Em Inglaterra vai um grande sururu com as declarações do chef britânico Jamie Oliver, em prol da amamentação. Chocado com a taxa de mães que amamentam no país – a pior do mundo, não chegando aos 2% quando os bebés completam seis meses de vida – Oliver decidiu promover os benefícios do leite materno, tal como preconiza a Organização Mundial de Saúde. Ou seja, defendeu como ideal que os bebés, nos primeiros seis meses, sejam alimentados exclusivamente com leite materno, e que a amamentação se prolongue pelo menos até ao primeiro ano de vida, complementando outros alimentos.
O problema é que disse também que, além de todos os benefícios para a saúde das crianças, a amamentação é “simples, fácil, conveniente…e grátis!”. Essa poderá ser a experiência de Jools, a mulher do chef, com quem teve já quatro filhos (o quinto nascerá no próximo Verão), e de muitas outras mulheres. Mas não é a experiência de outras tantas mães, que sofrem horrores para conseguir amamentar. E a polémica instalou-se. “Fácil?”, indignou-se ontem Adele, dizendo alguns palavrões aos microfones dos jornalistas. “É completamente ridículo colocarem este tipo de pressão sobre as mães. Eu só consegui dar mama durante nove semanas e algumas de nós não conseguem mesmo fazê-lo! Tive amigas com depressões pós-parto por causa deste tipo de pressões.”
A questão também não é “simples” porque, muitas vezes, nem sequer é uma questão de escolha: há mulheres que não têm leite, há outras que não conseguem que os bebés “agarrem” no mamilo (que quase sempre dói, cria feridas e sangra), ou desenvolvem infeções tais que se torna inviável prosseguir com o aleitamento. Uma mastite, dizem os especialistas, dá dores muito piores do que as do parto. Nesses casos, a única solução são os antibióticos – e a medicação para “secar” o leite.
Entre as que escolhem amamentar – eu diria que, quase sempre, com grande sacrifício -, também não é “simples” manter o leite materno como alimento exclusivo do bebé. Se a criança não aumentar suficientemente de peso, o pediatra recomendará a introdução imediata de suplementos.
Além disso, como fazê-lo até aos seis meses, no caso das mães trabalhadoras? Eu consegui porque tirei uma licença alargada, recebendo apenas 25% do ordenado nos três meses seguintes aos cinco meses de licença “normal”. Mas, como indicam as estatísticas da Segurança Social, o número de mães que o fazem é irrisório. Aquelas que regressam ao trabalho, têm de começar a fazer a introdução de outros alimentos mais cedo, a partir dos 4 meses (daí que tenha surgido esta petição, recentemente). Aos 6 meses, segundo dados da Direção Geral de Saúde só cerca de 30% das mães portuguesas prosseguem com o aleitamento materno, contra as mais de 90% que o faziam no primeiro mês de vida do bebé.
São menos ainda as que mantêm a amamentação no final do primeiro ano, dando de mamar de manhã e à noite, por vezes carregando bombas de leite para o trabalho, para conseguir deixar biberãos que alguém dará ao bebé, durante o dia. E há quem consiga ainda esticar estes ritmos, mantendo a amamentação até aos 2, 3 ou 4 anos. São opções, que devem ser sempre respeitadas. Mas que nunca, nunca, devem ser consideradas “simples” ou “fáceis”. Esse foi o pecado de Oliver. Mas eu perdoo-lhe, porque não creio que o tenha dito com má intenção e porque a causa que o move não é apenas nobre – é mesmo importante. A verdade é que o leite materno é sempre melhor para o bebé e preferível a qualquer outra alternativa (até as latas de leite em fórmula dizem o mesmo…) E se a opção de não amamentar deve ser respeitada (seja por questões de saúde ou estéticas, liberdade é liberdade), ainda há demasiadas mulheres mal informadas e que, ambicionando amamentar, desistem porque o início é difícil – e não tiveram, infelizmente, quem as apoiasse e ensinasse a ultrapassar os problemas.
O chef, entretanto, já pediu desculpas, via Twitter, às mulheres que possam ter-se sentido ofendidas com as suas declarações: “Quis apenas falar de um assunto que parece tabu. Além das vantagens para a saúde das crianças, as mulheres que amamentam reduzem o risco de ter cancro da mama em 50%. Quando é que se fala disto? Nunca! Eu percebo que amamentar nem sempre é fácil e em muitos casos nem sequer é possível. Só queria demonstrar apoio às mulheres que amamentam. Como pai nunca quis ofender as mulheres ou mães, pois sei o quão incríveis elas são… e levaria um pontapé assim que chegasse a casa.”