“Para a hotelaria vai ser, substancialmente, um ano perdido. Só para 2021 é que podemos efetivamente ver uma retoma mais séria”, afirma, em jeito de conclusão, Cristina Siza. A diretora-geral da AHP falava aos jornalistas durante a apresentação dos resultados do último inquérito Impacto da COVID-19 na Hotelaria. “Não significa que não haja reservas e movimento durante este verão, mas não nos iludamos. Não vamos ter, neste verão, nada que permita pensar numa retoma”, concluiu a responsável, apontado o último trimestre do ano como a única pequena tábua de salvação que pode ajudar a consolidar a recuperação depois de o Grande Confinamento ter ditado o fecho de portas de praticamente todas as unidades do País.
O inquérito, realizado entre 15 e 29 de maio e que contou com as respostas de cerca de 60% dos associados da organização revela, entre outras coisas, que as empresas de hotelaria não esperam reduzir o preço médio do quarto aquando da reabertura das portas, admitindo, no entanto que possam levar a cabo promoções, upgrades e campanhas. “Mas os preços não vão cair”, garante Siza. Até porque, lembrou, as novas medidas de higienização vieram aumentar os custos por quarto (representam uma subida média de €40/mês por cada quarto), e poderão vir a tornar-se mesmo “anti-económicas no caso de serem ainda mais exigentes” e se não se garantir o seu equilíbrio, pediu. Cristina Siza lembrou ainda que Portugal tem já uma elevada taxa de exigência no que se refere aos critérios de higienização individual e dos espaços, e que é também por isso que tem sido possível manter o contágio relativamente controlado. “Os hotéis já tinham, desde sempre, muitíssimos cuidados – Portugal é dos países onde os hábitos de higiene e limpeza são mais elevados”.
Na mesma ocasião, a responsável justificou o facto de 97% das empresas de hotelaria defenderam mais medidas extraordinárias para o setor, pelo facto de o Turismo ter sido “o mais impactado” pela pandemia. “E não se esqueçam do peso expressivo que ele tem na nossa economia. Se o Turismo não for apoiado, por arrasto, uma série de outras atividades também caem. Por outro lado, o Turismo, como também sabemos, tem cerca de 400 mil pessoas empregados. Se o grosso das nossas empresas recorreu ao lay-off e quem não recorreu praticamente não despediu ninguém, a primeira preocupação é claramente manter os empregos. É considerado um sistema vital para a economia dos nossos países. Foi aquele que teve uma quebra mais abrupta e brutal, e que parou totalmente. E dentro do Turismo, a hotelaria e a aviação. Pode ter um sistema de arrasto muito gravoso para a economia”, considera.
Os hotéis já tinham desde sempre, muitíssimos cuidados – Portugal é dos países onde os hábitos de higiene e limpeza são mais elevados
Cristina siza
Recorde-se que durante os últimos anos este setor representou entre 10% a 13% do PIB nacional. No entanto, tem sido também um daqueles em que os Governos mais apostaram e mais apoiaram com sucessivas campanhas e apoios específicos.
O mesmo documento permite ficar a saber que 40% das empresas do setor recorreu a linhas de financiamento, com especial destaque para a linha de apoio à economia (no valor de €900 milhões de euros), à qual recorreram 88,14% das organizações. No entanto, salienta a responsável da AHP, “não foi a primeira opção das empresas no alojamento turístico mais convencional. Havia tesouraria ainda, nesta primeira fase. Havia muitos bons anos para trás e, portanto, o setor estava mais capitalizado. Os primeiros impactos não foram no sentido de ir a correr às linhas de financiamento, mas ir a correr ao lay-off, como vamos ver. Porque o primeiro custo fixo que, sem operação, pesa nas empresas, é o pagamento aos trabalhadores”.
Mais de 90% das empresas recorreram ao lay-off simplificado
Certo é que cerca de 70% dos pedidos de acesso ao lay-off simplificado disponibilizado pelo Govenro para fazer face aos efeitos da Covid-19 foram apresentados entre 15 e 30 de abril de 2020. Destes, 65% recorreram ao lay-off imediatamente, pelo período de três meses. Apenas 9,73% das empresas do setor não recorreu a esta ajuda do Estado, revela o mesmo inquérito.
Os dados agregados pela AHP mostram ainda que 95% das empresas colocaram pelo menos 50% dos trabalhadores em suspensão do contrato e 63% colocaram até 30% dos trabalhadores em redução do período normal de trabalho.
Num setor que emprega cerca de 400 mil pessoas e onde a precariedade é recorrente, os efeitos da pandemia têm sido – e deverão continuar a ser – particularmente dolorosos. O mesmo inquérito revela que 25% das empresas de hotelaria dispensaram os trabalhadores que se encontravam em regime experimental, e que mais de um terço (36%) decidiu não renovar contratos de trabalho a termo.
Nota ainda para o que os hoteleiros esperam em termos de reservas: as perspetivas são entre 20% e 40% de ocupação para metade dos inquiridos. Espera-se que apenas em novembro esse número suba para os 74,24%. Mas é preciso ter em atenção que as capacidades de serviços estão já fortemente reduzidas, pede a responsável da AHP. A maior parte dos inquiridos não acredita que as reservas vão além dos 50% nos meses de verão.
Nota ainda para os mercados que mais têm procurado um regresso aos hotéis: sem surpresa, Portugal lidera (34,7%), com Espanha (20,7%) e o Reino Unido (16,8%) logo atrás. As reservas têm sido feitas, maioritariamente, através do Booking (40,18%) mas os websites próprios (36,36%) destronaram a Expedia (20,63%) e são agora uma das plataformas mais utilizadas para reservar quartos.
A reabertura de fronteiras e rotas das transportadoras aéreas vai ditar bastante o futuro deste setor, pelo que a responsável pede alguma serenidade enquanto se espera pelas decisões das empresas que operam nessas áreas, e cuja atividade impacta diretamente a hotelaria nacional.
Recorde-se que o setor estima perdas de entre 3,2 e 3,6 milhões de euros para o ano de 2020.