Há quem tenha saudades do Quem Quer Ser Milionário, quem seja fã do Joker, quem sonhe com o regresso d’O Elo Mais Fraco. Respeito todas as opiniões, mas, para mim, de todos os concursos a que podemos assistir na televisão, o melhor é o dos professores. É de desfecho muito imprevisível, tudo pode acontecer, há suspense até ao final. Se nos concursos de cultura geral é óbvio que as perguntas da primeira ronda são todas facílimas e quando se começa a ganhar dinheiro a sério surgem questões complicadas, no concurso de professores é ao contrário: a primeira interrogação é logo de resposta impossível: “Onde vou dar aulas no próximo ano lectivo?”, e nunca se chega a ganhar dinheiro a sério. O prémio final deste concurso não é, realmente, grande coisa, ninguém fica rico, mas há lá maior riqueza do que poder trabalhar no concelho de residência? É um luxo muitas vezes subvalorizado. Os professores têm-se mostrado descontentes com o regime de mobilidade, provavelmente porque é mobilidade a mais. Uma coisa é um docente lisboeta ser colocado em Sesimbra, outra é ter de ir fazer um horário incompleto a Bragança, e ainda tentar complementar com umas horas em Viseu. Isto é vantajoso apenas para os stores de Geografia, que conseguem cimentar conhecimentos no terreno. Provavelmente estamos perante diferentes conceitos de mobilidade. É como se os professores tivessem mostrado disponibilidade para tentar chegar com as mãos aos pés, mantendo as pernas esticadas, e o Ministério da Educação lhes exigisse dois flic flacs à retaguarda.
Ou na Guarda, mesmo. Neste momento há professores mais itinerantes do que algumas famílias circenses. E ao menos os Cardinali têm voto na matéria: decidem onde vão armar a tenda. Em comum com eles, alguns docentes têm a tenda, mas não contam com a alegria de se fazerem acompanhar pela família. Fazem malabarismos sozinhos, para poderem enviar algum dinheiro para casa ao fim do mês. No circo também há quem ande no arame, mas sempre tem mais companhia. Parece-me seguro afirmar que, neste momento, compensa mais ser palhaço do que professor. Mesmo que se seja o palhaço pobre. Tempos houve em que, quem leccionava, só tinha de se preocupar com questões como chumbos e passagens de ano dos alunos. Agora têm de se preocupar com passagens de comboio baratas e descobrir o posto onde se arranja sem chumbo 98 mais em conta. Aos olhos do Ministério da Educação os professores são como os futebolistas: antes do jogo precisam de ir para estágio, longe das mulheres e dos filhos, para não haver distracções que lhes perturbem a performance. O problema é que o estágio dos docentes chega a durar 30 anos e, ao passo que um futebolista que se destaque vai ganhar balúrdios para Espanha, um professor destacado vai só gastar balúrdios para uma terra que já é quase em Espanha.
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