Por ocasião da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) levantou-se alguma polémica sobre os gastos do Estado. Confesso que muito me agrada ver um país preocupado com a despesa pública, pois estou em crer que esta constante falta de atenção é uma das maiores deficiências democráticas do nosso país. Por isso, aproveito este acontecimento para reforçar uma mensagem que me parece de vital importância, que é a de cada cidadão dar atenção efetiva ao dinheiro público.
Por vezes, há verdades lapalissianas, que deveriam ser pintadas nas paredes das nossas cidades para não cairmos no ridículo de nos esquecermos delas: o dinheiro público vem de todos nós, os contribuintes!
Ser contribuinte não é uma fatalidade, não é um castigo. É, antes, uma forma de participação política. Pagar taxas e impostos para o Estado central ou municipal são formas de contribuir para uma sociedade com lugar digno para todos: hospitais, escolas, segurança, mobilidade, etc. Podemos discutir a carga fiscal e/ou a forma como é aplicada a cada contribuinte, mas não podemos é perder de vista que esse dinheiro foi gerado fruto do nosso esforço.
Este esquecimento coletivo de que o dinheiro vem do nosso trabalho, manifesta-se em gestos de conivência com discursos relativos a pessoas responsáveis pela gestão desse dinheiro público, tais como: “rouba, mas o Concelho está melhor” ou “que importância tem de ter favorecido este ou aquele se no fim até era um homem preocupado com os pobres”. Se todos nós tivéssemos consciência do rasto dos impostos, talvez não tivéssemos a mesma complacência com esta gestão pública. Se percebêssemos que, na prática, o facto de um governante fazer um mau negócio (ou mesmo roubar!) implica na minha vida ter, por exemplo, menos dinheiro para gastar com os meus filhos, então a postura seria outra.
Não é tarefa fácil, mas seria um bom desafio cada um de nós somar todos os impostos que paga num ano: desde o IVA, imposto de rendimento, imposto de circulação, imposto selo, taxas, contribuições municipais, entre muitos outros, para que depois conseguíssemos medir o retorno dessa entrega de euros aos cofres públicos. A nossa exigência seria, seguramente, muito diferente. Às vezes fico com a sensação que a dificuldade de fazer estes cálculos é vontade de quem beneficia desta opacidade de informação.
E o que tem isto a ver com a JMJ?
Independente da crença de cada um, pois este raciocínio é válido para um encontro mundial com o Papa ou com o Dalai-Lama, a verdade é que na dimensão de retorno financeiro, este investimento do Estado é um bom exemplo de como o dinheiro público pode gerar valor. Os 40 milhões de euros gastos neste evento pelos cofres do Estado terão um retorno significativo para todos nós. Podemos avaliar o retorno de uma forma imediata, através da cobrança do IVA em todas as refeições que 1.200.000 pessoas fizeram durante 7 ou mais dias, pelos transportes que utilizaram, pelo imposto sobre os combustíveis que foram gastos, pelas dormidas que muitos pagaram. Mas também o retorno de médio e longo prazo que o nosso país irá beneficiar em muitas valências, mas sobretudo no sector do Turismo. Recentemente, o Primeiro-Ministro lembrou os dois saltos de dimensão que o nosso país deu no turismo: pós-Expo ’98 e pós Euro 2004.
Por muito que possa custar aos crentes, a verdade é que não foi por devoção que o Estado se envolveu nesta JMJ. E ainda bem que o Estado não se move pelas crenças religiosas. Se fosse pela Fé do nosso Primeiro-Ministro ou Presidente da República, então as críticas que se fizeram ao envolvimento de um Estado laico neste tipo de eventos seriam justas. Mas é evidente que este envolvimento nada fere a laicidade de Portugal porque nunca foi a Fé que o motivou. Simplesmente, estas contas, eles sabem fazê-las e bem. E nós, como contribuintes, vamos ficar todos melhor.
O meu desejo é que este escrutínio que surgiu pelos gastos do Estado na JMJ seja continuado em todas as despesas do Estado, pois desta forma seremos um país de contribuintes mais instruídos e com uma democracia mais fortalecida.