A um oceano de distância, há centenas de aerogeradores a girar ao sabor do vento dos Estados Unidos com as cores da EDP coladas às costas. A energia verde que bombeia para o coração da maior economia do mundo, a uma escala que há décadas era inimaginável, é também cada vez mais vital para a empresa portuguesa, que este ano deverá fazer quase 40% do seu EBITDA via EDP Renováveis.
Numa das primeiras entrevistas após de ter sido reconduzido como CEO da elétrica, António Mexia desembaínha o argumento da aposta feita durante as suas administrações, com o reforço das eólicas e barragens e a diversificação geográfica – onde cabe a aposta em terras do Tio Sam -, para dizer que se a empresa tivesse seguido outro caminho, provavelmente hoje já não estaríamos a falar de EDP.
“Sem a aposta nas renováveis, seríamos uma empresa irrelevante – para não dizer que se calhar teríamos desaparecido. Se tivéssemos feito apostas erradas, como ir para o nuclear, provavelmente éramos uma empresa falida,” disse o gestor esta semana em Washington à EXAME, na reta final de uma visita a um parque eólico do Indiana, um dos maiores da América do Norte e onde a EDP marcou formalmente o início de uma nova etapa de desenvolvimento.
Aqui, numa geografia que deverá contribuir com quase 25% do EBITDA da empresa, já está em curso a fase VI de Meadow Lake, no Indiana. Serão 61 novos aerogeradores que estarão no terreno até ao final do ano, um acréscimo de 200 MW de capacidade instalada que vêm juntar-se aos mais de 600 MW já mergulhados na paisagem rural de White County, a norte de Indianápolis, e capazes de fornecer o equivalente a 200 mil casas.
Desde que os ventos cruzados da crise internacional começaram a amainar, este parque já perspetivou ou reforçou a sua capacidade instalada em mais de 30%. Em toda a América, a EDP construiu em 2017 quase 700 MW de capacidade. Tudo isto já com a chegada de Donald Trump à Casa Branca – e, com ele, o ceticismo sobre as alterações climáticas e a retórica pró-carvão. Mas o que pareciam nuvens negras no horizonte, dissipou-se entretanto quase como uma brisa, considera o CEO português.
“A necessidade das renováveis nos EUA é inquestionável. (…) Embora no final no ano passado houvesse algumas tentativas de perturbação das regras a meio do jogo, sobreviveu mais uma vez aquilo que é um princípio básico: quero mudar, mudo para o futuro. Não mexo no passado,” refere António Mexia, sobre as possíveis alterações no desenho da política das energias alternativas nos Estados Unidos. “A realidade tem demonstrado que os receios [face a Trump] foram, de certa maneira, infundados,” acrescenta.
Foi na capital da América que, com companhias americanas, japonesas, europeias e da Austrália, o presidente da elétrica partilhou o contributo da empresa portuguesa para a descarbonização da economia. Uma das ideias que ficou na International Electricity Summit, diz, é que não haverá descarbonização sem eletrificação. Outra ideia é o ritmo da transformação do setor, que deixa a cabeça dos gestores a andar à roda. “A cada 18 meses entre estas reuniões ficamos quase surpreendidos pela velocidade da mudança tecnológica quando comparamos com o que pensávamos há três, seis anos ou dez anos,” acrescenta.
A aposta estratégica nas renováveis não só assegurou, na ótica do CEO, a sobrevivência da EDP. É também o que tem posto a empresa a piscar insistentemente na rota das potenciais fusões e aquisições na Europa. Ainda esta semana surgiram rumores de uma aproximação – entretanto negada pela energética – à francesa Engie, a terceira notícia do género em menos de um ano, depois de já terem sido sugeridos possíveis noivados com a espanhola Gas Natural e com a italiana Enel. Cenários que António Mexia compara com um “jogo do Lego”.
Nesta entrevista à EXAME/Visão, a publicar na edição da próxima semana da revista Visão, o CEO da EDP fala ainda sobre os preços da eletricidade em Portugal, do caso dos CMEC, da sua experiência na política e da presença crescente dos investidores chineses na economia nacional.
*O jornalista viajou a convite da EDP