Oinverno ainda não chegou em força à Islândia, mas o melhor conselho para quem visita o país é sempre o mesmo, agasalhe-se. Gorro, cachecol, luvas, roupa térmica, um bom casaco e vestir-se em camadas é meio caminho andado para poder explorar-se esta ilha localizada no meio do Atlântico Norte, muito próxima do Círculo Polar Ártico. Situada na falha entre as placas tectónicas euro-asiática e norte-americana, a sua geografia e a sua geologia são o que lhe dá carácter, rudeza e encantamento.
Estamos no país dos geisers, das fontes de água quente, das cataratas, das auroras boreais e dos vulcões. Perto de Grindavík, a cerca de 30 quilómetros da capital, Reiquiavique, um vulcão entrou em erupção há poucos dias, na cratera Sundhnúksgígar. Vimo-lo muito, muito, ao longe, quando regressávamos da caça às auroras boreais. Numa noite de Lua quase cheia, esperámos cerca de duas horas por elas, sem nunca terem aparecido. “Acontece, é a Natureza que manda. A nós, cabe-nos procurar o melhor sítio para as vermos e acautelar as condições meteorológicas”, diz-nos Juliana, a guia portuguesa que nos acompanhou na excursão da Reykjavik Excursions by Islândia. Na noite fria e ventosa (estavam cerca de oito graus negativos), sentiu-se o desapontamento no grupo, mas outras descobertas haviam de compensar esta pouca sorte. “Não devemos sair frustrados, parte do encanto das auroras boreais é este, procurá-las. Se possível, recomendamos o reagendamento do passeio, é gratuito”, justifica, entusiasmada.
Abençoadas águas
Os fenómenos naturais são a razão por que cada vez mais turistas elegem a Islândia como destino, seja na primavera/verão, quando as temperaturas estão mais amenas, ou no inverno, quando as temperaturas descem abaixo de zero e os dias têm cerca de quatro horas de luz solar (dezembro e janeiro).
A Islândia pode explorar-se de carro, um desafio devido às condições meteorológicas, tenha sempre isso em conta. Partimos cedo para fazer o Circuito Dourado e visitar três dos locais mais turísticos, a área geotermal de Geysir, no vale Haukadalur; a espetacular queda de água de Gullfoss, e o Parque Nacional de Thingvellir, património UNESCO desde 2004 e repleto de História. No desfiladeiro Almannagjá foi estabelecido o primeiro parlamento do país, designado Althing, e o mais antigo do mundo, agora a funcionar dentro de portas na capital. Esta beleza natural marca também a margem da placa tectónica da América do Norte.
O Circuito Dourado estende-se por cerca de 300 quilómetros. Durante a viagem espantamo-nos com a paisagem gelada e os campos de lava a ladear a estrada, mas será o geiser, a expelir a sua água, em média 25 a 30 metros de altura, e a queda de água de Gullfoss, com uma altura de 32 m e uma largura de 70 m, a receber mais “uaus”, são impressionantes. A cultura islandesa gira à volta da água e um dos rituais é ir aos banhos geotermais. Experimentámos a Sky Lagoon, a cerca de dez minutos do centro da cidade, e viemos de lá revitalizados. Ter o corpo mergulhado em água a 38 a 40 graus numa lagoa ao ar livre, com a montanha vulcânica Keilir em frente, é inesquecível.
Pitoresca Reiquiavique
O hotel Midgardur by Center Hotels, em Laugavegur, é um bom ponto de partida para descobrir a cidade, sempre a pé. Reiquiavique é a capital mais a norte do mundo e uma das mais pequenas da Europa, sem que isso seja um defeito, antes uma qualidade.
Passear pela rua mais comercial, a Laugavegur, faz parte do roteiro turístico, assim como visitar o Harpa Concert Hall & Conference Center, sede da orquestra sinfónica e da ópera islandesa, e admirar a escultura em aço The Sun Voyager, de Jón Gunnar Árnason, uma ode ao Sol que simboliza o passado viking dos islandeses, ambos localizados junto à baía de Faxaflói. É daqui que partem os barcos da Elding para os passeios de observação de cetáceos. Orcas, baleias-de-minke, toninha-comum, golfinho-de-bico-branco e baleia-corcunda são algumas das espécies que se avistam num cenário de tirar o fôlego. Do mar, avista-se o monte Esjan, 914 metros acima do nível da água, um ex-líbris da capital, e a ilha de Vioey, onde está a instalação Imagine Peace, um feixe de luz visível de todos os cantos da cidade e arredores, que é uma obra de Yoko Ono em homenagem a John Lennon.
Voltamos a terra para percorrer a rua Skolavordustigur, que leva à igreja luterana Hallgrims Church, a maior da Islândia, com uma torre de 75 metros e um belíssimo órgão de tubos. Repomos energia a poucos metros com um jantar no KOL, onde nos servem cordeiro, um dos produtos-chave da gastronomia, a par do peixe.
O dístico da Icelandic Lamb, associação de promoção do cordeiro islandês, fixado no exterior, atesta a qualidade da carne servida. Não hesitámos e à mesa chegou um naco de cordeiro assado, acompanhado de batata hasselback, uva confitada, tomilho ártico e molho de Madeira e mirtilo.
Devido à insularidade, a gastronomia tradicional islandesa é baseada em fumados, salgados, curados e fermentados, com alguns sabores muito marcados, a que não se deve resistir, antes experimentar, como o tubarão fermentado e o peixe seco.
Na mesma zona da cidade, umas ruas abaixo, o OTO, liderado pelo premiado chefe islandês Sigurður Laufdal, é um dos representantes da cozinha islandesa moderna e um dos oito restaurantes recomendados no Guia Michelin. A carta, uma fusão de gastronomia italiana e japonesa, tem pratos tão criativos e bonitos quanto surpreendentes de sabor. Escondido na rua Klapparstígur, o Monkey’s tem aura de speakeasy bar e serve cozinha nikkei, uma fusão de sabores peruanos e japoneses, e ainda esconde o The Champanhe Train, um bar inspirado nas viagens de comboio dos anos 20.
O périplo gastronómico pode ter muitas mais paragens, Reiquiavique tem vindo devagarinho a afirmar-se gastronomicamente e essa também foi uma boa surpresa no país do gelo e do fogo.
Não Perder Na estufa de tomate de Frioheimer, um dos maiores produtores do país, o fruto é iguaria à prova num pequeno café, onde há sopa, bloody mary e até cerveja de tomate.
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