Finalmente, a tão sonhada união dos professores de Portugal está em curso. Cansados do desprezo descarado de que têm sido alvo pelos sucessivos governos – independentemente da sua cor – saíram à rua e puseram em curso um movimento de luta que se pode resumir na resposta de quem, profissionalmente, já não tem nada a perder porque já praticamente perdeu tudo: o tempo de serviço, o direito a uma carreira justa, o respeito dos sucessivos governantes, uma atualização salarial, a dignidade profissional e a paciência. E conseguiram esta união sem os inúmeros bafientos sindicatos de professores que tão bem têm contribuído para a desunião da classe e a destruição da sua imagem perante a sociedade.
Tendo na forja uma alteração aos concursos e a descentralização de competências no setor da educação para as autarquias, o Ministro da Educação e a sua equipa talvez não contassem que esta tentativa (entretanto refutada) de municipalização da educação viesse desencadear uma torrente de revoltas. Depois da desilusão, do desânimo e da inação dos últimos anos, a classe docente decidiu tomar finalmente as rédeas do ensino em Portugal. E de todos os distritos do País começaram a surgir notícias de professores em greve, manifestando-se em frente às escolas, pela dignidade da sua profissão. Pouco a pouco, este movimento de revolta foi crescendo, alastrando-se a toda uma classe que há muito se sente vilipendiada nos seus direitos e ridicularizada nas suas obrigações.
Não parece ser já fácil parar os professores sem que antes lhes sejam reconhecidos direitos essenciais que assegurem o mínimo de condições para viver condignamente como a contabilização de todo o tempo de serviço, a reestruturação da carreira docente, antecipação da idade de reforma, entre outros. E tudo isto levado a cabo pelo mais recente sindicato que representa todos os professores (S.T.O.P.), provocando o tão necessário abanão de que a classe precisava. Apesar de as duas maiores estruturas sindicais de professores, Fenprof e FNE, e outros oito sindicatos independentes terem recusado aderir a esta greve, os professores (sindicalizados ou não) finalmente perceberam que era altura de mudar as regras deste jogo que só os prejudicava e do qual saíam sempre perdedores. As diferentes tutelas do pelouro da Educação, os diversos ministérios e ministros, de vários Governos e diferentes quadrantes políticos, têm vindo sucessivamente a desvalorizar os professores de Portugal. E mesmo depois de terem assistido ao importante papel desempenhado por estes ao lado de outras forças prioritárias nos períodos de confinamento decorrentes da pandemia Covid-19, durante os quais o ensino funcionou de forma não presencial – em que da noite para o dia os professores montaram uma escola à distância com os seus próprios meios – continuam sem promover qualquer tipo de valorização da classe. A tutela nunca percebeu – ou não quer perceber? – do que se está realmente a tratar quando se trata de professores: da garantia de futuro e de progresso de um país.
Desta vez, os professores exigem que este périplo de desprezo relativamente ao seu trabalho termine. O S.T.O.P. convocou uma greve para todo este mês de janeiro que, para além de rejeitar as propostas de alteração aos concursos, exige resposta a muitos outros problemas antigos. E os professores aderiram. Há escolas fechadas por todo o País. Há assistentes técnicos e pessoal auxiliar que se uniu aos docentes nesta mesma luta. Há professores que nunca antes fizeram uma greve ou participaram numa marcha a empunhar cartazes e a preparar-se para rumar a Lisboa no próximo sábado, 14 de janeiro. Porque estão zangados. Porque estão cansados. Porque estão fartos de ser joguetes nas mãos dos (des)interesses políticos. Porque, como diz uma entre muitas vozes nesta profissão, a da professora Helena Rechena, urge restaurar a autoridade do professor em Portugal mediante a adoção de medidas concretas e efetivas de combate à indisciplina e displicência; importante será também que os professores deixem de se sentir manietados por uma teia burocrática kafkiana, desprovida de qualquer mais valia prática e que os obriga a justificar/fundamentar toda e qualquer decisão; que lhes seja reconhecido o seu papel fundamental na sociedade acompanhado por um ordenado condizente com a sua responsabilidade; que vinculem os professoras contratados, durante décadas com a casa às costas a suprir necessidades do sistema, com salários estupidamente ridículos, sem direito a progressão na carreira e, em muitos casos, a centenas de quilómetros das suas residências; que as quotas para acesso aos 5º e 7º escalões sejam eliminadas de vez e que a todos seja feita justiça através da contagem integral do tempo de serviço prestado ao País.
Sem a obtenção de respostas concretas a estas reivindicações, quem vai conseguir parar os professores?
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