Crónicas

Quando o meu avô António esteve connosco em Luanda, pegava nos meus livros e nos da minha irmã, nos livros que encontrasse, e não os largava

Quando digo, A ficção é uma fábrica de realidades, o não-dito é, Essas realidades podem ser não só extremamente reais, como extremamente poderosas

A minha irmã arranja-se mais do que eu, pinta-se, aboneca-se. Às vezes confundem-nos, chegam a julgar que somos gémeas

Chamavam-lhe o “Doutor da Pasta” porque o homem caminhava invariavelmente com uma pasta apertada contra o peito. E fazia-o com tal zelo que uma vizinha chegou a especular que se tratava de uma carga explosiva

O meu vestido tinha uns guizinhos presos ao cinto, que tilintavam de cada vez que eu me mexia, alarmando-me mais para a má vontade do professor

Aquela bagagem servia apenas para encher a vista dos outros. Um viajante é medido pelo tamanho da bagagem

Pedras, pedregulhos, descaem para a água. A maré terá começado a baixar, mostrando pedras mais negras. Devem estar molhadas ou cobertas de limos

Não importa o tamanho da espera. A diferença está na idade de quem espera. É o que ele diz enquanto acaricia os joelhos como se neles se desenhasse o redondo da velhice

Mantinham-se legalmente casados, moravam na mesma casa, mas ambos juravam que não se falavam há mais de dez anos

Aprendemos a conviver com tudo. Até mesmo com os nossos inimigos. Adaptamo-nos a tudo e tudo domesticamos. Até mesmo a morte

Quase não havia distância a separarmo-nos. Como não haviam de ressoar dentro de mim os gritos de socorro da vizinha?