Quando foi nomeada ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem precisou de ajuda para ler o juramento porque, segundo disse, se tinha esquecido dos óculos. E assim se fez história: nos últimos quatro anos, foi a primeira vez que um titular do cargo de ministro da Administração Interna assumiu a responsabilidade por uma falha. António Costa bem disse que era o fim de um ciclo. Se fosse uma solução de continuidade, Van Dunem teria dito: “Não consigo ler o juramento porque o motorista do Cabrita se esqueceu de me pôr os óculos na mala.” Assim, apesar de ter sido nomeada apenas na semana passada, Van Dunem já é a melhor ministra da Administração Interna desta legislatura. É um feito simultaneamente banal e notável. Privilégios de quem sucede a Eduardo Cabrita.
No entanto, acredito que a passagem do ministro Eduardo Cabrita pelo cargo também tenha deixado uma marca importante. Não me surpreenderia que as declarações amigáveis passassem, a partir de agora, a ter um novo modelo com três opções: “Culpa do condutor A”, “Culpa do condutor B”, e “Culpa de toda a gente menos do Cabrita”. Também é possível que as regras de transporte oficial de ministros mudem. Os únicos passageiros do banco de trás que têm tão pouca responsabilidade como Cabrita costumam ser crianças. Talvez valha a pena deixar essa ideia mais clara, para os motoristas saberem com o que contam. Os ministros deviam ter, no banco de trás, uma cadeirinha de ministro, em tudo igual às cadeirinhas de bebé – mas maior, evidentemente. O motorista passa a sentar o ministro na cadeirinha, põe-lhe o cinto e certifica-se de que ele fica confortável e em segurança. O melhor é ter preparado um leitor de DVD com desenhos animados, para o ministro se entreter durante a viagem. É assim que o Código da Estrada determina que se tratem as pessoas que não têm responsabilidade nenhuma. Há que actualizar os procedimentos.