As fortunas dos multimilionários do setor da alimentação e da energia cresceram 453 mil milhões de dólares (422 mil milhões de euros), nos últimos dois anos, devido ao aumento dos preços da energia e de bens de referência, como cereais, carvão, ouro, açúcar, petróleo e gás natural, durante a pandemia e desde o início da guerra na Ucrânia, há três meses. A conclusão é do mais recente relatório da Oxfam, confederação de várias organizações, a atuar em mais de 90 países para colmatar problemas de pobreza, desigualdade e injustiça social.
Enquanto a elite mundial empresarial e política está reunida em Davos, na Suíça, para o Fórum Económico Mundial, até quinta-feira, 26, a instituição britânica assinala como a espiral dos preços globais dos alimentos ajudou a criar 62 novos multimilionários do setor alimentar, em apenas 24 meses
A norte-americana Cargill, empresa privada de produção e processamento de alimentos, uma das maiores do mundo, conta agora com 12 membros da família como multimilionários, contra oito antes da pandemia. A família Cargill, juntamente com outras três empresas, controla 70% do mercado agrícola global.
Os preços dos alimentos, que subiram mais de 30% em média em 2021, provavelmente levarão mais de 263 milhões de pessoas à pobreza extrema do que antes da pandemia. Esse número equivale às populações do Reino Unido, França, Alemanha e Espanha juntas, e levaria o número de pessoas que vivem com menos de 1,90 dólares (1,77 euros) por dia para 860 milhões até ao final deste ano.
“É moralmente indefensável que as pessoas no Leste de África estejam a morrer de fome, enquanto as fortunas dos mais ricos do mundo são alimentadas pela escalada dos preços dos alimentos e da energia”, diz Danny Sriskandarajah, presidente-executivo da Oxfam. “Numa altura em que centenas de milhões de pessoas enfrentam uma situação de pobreza extrema, não pode haver desculpa para os governos não abordarem a questão dos lucros e riquezas gigantes, de forma a garantir que ninguém é deixado para trás.”
Em Davos, a Oxfam pediu aos líderes mundiais para criarem e aplicarem de imediato impostos sobre a riqueza dos milionários para ajudar a combater “o maior aumento da pobreza extrema em mais de 20 anos”.
O bom exemplo da Argentina
Como exemplo, a instituição abordou o caso da Argentina que implementou um “imposto único de solidariedade sobre os lucros inesperados ganhos durante a pandemia”. No ano passado, a taxa argentina arrecadou 223 mil milhões de pesos (1,7 mil milhões de euros).
A Oxfam pediu também a introdução de impostos permanentes sobre a riqueza para “controlar a riqueza extrema e o poder de monopólio”. A sugestão dita que o imposto anual sobre a riqueza começasse em 2% para milionários, subindo para 5% para multimilionários, podendo gerar 2,5 biliões de dólares ao ano.
Valor suficiente, segundo a Oxfam, “para tirar 2,3 mil milhões de pessoas da pobreza, produzir vacinas suficientes para o mundo e fornecer assistência médica e proteção social universal para todos que vivem em países de baixa e média renda”.
Um terceiro apelo visa acabar com o “lucro da crise”, introduzindo um imposto temporário sobre todas as grandes empresas, não apenas as de petróleo e gás, conforme proposto pelo Partido Trabalhista no Reino Unido. A Oxfam contabilizou que esse imposto sobre “apenas 32 empresas multinacionais muito lucrativas poderia ter gerado 96 mil milhões de euros em receita, em 2020”.
“A introdução de impostos sobre a riqueza, por exemplo, juntaria avultadas somas que poderiam ajudar grupos vulneráveis a sobreviver a esta crise e a construir um futuro melhor”, disse Danny Sriskandarajah. “No Reino Unido, um imposto inesperado sobre as empresas de energia seria um ponto forte para começar a ajudar todos aqueles que estão a lutar para comer e aquecer as suas casas.”
Durante a pandemia, surgiram 573 novos multimilionários. A crise pandémica foi, segundo a Oxfam, “o melhor momento da história para a classe mais rica”.
A riqueza combinada dos multimilionários é de 11,8 biliões de euros, de acordo com o ranking da revista Forbes sobre os super-ricos. Isso é o equivalente a 13,9% do PIB global, e um aumento de três vezes em relação a 2000. As fortunas dos 20 bilionários mais ricos do mundo são maiores do que todo o PIB da África Subsariana.