Não há debates inúteis em democracia, mas, se houvesse, este podia ser um deles. Pedro Passos Coelho, Paulo Portas e os seus ministros sentaram-se esta tarde na bancada do Governo, para dois dias de discussão que vão culminar com a anunciada rejeição do seu programa.
“Não ignoro que o começo desta nova legislatura está marcado por decisões que rompem com algumas convenções” dos últimos 40 anos, começou por dizer o primeiro-ministro, no hemiciclo, doze minutos depois das três da tarde. “E não escondo, na minha condição de cidadão, a apreensão com que olho para as promessas de novas convenções que alguns partidos querem trazer para este mandato”, acrescentou.
Ao longo do seu discurso de 14 páginas A4, Passos Coelho não esqueceu as circunstâncias de apresentação do programa do XX Governo Constitucional – uma esquerda unida com visto prévio negativo em relação às suas propostas. Por isso, fez questão de sublinhar as áreas em que houve evolução, nos últimos quatro anos, e de lembrar que só por isso é permitido sonhar, hoje, com menos austeridade.
“Portual conhece hoje uma situação bem diferente [da encontrada em 2011]”, disse o primeiro-ministro. Recuperação do investimento, redução do desemprego, aumento das exportações e contas externas postivas foram alguns dos exemplos dados para demonstrar a diferença que separa o clima de 2011 do de 2015. “ A austeridade nunca foi uma questão de escolha, mas de necessidade”, justificou. “Não há nada de ideológico em assumir um programa de ajustamento”.
Passos disse-se aberto ao diálogo e explicou a sua escolha pelas “reformas seguras e graduais” em detrimento de um “programa político imediatista e irrealista” de regresso ao passado. Aproveitou, então, para destacar algumas medidas prioritárias, tais como: completar o ciclo reformista, responder ao retrocesso demográfico, combater as desigualdades sociais, promover a mobilidade social, reformar a Segurança Social, fortalecer a competitividade da economia, fomentar a modernização administrativa, etc.
Quase no final do discurso, Passos lançou uma última farpa à esquerda: “O Governo está ciente de que os portugueses votaram pela estabilidade, pela responsabilidade e pela capacidade de compromisso entre as forças políticas que defendem a continuidade de Portugal na União Europeia e no Euro”. Um Bloco Central, portanto?
Sem apelar à oposição para que deixasse passar o seu programa, o primeiro-ministro assumiu que estará disponível para “uma política positiva, ao serviço dos portugueses, da recuperação do País e da credibilidade nacional”. Mas deixou o recado: não contem com ele para aventuras. “Assumo a responsabilidade de não colaborar, e de me opor, a uma política negativa, de ruína de Portugal, em que os portugueses são vistos como meros instrumentos de jogadas políticas de poder”.
O discurso terminou ao fim de quarenta minutos, com aplausos das bancadas do PSD e do CDS. Há quatro anos, a primeira sessão de debate do programa terminou por volta das 20h30 e, além do primeiro-ministro, Vítor Gaspar (ministro das Finanças) foi o único membro do Governo a discursar.