Alice seguiu o coelho, que estava atrasado, na fábula de Lewis Carroll. E, como ele, também a indústria tecnológica está a perseguir a otimização energética. Em 2020, registou-se um aumento no tráfego de internet em 40%, e uma duplicação no número de utilizadores da mesma; a maior parte deste tráfego passa por centros de processamento de dados.
Imaginando dados, informação, e o processar destes, provavelmente não se visualiza a sua forma física. Desenganemo-nos: tem, e o seu impacto faz-se sentir a nível ambiental. As indicações mais recentes da Agência Internacional da Energia apontam para que os tais centros de dados, por si só, já representem 1% do consumo global energético, com a previsão de que este continue a crescer, e que perfaçam 0,3% das emissões de CO2 para a atmosfera.
O foco em produtos tecnológicos e aplicações que contribuam para um mundo sustentável e com impacto na sociedade é, sem dúvida, importante; mais ainda é colocar esses desafios aquando da conceção – leia-se, programação – dessas soluções. Para mim, enquanto programador, porque é que é importante escrever código “sustentável”?
A resposta a esta questão divide-se, a meu ver, em duas principais linhas confluentes. Por um lado, há que colocar o ónus da eficácia ecológica no código em si, e do seu processo de construção. Um código bem feito, uma aplicação bem desenvolvida, com aspetos conscientes e aplicados, tem um impacto direto na pegada ambiental do produto final: para os servidores que albergam a solução nos centros de processamento de dados ou na cloud, um código que não esteja otimizado ao nível do seu processamento irá consequentemente consumir muito mais energia.
Atualmente, para corresponder a prazos e ciclos de entrega cada vez mais apertados, as nossas capacidades de programação quase ilimitadas trouxeram consigo códigos mais longos e menos refinados. Ainda que isto tenha sido extremamente benéfico para a aceleração digital da indústria, urge o equilíbrio entre a pressão para esta transição e a qualidade da programação, que deverá ser assente na robustez do código.
Por outro lado, esta consciencialização precisa de ser implementada ao nível mais basilar da indústria. Formação e capacitação tornam-se, aqui, as palavras-chave. É necessário, tendo em conta a procura acelerada pela digitalização, espoletada pela pandemia, que as tecnológicas consigam prover os seus engenheiros de conhecimentos para que, por sua vez, estas questões e desafios seculares consigam ser bem correspondidos.
O que temos em termos de soluções que estão já, ou que podem ser implementadas? As novas arquiteturas digitais começam a atualizar-se para estarem mais orientadas no sentido de dar resposta a estes tópicos. Da mesma forma, os grandes providers de centros de processamento de dados, como sejam a Amazon Web Services ou a Google, têm em marcha planos de sustentabilidade com metas estabelecidas para 2025 e 2030, respetivamente.
Há, também, investigação nacional de destaque ao nível da programação verde. Cientistas do INESC TEC, Universidade do Minho, estudaram como é que diferentes teclados virtuais, muito utilizados no setor para o desenvolvimento de código, se comportavam em termos de eficiência energética. Concluíram que, por exemplo, o mais utilizado não é, de todo, o mais amigo do ambiente – substituindo-o pelo mais ecológico, a poupança no consumo energético ronda os 18%.
Temos ferramentas e temos a capacidade para cumprir a nossa parte pela sustentabilidade do planeta. Para ajudar a programar uma sociedade melhor, regresso ao novelista Lewis Carroll e deixo um apelo: mergulhemos de cabeça por esta ‘toca’ e não temamos o forjar da tecnologia verdadeiramente ecológica.