É verdade que, no meio de uma guerra insana que ameaça mudar toda a geopolítica e pôr fim ao mundo global em que vivemos nas últimas três décadas, fica difícil voltar a escrever sobre pandemia. Mesmo assim, volto ao tema. O mais provável é não haver leitores interessados neste assunto, o que aliás se compreende, após dois anos intensíssimos, em que quer a ciência quer o jornalismo foram postos à prova. Regresso por acreditar que, aos jornalistas, e em particular aos da VISÃO, também compete falar do que está fora das tendências, do que ninguém quer saber – no caso, do que “já” ninguém quer saber. Arrisco e, naturalmente, aceito protestos – mais do que legítimos – dos leitores que se sentirem defraudados.
Pelo menos até à próxima segunda-feira, 18, está em vigor a situação de alerta, aprovada pelo Conselho de Ministros, que obriga ao uso de máscara em espaços interiores públicos, entre os quais escolas, serviços de saúde e transportes. Também andará por esta altura a prossecução da meta de 20 mortos por Covid-19 por milhão de habitantes, numa média a 14 dias: de acordo com os cálculos dos matemáticos Óscar Felgueiras e Carlos Antunes, da equipa de peritos que aconselha o Governo, Portugal deverá atingir esse objetivo ainda antes da Páscoa ou, o mais tardar, na próxima semana. Seguindo o exemplo de outros países europeus, Espanha vai flexibilizar, a partir de dia 19, a utilização de máscara em espaços fechados, mantendo-a obrigatória em alguns sítios, como transportes e serviços de saúde.
Por cá, no alívio das restrições que felizmente se avizinha, as escolas deveriam ser a prioridade das prioridades. Com as nossas taxas de vacinação, não existem motivos para não o fazer – e seria bom que, de uma vez por todas, nos convencêssemos de que o nível civilizacional de um país também se mede pela forma como se tratam os mais novos (e os mais velhos, mas não é nesses que me concentro agora). Numa análise fria de custos e benefícios, neste momento, o impacto das restrições sobre as crianças e os jovens é muito superior aos danos provocados pela Covid-19. Falo das máscaras, mas não só. Para quem está mais distante destes assuntos, tenho notícias: em Portugal, ainda há escolas a funcionar em “bolhas”, que obrigam ao desfasamento dos horários nas entradas e saídas; ainda há irmãos que vão juntos para a escola mas que não podem entrar pela mesma porta nem encontrar-se nos intervalos; ainda há miúdos que tomam o pequeno-almoço às sete da manhã e almoçam às duas da tarde por causa das “bolhas” no refeitório; em Portugal, os bebés que nasceram durante a pandemia e que frequentam a creche ainda adivinham a expressão facial dos educadores por detrás da máscara.
Há poucas semanas, a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, disse que as crianças, os adolescentes e os jovens estão habituados às máscaras e às restrições. Não, não estão – e, se estão, é nossa obrigação fazer com que se desabituem rapidamente. O terceiro período deste ano letivo começa na próxima terça-feira, 19 de abril. Ao contrário do que aconteceu nos momentos mais críticos da pandemia, em que o medo do desconhecido e a inércia das instituições levaram a melhor, a prioridade, agora, são os mais novos. Por mais que isso atrapalhe os adultos que decidem – para quem, dois anos depois, o vírus e as regras se tornaram uma espécie de lei moral.