
David Ramos
Ser headhunter ou recrutador profissional é difícil! Saber avaliar pessoas, analisar empresas e mercados globais é uma tarefa cada vez mais complexa. Não só porque todas estas variáveis se têm desenvolvido exponencialmente, mas também porque a rapidez exigida é cada vez maior. Assim, o headhunter tem mais pessoas e mercados para analisar, em menos tempo, não podendo errar.
Por isso é importante relembrar que o foco dos recrutadores é a empresa que os contrata e não os candidatos. Os headhunters não trabalham para si! Não que isso os leve a ter uma atitude menos positiva com os candidatos, aliás são muitos os casos em que os recrutadores se tornam conselheiros de carreira de muitos candidatos. O respeito pelo indivíduo tem de existir. A outro nível, têm de considerar que, no futuro, qualquer candidato pode ser um cliente e que, no presente, são certamente os melhores “embaixadores” das empresas de recrutamento. Mas, numa época em que o tempo urge e a concorrência aumenta, não há grande margem para desenvolver, com todos os candidatos, uma relação aprofundada que passe, inclusivamente, por transmitir um feedback construtivo sempre que exista alguma interacção. Quem o conseguir fazer marcará a diferença pela positiva.
Processo de recrutamento
Ao iniciarem um processo de recrutamento, os profissionais desta área tentam encontrar os candidatos com o perfil pretendido pela empresa-cliente. É com essa missão que vão contactar e entrevistar várias pessoas.
Existindo interesse de ambos os lados (candidatos e recrutador) chega-se a uma fase conhecida como short-list onde a empresa-cliente tem oportunidade de conhecer três ou quatro candidatos finais, que deverão coincidir com o perfil pretendido, quer em termos técnicos, quer comportamentais. Idealmente, após estas entrevistas um ou dois candidatos seguem para mais conversas e entrevistas na empresa-cliente e, no final do processo, um dos candidatos é recrutado. É apanágio das empresas de recrutamento, sobretudo as de executive search, darem feedback a todos os candidatos que foram contactados ao longo do processo. É verdade que este telefonema pode demorar meses a surgir, pois o processo também demorou bastante tempo, mas mesmo assim deve existir uma explicação.
Mas como referi anteriormente, o tempo é escasso e, por isso, algumas vezes não é possível dar esse feedback ou então o mesmo é demasiado vago para ser construtivo.
As verdades escondidas
Existindo o feedback ao candidato é então necessário explicar por que a escolha não recaiu sobre o mesmo. Se não for um mero telefonema de cortesia, envolverá conteúdos relevantes, que podem tornar-se num interessante processo de aprendizagem e melhoria. Contudo, a verdade é que muitos recrutadores não indicam as reais razões pelas quais os candidatos não foram escolhidos. De seguida apresento as dez razões que (quase) nunca se dizem:
1 – Apresentação: Sim, a apresentação conta! A sobriedade ganha claramente a quem tenta impressionar tanto que acaba por estar demasiado “arranjado”. A informalidade é por vezes difícil de alinhar.
2 – Confabulação: Com o entusiasmo de quem quer mesmo a função há pessoas que tendem a “embelezar” a sua história profissional. Quando detectada esta situação é claramente um ponto negativo.
3 – Passividade Vs Excitação: a situação de estar a ser avaliado/julgado leva pessoas, mesmo seniores, a terem comportamentos fora do que lhes seria comum. Uns ficam mais calados e sentem-se inibidos em contar todos os seus sucessos, outros não se conseguem calar pois temem o silêncio que tem de existir numa qualquer reunião.
4 – Arrogância e Agressividade: Há candidatos que, por diferentes razões, são mais agressivos e/ou arrogantes nas entrevistas. Muitas vezes não o são verdadeiramente, mas o seu excesso de confiança é confundido como tal.
5 – Desfasamento das competências: esta é situação a evitar, mas que acontece. Contudo, neste ponto a maior responsabilidade é do recrutador que não efectuou devidamente o assessment e colocou-o(a) numa situação desagradável em que foi falar com a empresa-cliente, mas sem preencher os requisitos técnicos ou ter perfil para a função. Por outro lado, esse também tem de ser o seu trabalho de casa aquando do processo de validação da oportunidade face à sua posição e momento de carreira.
6 – Falta de preparação: O não ter preparado perguntas para fazer ou tão simplesmente não conhecer minimamente a sua possível futura-empresa demonstra falta de interesse. Quem recruta procura energia e paixão.
7 – Má Higiene é simplesmente difícil de aceitar…
8 – Comunicação não verbal desadequada: se raramente olhou de frente o interlocutor, ou se esteve demasiado teatral (muitos gestos ostensivos), ou se sentou de forma blazé (recostado na cadeira, qual tarde de cinema de Domingo à tarde em casa)
9 – Tempo do processo: quando o processo se arrasta por diversos meses pode ser: i) porque há informação que o lugar pode não avançar; ii) porque simplesmente estão a tentar encontrar outras pessoas para comparar consigo; iii) estão a negociar com outro(s) candidato(s)
10 – Discurso pouco consistente: não são raros os casos em que os candidatos trocam datas e acontecimentos, não revelando um conhecimento profundo da sua própria experiência
Agora ponha-se no lugar do recrutador que sabe que a razão, ou razões, pela qual não foi escolhido(a) passa por: não devia ter ido com o cabelo sujo para a reunião, ou o cheiro que imanava era desagradável, ou as suas perguntas revelaram uma total impreparação da reunião, ou que não se calou durante quarenta minutos, ou que confabulou nas suas respostas… poderia continuar com muitos outros exemplos, mas a mensagem importante é que a maior parte das pessoas não está preparada para receber estes feedbacks tão directos (até porque se tivesse consciência de alguns destes problemas evitá-los-ia certamente), e provavelmente também não deve ser o recrutador a pessoa que tem de lhe dizer isto (mais uma vez, o foco é a empresa-cliente).
Tenho algum destes “problemas” para resolver?
Depois de ler os pontos anteriores, o exercício mais útil será o de questionar-se e tentar perceber se poderá sofrer de algum dos “males” descritos. Se não o conseguir fazer procure feedback junto de pessoas que o conheçam e que trabalhem consigo, e porque não junto de recrutadores com quem tenha interagido e com quem tenha desenvolvido uma relação de maior confiança.
Feedback construtivo
Mas se pretende verdadeiramente tornar uma frustração (não ter sido escolhido para a função) numa aprendizagem então peça feedback construtivo. Para tal, tem de estar pronto para questionar o recrutador sobre pormenores que à partida nunca lhe serão transmitidos, mas também tem de estar preparado para ouvir e reflectir sobre as respostas que obtenha tentando a posteriori validar as mesmas com pessoas da sua confiança:
– Exemplo de situações a corrigir (mais fácil se o recrutador assistiu presencialmente à entrevista)
– Como estava a minha apresentação?
– Foi algo que eu disse?
– Foi alguma reacção que tive?
– Poderei ser elegível para outras funções dentro desta empresa?
– Se esta não é uma posição/empresa para mim, qual será?
Antecipação e melhoria
Tente antecipar todos estes temas. Se muitos deles dependem de si outros dependem do nível de informação a que consegue ter acesso, nomeadamente sobre a empresa e sobre quem o irá entrevistar. Pesquise sobre ambos e peça ao recrutador para lhe traçar o perfil dos entrevistadores e sobretudo do seu futuro chefe. Não descure as perguntas mais básicas sobre como ir vestido, se o discurso na reunião deve ser mais formal ou informal.
Concluindo, no final, procure obter feedback construtivo. Procure sempre perceber os pontos que pode melhorar e aproveite para perguntar o que pode fazer nesse sentido. Este feedback de um profissional irá certamente ajudá-lo num próximo processo de recrutamento e mesmo no seu desenvolvimento pessoal.
Não posso deixar de reforçar uma ideia que já aqui referi: acima de tudo, é fundamental que durante as entrevistas seja você próprio. Mesmo que não seja seleccionado, saberá que deu o seu melhor e que deixou uma boa impressão. E isso pode trazer oportunidades futuras. Estas dicas não devem servir para manipular o processo de recrutamento, mas sim para uma melhoria pessoal.
* (O autor escreveu este texto com base na ortografia antiga)