O armário do gabinete do procurador João Paulo Centeno guardou, nos últimos quatro anos, a bomba judicial que fez cair o governo de maioria absoluta de António Costa. E fechado à chave, de acordo com declarações do próprio magistrado do Ministério Público que, em 2019, foi diretamente designado pelo ex-diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Albano Pinto, para investigar o processo 581/19, que levou à detenção, esta semana, de Vítor Escária, chefe de gabinete de António Costa, Diogo Lacerda Machado, advogado e amigo do primeiro-ministro, e à constituição como arguido de João Galamba, ministro das Infraestruturas.
O presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, e os gestores da empresa Smart Campus, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, este último também sócio da sociedade de advogados Morais Leitão, também foram detidos e começaram, esta quarta-feira, a ser ouvidos pelo juiz Nuno Dias Costa do Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa (TCIC), um magistrado descrito como “sereno, mas com mão firme”, no que toca a decisões. Ao que a VISÃO apurou, o Ministério Público considera ter existido uma teia de tráfico de influências, que levou à aprovação dos projetos do hidrogénio do centro de dados, em Sines, e da exploração de lítio, em Montalegre.
A sombra de Costa
Diogo Lacerda Machado, Empresário

Advogado, administrador de várias empresas e melhor amigo de António Costa. Os dois conheceram-se numa aula de História das Instituições, na Faculdade de Direito de Lisboa, em 1981, e tornaram-se presença assídua na vida um do outro. O consultor da Start Campus, detido no âmbito da investigação à exploração de lítio, foi padrinho de casamento do primeiro-ministro e é um dos principais conselheiros. Discreto, alegadamente dono de uma memória prodigiosa e um negociador nato, Lacerda Machado foi secretário de Estado da Justiça de Costa, tempo em que criou os Julgados de Paz e foi precursor da ideia do Cartão de Cidadão. Mais tarde, ajudou-o a reverter a privatização da TAP e a encontrar soluções para os lesados do BPI. Costa abriu-lhe portas, mas Lacerda construiu o seu nome à margem: foi presidente do Banco da África Ocidental (Guiné-Bissau) e vice-presidente da Caixa Económica de Cabo Verde; integrou o Conselho Geral e de Supervisão da EDP; passou pela Geocapital (sociedade de Macau ligada a Stanley Ho) e foi administrador da TAP, entre 2017 e 2021.
Filho de um militar de Infantaria, viveu em Angola e estudou depois no Colégio Militar. É um sportinguista ferrenho. Apaixonado por aviões, coleciona cartões de embarque e já disse que a amizade com o primeiro-ministro tem-no “prejudicado mais do que beneficiado”, nomeadamente quando foi criticado por prestar consultoria estratégica e jurídica ao governo, em 2016.