpreendente agora é a sensação estranha que este divórcio nos deixa: o de sentirmos alívio por Donald Trump ter conseguido pôr Elon Musk “na ordem”, retirando-lhe acesso ao poder em Washington e, porventura, impedindo-o de alcançar um poderio global em setores sensíveis, com implicações planetárias. Para todos os efeitos, concorde-se ou não com ele, Trump foi eleito e, salvo alguma mudança brusca e inesperada, vai ocupar o poder durante um prazo de quatro anos. Aquilo que Elon Musk poderia ganhar com a sua associação a Washington não tinha prazo definido nem estaria dependente de eleições. Neste caso, como noutros, isso faz toda a diferença.
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