Júlia é a protagonista de um dos romances mais conhecidos e lidos de Honoré de Balzac. Contra a vontade do pai, casa com Victor D’Aiglemont, um ambicioso oficial de Napoleão Bonaparte que se revela um homem egoísta, incapaz de corresponder ao amor e aos desejos da jovem e bela mulher. Júlia é infeliz. Um ano depois de casar, o marido leva-a para casa de uma tia e vai servir no exército. É por essa altura que ela se apercebe da presença constante de um rapaz inglês, Artur, que a segue de perto. Quando o marido volta, a sua disponibilidade para ele é outra. Voltam a Paris, ela fica doente. Alegra-se, no entanto, com o nascimento da filha, Helena, mas o pensamento concentra-se no cavalheiro inglês. A saúde não melhora e o marido pede a Artur que o ajude. Mas Artur morre. Júlia cai em depressão até encontrar outro homem, o marquês Carlos de Vandenesse. Ela tem 30 anos e ele apaixona-se por ela.
Este é o núcleo de A Mulher de Trinta Anos, livro de 1842 que está na origem da expressão balzaquiana. “Só em certa idade as mulheres requintadas sabem dar caráter à sua atitude. O desgosto e felicidade dão à mulher de trinta anos, feliz ou infeliz, o segredo dessas eloquentes atitudes”, escreve Balzac, frase que passou a definição universal de um tempo na vida de uma mulher.
É um romance sobre a vida privada, parte integrante desse romance maior que é A Comédia Humana. Nele, Balzac pretende falar do quotidiano íntimo de um tipo social: a alta burguesia e a nobreza em França, entre 1813 e 1844, o período em que decorre a ação. Estamos no domínio do psicológico narrado por uma terceira pessoa. Aos 30 anos, quando Carlos a vê, Júlia é “um enigma vivo, que cada uma interpreta ao sabor dos seus desejos, das suas esperanças ou dos sistemas. Apoiando os cotovelos nos braços do fauteuil, juntava as extremidades dos dedos, parecendo brincar. A inclinação da cabeça, a indolência do corpo fatigado mas airoso, elegantemente recostado, os movimentos cheios de cansaço revelavam uma mulher sem interesse pela vida, que não conheceu as alegrias do amor com que sonhou e se curva ao peso duma recordação que a acabrunha. Uma mulher que desesperou do futuro e de si mesma, uma mulher que não tem ideal na vida.”
Júlia é a única personagem desta obra em que Balzac mergulha de forma profunda. Dela, conhecemos as lutas mais íntimas e o modo como elas a afastam ou aproximam da sociedade em que vive, permitindo essas passagens ao escritor uma reflexão sobre o amor, o casamento ou a maternidade. Ele escrevia e parecia sempre insatisfeito; retocava este texto a que foi sempre voltando. A Mulher de Trinta Anos está sempre em evolução na mente de Balzac. O leitor de hoje olha-a e também a adapta – e a balzaquiana passou a não ter idade definida.
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