A VISÃO publicou recentemente um muito interessante artigo, assinado pela jornalista Sónia Calheiros, sobre as críticas da comunidade psiquiátrica a um estudo recém-publicado na revista científica ‘Molecular Psychiatry’ pondo em causa a eficácia do tratamento da doença através do uso de antidepressivos. A sua autora, Joanna Moncrieff, é uma professora de psiquiatria na University College em Londres e autora do livro “The Myth of the Chemical Cure.”
Na verdade, há muito que já sabemos não existirem provas concludentes que apontem para que a depressão seja provocada por desequilíbrios químicos no cérebro. A indústria psiquiátrica sempre fez por defender essa tese, mas nunca verdadeiramente o conseguiu. O que aconteceu é que o mito foi prevalecendo e passou, depois, a ser considerado uma verdade.
Foram os médicos os primeiros profissionais a tentar encontrar as causas e curas para as perturbações mentais. Freud, médico, foi um pioneiro na observação e na criação de uma forma de tratamento, a psicanálise. Freud e os seus discípulos utilizavam a psicoterapia psicanalítica como a melhor forma de tratar a doença mental, tentando perceber a influência do passado na vida dos pacientes e a forma com os traumas vividos criavam as perturbações mentais.
A partir dos anos 60 do século passado, a indústria farmacêutica teve o seu apogeu, investigando e criando drogas cada vez mais eficazes para melhorar a saúde humana. Ao longo destas pesquisas e numa descoberta quase acidental, verificou-se que algumas drogas tinham um efeito calmante nas pessoas, as adormeciam, e com isso estas não sofriam tanto com a ansiedade ou com a depressão.
Começou então a busca incessantes de drogas que pudessem resolver o grande problema moderno da Humanidade; a doença mental. Para justificar o uso de drogas no corpo humano, criou-se uma teoria sustentando que o problema da depressão era de origem fisiológica, caso contrário não faria sentido medicar as pessoas. Em simultâneo, começou a desenvolver-se a teoria de que as pessoas deprimidas sofreriam de desequilíbrios hormonais, principalmente na hormona serotonina e que os antidepressivos eram a solução para a resolução do problema. No entanto, desde então, nenhum estudo sério é mostrado a defender essa tese e aqueles que existem, quando comparados com o efeito placebo, poucas melhorias apresentam.
Mas o que é então a depressão?, perguntar-se-á. A resposta a essa pergunta será dada por aqueles que falam com as pessoas que sofrem desta doença. As pessoas que sofrem de depressão sabem o que as perturba e o que as faz sofrer daquela forma; são algumas histórias da vida que as magoam e que têm dificuldade em gerir, que as arrastam numa espiral de tristeza sem fim aparente.
É errado pensar que são os mais fracos os que não conseguem ultrapassar as dores do passado. Os que hoje sofrem de depressão, são os que mais sofreram e com isso ultrapassaram o seu limite. Quando a dor insuportável se instala, ficamos sem foco e sem capacidade de dar a volta. E todos podemos vir a cair nesta armadilha emocional.
Como é que eu sei? Porque em catorze anos a clínica que ajudei a fundar tratou mais de dez mil casos de pessoas que sofrem de depressão e ansiedade, e quase todos os casos tratados eram de depressões graves e ansiedade extrema. Todos estes casos clínicos observados pelos psicoterapeutas da clínica tinham histórias difíceis que não estavam a conseguir gerir. Todos sem exceção.
E como se descobre essas histórias? Falando com as pessoas em consultas que demorem o tempo necessário para as ouvir e compreender o que as magoa. O tratamento, com recurso à psicoterapia, deve assim ser um processo cuidadosamente estruturado, para que quem dele usufrui consiga entender os seus próprios comportamentos, emoções e pensamentos que criam ansiedade e/ou depressão e, acima de tudo, possa ultrapassar o que causa a perturbação, encontrando o que possa fazer a pessoa feliz.
O grande objetivo da psicoterapia é ajudar a reencontrar o equilíbrio emocional e, para isso, este método de tratamento ajuda a pessoa a conseguir fazer a gestão emocional das questões do passado que ainda hoje condicionam o seu dia-a-dia, a treinar a mente para bloquear estados perturbadores como a depressão ou a ansiedade, a encontrar novas estratégias para se adaptar a novos desafios e experiências, a melhorar as capacidades de comunicação e a qualidade das suas relações interpessoais, tornando-se mais assertivo e empático e, finalmente, a retomar o controlo da sua própria vida e da sua paz interior. Esse equilíbrio que é, afinal, o objetivo tão desejado por todos nós.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.