Naquela aula da 4ª classe, quando a professora perguntou o que “querem ser quando forem grandes”, ninguém respondeu que queria ser voluntário ou voluntária. Houve dois tipos de resposta: quem queria ser algo dentro do que conhecia na família (padeiro, polícia, mecânico), ou algo que desse dinheiro. Eu perguntei o que “era ser grande”, mas a professora não me respondeu. Então achei melhor responder à pergunta e disse que queria ser bombeiro. Na realidade, anos mais tarde, fui bombeiro voluntário, embora não tenha relacionado uma coisa com a outra.
O sistema educativo poderia beneficiar muito se as crianças se envolvessem em voluntariado e o voluntariado beneficiaria muito envolvendo crianças e jovens como uma forma de colaborar na educação cívica e humana que talvez nos esteja a faltar. De incutir, de certa forma, os “tais valores” de que tanto se diz estarem em défice nas crianças e jovens (embora ainda não me tenham explicado efetivamente que valores são esses). No entanto, não me refiro a nenhum tipo de moralidade ou caridade, apenas penso que o voluntariado pode ser também um meio para promover uma participação mais ativa e solidária na sociedade e na criação de consciência social, tão necessárias para o nosso bom desenvolvimento enquanto sociedade. Talvez mesmo a democracia, seja ela qual for no futuro, dependerá destas formas de participação mais diretas, que o voluntariado nos pode proporcionar, em vez do indireto ato democrático do voto que apenas elege representantes.
Na realidade, neste mundo global e “redondo” em que estamos, o voluntariado dá-nos um certo sentido de que fazemos algo de importante, ao contrário da ideia de que o mundo é tão grande que não podemos fazer nada de relevante para mudar alguma coisa. As pessoas querem que os seus filhos e filhas tenham sucesso na vida. Tirem um curso, tenham bons empregos e dinheiro. Para algumas pessoas basta terem dinheiro que o resto pouco importa. Mas a verdade é que vivemos numa teia de relações e interligações onde a falta de solidariedade nos afetará a todos e todas. Pouco importará, num determinado momento, o nosso estrato socioeconómico, a verdade é que todas as pessoas serão afetadas se a educação estiver direcionada apenas para conhecer “uma língua e saber a tabuada”. Os computadores fazem bem esse trabalho de cálculo. Mas a humanidade e solidariedade não, as máquinas não adquirem esses estados, não compreendem e não substituem a humanidade solidária que está latente nas crianças só à espera que seja desperta na sua educação.
Além da cidadania e solidariedade, temos ainda a liberdade, que é outro conceito muito presente na nossa vida diária, mas talvez pouco compreendido. A liberdade de escrever o que se quer (como este texto) não é necessariamente liberdade. Liberdade é muito mais profunda e complexa do que isso. O que mais me fascina e incentiva no voluntariado é que este é uma escolha livre de cada pessoa em agir, optar e experimentar, no qual e ao mesmo tempo, se produz algo de mais positivo para nós e para as outras pessoas. É um grande ato de liberdade. Quem faz voluntariado faz porque “quer” e não porque “tem que fazer”.
Quantas pessoas podem dizer isto do seu trabalho? O que melhor há do que sermos livres para pensar, escolher e agir, tornando-nos ao mesmo tempo mais úteis na sociedade? Então, educar as crianças e jovens para o voluntariado é educar para solidariedade, cidadania e liberdade.