A internet surgiu na década de 1960, mas o que conhecemos hoje como “internet” começou a ganhar forma em 1969, com a criação da ARPANET (Advanced Research Projects Agency Network), um projeto financiado pelo governo dos Estados Unidos. O objetivo da ARPANET era conectar computadores em diferentes universidades e centros de pesquisa para facilitar a troca de informações.
Nos anos seguintes, a ARPANET cresceu e em 1983 foi criado o TCP/IP (Transmission Control Protocol/Internet Protocol), um conjunto de regras que padronizou a comunicação entre computadores na rede. Isto permitiu a criação de uma rede global de computadores, que mais tarde, nos anos 1990, se expandiu e evoluiu para a internet pública como conhecemos hoje com a popularização da World Wide Web (www).
A internet de massas trouxe inúmeras vantagens para a sociedade e transformou praticamente todos os aspetos da vida quotidiana, nomeadamente o acesso à informação, à comunicação instantânea, a facilidade no trabalho e educação, o entretenimento e lazer, o comércio e serviços online, as conexões sociais, a inovação e negócios, a acessibilidade, e ainda, a facilidade de organização de tarefas.
Todavia, também existem diversas desvantagens e desafios que precisam ser considerados, designadamente a dependência e o vício, a exposição a conteúdos nocivos, riscos à privacidade e segurança, a desinformação e notícias falsas, o impacto na saúde mental, a distração e perda de produtividade, a falta de controlo sobre os conteúdos e isolamento social.
Mas a internet e as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) vieram também providenciar oportunidades variadas para a prática de crimes, modificando e exponenciando as possibilidades de ocorrência da criminalidade, seja porque se constituem em si mesmo enquanto alvos potenciais do crime, mas também porque podem fornecer os meios ou ferramentas através dos quais outros crimes podem ser cometidos.
Poderá, portanto, afirmar-se que a Internet veio proporcionar novas formas e oportunidades de praticar ou cometer crimes que poderemos designar como “convencionais”, como a perseguição, o abuso sexual de crianças ou a burla, mas veio igualmente alavancar o surgimento de novas formas de criminalidade, desta feita exclusivamente associadas ao uso de computadores, das TIC e dos sistemas informáticos.
Neste contexto, a Procuradoria Geral da República (PGR), através da Ordem de Serviço n.º 1/2019, de 16.01, concentrou a investigação do cibercrime e crime cometido em ambiente digital em secções e rede de magistrados especializadas, tendo por base a necessidade de especiais conhecimentos técnicos à investigação.
Contudo, as dificuldades da investigação deste tipo de criminalidade são vastíssimas, desde logo pela sua especificidade e complexidade, por se tratar de um tipo de criminalidade com “linguagem” própria, com intervenientes (agentes do crime) dotados de elevadas capacidades e meios técnicos especializados e, por vezes, de cariz transnacional.
A nível nacional, a cooperação das instituições fornecedoras de elementos probatórios, designadamente entidades bancárias e operadoras de rede móvel é bastante deficitária, colidindo, em muito dos casos, com os prazos razoáveis de resposta.
Esta delonga, associada à problemática dos metadados, tem dificultado o acesso à informação (Internet Protocol – IP) determinante à descoberta da verdade material, tendo como consequência a prolação de despachos de arquivamento por não ser possível alcançar, em tempo útil, esses elementos probatórios
Por outro lado, os fenómenos criminais associados à criminalidade informática são altamente voláteis, emergindo diariamente novos métodos de atuação altamente sofisticados e tecnológicos, com esquemas de engenharia social, que obrigam os magistrados do Ministério Público a uma constante adaptação, formação e aprofundamento de conhecimentos nestas matérias, de forma a realizar um efetivo e eficaz combate a estes fenómenos.
De acordo com a Nota Informativa do Gabinete de Cibercrime da PGR, referente às denúncias recebidas no ano de 2023, concluiu-se que “as denúncias de cibercrimes em sentido alargado recebidas por correio eletrónico pelo Gabinete Cibercrime aumentam persistentemente, de forma consistente, de ano para ano, desde 2016. No ano de 2020 as denúncias aumentaram de forma excecional, após a eclosão da pandemia resultante da COVID–19. Em 2021, porém, o aumento foi ainda mais expressivo do que tinha sido em 2020, mais que duplicando. Em 2022 esta tendência manteve-se: foram recebidas 2124 denúncias, quando em 2021 tinham sido recebidas 1160. Portanto, registou-se um aumento de 73,58%. Por último, em 2023 foram recebidas 2916 denúncias – correspondendo a 137,29% das denúncias do ano anterior”.
No mesmo relatório também se pode ler que os fenómenos mais frequentes no ano de 2023 foram: o “olá mãe, olá pai” e falsos pagamentos à EDP; o phishing; burlas online; páginas “falsas”; “falso” trabalho online; burlas no mercado imobiliário; defraudações na utilização de plataformas de vendas online e em aplicações de pagamentos; burlas em supostos investimentos em criptomoedas; telefonemas fraudulentos; “falsas” convocatórias policiais; ataques informáticos – ransomware e “furto de credenciais de acesso a contas”; sextortion; e CEO Fraud.
No próximo artigo, revisitarei este tema para, com alguma pedagogia (assim espero), explicar em que consiste cada um dos mencionados fenómenos, mas, acima de tudo, formas de evitar ser vítima destes esquemas fraudulentos.
Para finalizar, nunca esquecer que nos tempos em que vivemos a informação está à distância de um clique e que a internet é uma janela virada para o mundo, seja isso uma virtualidade ou um inconveniente.
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