Os dados publicados hoje pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) confirmaram a descida da inflação portuguesa para 3,4%, em junho. Um valor 0,6 pontos abaixo do mês anterior. Essa é a variação homóloga, ou seja, quanto é que os preços aumentaram face ao mesmo mês do ano passado. A variação mensal – junho face a maio – foi 0,3%, depois de ter sido negativo no mês anterior (-0,7%). E teria sido mais baixa ainda sem a pressão nos preços relacionados com a atividade turística.
A inflação resume num só número aquilo que são múltiplas dinâmicas nos preços. Algumas delas muito diferentes. Em certos bens e serviços que os portugueses compram, os preços estão a cair, noutros eles estão a avançar mais devagar e há ainda alguns que continuam a disparar.
Segundo o INE, a grande categoria mais relevante para o arrefecimento de junho foi o vestuário e calçado, com uma quebra mensal de 1,4%. Habitação, eletricidade e gás; comunicações; e tabaco e bebidas alcoólicas são outras das classes que caíram em junho. Por outro lado, a categoria que mais contribui para manter a inflação elevada foram os transportes, com uma subida de 1,5%. Os preços em restaurantes e hotéis também dão um salto.

A publicação do INE vai mais longe na análise e olha para categorias mais “finas” que se destacam no seu papel de acelerar ou travar a inflação, já contando com o seu peso no cabaz de consumo dos portugueses. Nessa ótica, entre as cinco categorias apresentadas pelo INE, três delas estão relacionadas com Turismo: voos internacionais, hotéis e alojamentos semelhantes e férias organizadas no estrangeiro. Essas três apresentam variações mensais de 14,1%, 3% e 10,4%, respetivamente.
Estas subidas e importância para a evolução da inflação podem explicar-se, em parte, com a sazonalidade. Em maio, algumas destas categorias tinham até registado variações negativas. No entanto, em abril, já tinham apresentado subidas exuberantes.
O quadro abaixo permite ver esse efeito, assim como o grande impacto da fruta e do gasóleo (a coluna da direita mostra o contributo da classe, já levando em conta o seu peso no cabaz de consumo). Permite também observar o lado oposto do espectro, com produtos hortícolas, óleos, vestuário feminino, eletricidade e jogos e apostas a representarem as principais fontes de desaceleração dos preços.

Desde o início deste ano, a categoria “hotéis, motéis, pousadas e serviços de alojamento similares” está no top 5 de maiores contribuições para a inflação em todos os meses, exceto janeiro. Os voos e as férias organizadas também estiveram nesse top em abril.
Em baixo pode ver o contributo que cada uma dessas categorias deu à inflação em todos os meses desde o início do ano, num gráfico feito com dados enviados pelo INE à EXAME. As categorias não coincidem exatamente, porque o INE considera que é mais correto apresentar versões mais agregadas. Por isso aparecem todas as férias organizadas (não apenas as realizadas no estrangeiro) e todos os serviços de alojamento (não apenas aqueles mencionados, mas outros de curta duração).

A resistência que preocupa o BCE
Esta publicação do INE confirma o valor homólogo de inflação já anunciado há dias, mostrando que os preços seguem um caminho de arrefecimento. Parte da descida para 3,4% explica-se com o efeito base. Ao comparar com saltos muito grandes dos preços nos mesmos meses de 2022, é natural que a variação em 2023 seja automaticamente mais contida (só não seria assim se a inflação ainda estivesse a acelerar).
Também nesta ótica é possível observar como o Turismo pode estar a contribuir para manter a inflação elevada. Segundo o INE, os maiores contributos para a variação homóloga dos preços foram os bens alimentares e bebidas não alcoólicas, assim como os restaurantes e hotéis. Por outro lado, destacam-se as contribuições negativas dos Transportes e da Habitação, água, eletricidade, gás e outros combustíveis”, refere o instituto.
Apesar do claro arrefecimento do valor total de inflação, é preocupante notar que ele se deve à evolução de bens mais voláteis (como os combustíveis), que tinham disparado no ano passado e que afundaram nos últimos meses. A inflação subjacente – que exclui energia e alimentos não transformados – está a ter uma descida muito mais lenta, caindo apenas de 5,4% para 5,3%.
Este tem sido o indicador a que o BCE tem dado mais atenção e uma das justificações para manter o pé a fundo na subida de juros. A resistência da descida dessa inflação “core” é um problema comum a grande parte dos países europeus.
