Quinze anos depois de ter sido construída, a ponte Vasco da Gama falhou o objetivo principal de retirar carros à 25 de Abril, tendo mesmo registado no ano passado o tráfego médio diário mais baixo dos últimos 12 anos.
Segundo dados do Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias (INIR), desde que a Vasco da Gama foi inaugurada, a 29 de março de 1998, o tráfego na ponte 25 de Abril apresentou sempre crescimentos anuais até 2007. Nem a inauguração do comboio na ponte, em 1999, retirou trânsito àquela infraestrutura.
Por outro lado, a Vasco da Gama tem sido palco de variados eventos, como maratonas, ciclismo, corridas ilegais de automóveis e uma super feijoada… Além da meia maratona de Portugal e do World Bike Tour, o seu tabuleiro foi também a “pista” preferida para alguns automobilistas que ali faziam com alguma regularidades corridas a velocidades que podiam chegar aos 280 quilómetros/hora.
Casas por acabar, casas por vender e “condomínios-fantasma”, onde moram apenas duas ou três famílias, são também uma consequência do “boom” imobiliário que se deu em Alcochete e Montijo aquando da construção da ponte Vasco da Gama.
Numa visita por aquela zona são visíveis os novos bairros que foram criados e que foram ocupados por pessoas atraídas por casas novas a preços impensáveis em Lisboa e pela curta distância que a ponte veio trazer entre as duas margens.
Ainda as divisões
A ponte Vasco da Gama continua, assim, a dividir autarcas e ambientalistas, com uns a aplaudirem o desenvolvimento que trouxe e outros a tecerem críticas por ter causado mais “malefícios do que benefícios”.
Foi uma obra fundamental (…) tornou o país mais próximo, tendo sido importante para a Área Metropolitana de Lisboa e, em concreto, para o concelho de Alcochete que aproveitou esse fator de desenvolvimento para ele próprio se desenvolver aos mais variados níveis: no plano demográfico, mas também no plano do desenvolvimento económico”, disse à agência Lusa o presidente da câmara de Alcochete.
Rejeitando que a ponte tenha “dado prejuízo”, Luís Franco defendeu que “os malefícios só poderiam resultar se o município não estivesse preparado, no domínio do planeamento, para assumi-la como um desafio”.
Questionado sobre as muitas casas construídas na sequência da ponte e que continuam por vender, o autarca eleito pelo PCP disse que resultam da “gravíssima crise económica e financeira” e não “de um mau planeamento no que respeita à expansão urbanística”.
No concelho vizinho do Montijo, a presidente da câmara também faz um “balanço muito positivo” da construção da ponte Vasco da Gama, afirmando que em 1998 aquela cidade “era uma espécie de enclave, com dificuldade grande de acesso”.
“Com a abertura da ponte Vasco da Gama ficámos a dois passos do Marquês de Pombal e revelou-se, no plano das acessibilidades, fundamental e decisivo para desenvolvimento do Montijo”, sublinhou Maria Amélia Antunes (PS).
Segundo a autarca, muitas pessoas foram viver para o Montijo, atraídas pelas novas urbanizações e pelos novos investimentos na área do comércio e da logística.
“De acordo com os Censos 2011, entre 2001 e 2011, a população cresceu 30,78 por cento”, indicou.
Contudo, a presidente admitiu que o desenvolvimento e progresso trouxeram também aspectos negativos, como o trânsito, “que aumentou significativamente, o ruído e alguma poluição”.
Questionada sobre as casas que permanecem por vender, a autarca disse que é consequência da “expectativa excessiva” criada com a construção da ponte.
“Temos urbanizações por acabar e que são um custo para a câmara, com a manutenção das infra-estruturas e dos espaços públicos, há ainda dezenas de fogos por construir e outros por habitar”, afirmou.
Do lado dos ambientalistas, todos são unânimes em dizer que a ponte Vasco da Gama não atingiu os objectivos propostos na altura e que teve como consequência um grande desordenamento do território.
“Contribuiu para a expansão populacional para a periferia, quando aquilo que se pretendia era recentrar a população nos centros urbanos”, disse a vice-presidente da Quercus, Carla Graça.
A ambientalista lembrou que está por cumprir o “grande objectivo”, que era retirar trânsito à ponte 25 de Abril, e criticou a Vasco da Gama por “nunca ter contemplado a travessia ferroviária”, lembrando que esse foi o motivo das principais críticas da Quercus, que chegou a apresentar queixas juntos das instâncias europeias contra a construção daquela ponte.
Em declarações à Lusa, o presidente da GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e do Ambiente), disse que a ponte agravou “um problema que é do país todo: o excesso de construção”.
“Não trouxe grande desenvolvimento económico à zona, trouxe mais confusão, maior percentagem da população não servida de transportes públicos e não se resolveu problema das travessias do Tejo em Lisboa, que continuam congestionadas”, disse João Joanaz de Melo.
Do lado da Liga para a Protecção da Natureza, Eugénio Sequeira frisou que “o impacto que causou foi superior aos benefícios que trouxe”.
“Ela não tirou o trânsito da 25 de Abril, o que fez foi aumentar a pressão na zona de Alcochete e Montijo e criou uma apetência para o desenvolvimento da asneira crassa que é o aeroporto de Alcochete, que não foi para a frente porque houve a crise”, afirmou.
A ponte Vasco da Gama, com 17,2 quilómetros, foi inaugurada a 29 de Março de 1998, e representou um investimento de 897,8 milhões de euros.