“Eu acho que o que é preciso é apelar aos angolanos para que façam um esforço de esclarecer tudo, todas as dúvidas que existem, comparando os dados, comparando as atas síntese, comparando os somatórios e que se resolva efetivamente no ponto de vista da verdade eleitoral, mas de forma pacífica e com recurso às próprias instituições angolanas”, disse à Lusa.
Angola, “com a dimensão e com a relevância” que tem, “precisa de ter um processo eleitoral em que não haja nenhuma deficiência relevante”, defendeu.
“Há coisas a corrigir. Isso parece-me claro”, vincou Porfírio Silva, que salientou que a própria missão de observação eleitoral da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) “identificou deficiências relevantes no processo que têm de ser corrigidas: o acesso dos candidatos aos órgãos de comunicação social, que deve ser igualitário e não foi. Isso é, obviamente, um aspeto importante”, afirmou.
O deputado considerou ainda que houve atrasos “na divulgação dos cadernos eleitorais e outros materiais, que deve ser feita nos prazos previstos na lei com antecedência prevista”, referindo que esse atraso “é sempre mais prejudicial aos partidos com menos estrutura, com menos implantação, com menos meios, e é óbvio que isso devia ser corrigido”.
“E também é uma referência ao registo eleitoral oficioso. No fundo, à lista de quem são os eleitores que por serem maiores, são cidadãos com capacidade eleitoral e que também não foi feito com antecedência suficiente e com o processo do que se chamou auditoria, que fosse completamente claro para toda a gente, como é que foi feito”, rematou.
Porfírio Silva considera que “o processo eleitoral angolano tem os instrumentos apropriados para garantir a fiabilidade do resultado eleitoral”, pelo que defende que as diferenças entre os resultados provisórios divulgados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e os relatados pela União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, principal partido da oposição) devem ser conferidas.
“Isto para nós é essencial. Independentemente de deficiências que o processo teve, e é óbvio que o processo teve deficiências e que têm de ser corrigidas (…) penso que é de sublinhar que o sistema tem instrumentos, tem ferramentas em que, desde que todos façam a sua parte e incluindo os diferentes partidos, é possível distinguir entre uma alegação de fraude que seja infundada e uma alegação de fraude que seja fundada”, sustentou.
Daí que, “se a UNITA diz que há e se outros partidos dizem que há discrepâncias, é importante que seja possível comparar os resultados provisórios que entretanto foram anunciados e as evidências que outros partidos tenham de que aqui ou ali, neste município, naquela província ou não é aquilo, mas é outro, e mostrar as evidências”, referiu.
Porfírio Silva escusou-se a comentar a proposta feita pela UNITA para a criação de uma comissão internacional que confira os resultados oficiais provisórios e os que o principal partido da oposição alega ter.
“Eu acho que o principal dever de um observador é ter a noção de que está para testemunhar e não está para interferir, nem para dizer às autoridades e às forças políticas de um país o que é que devem fazer e, portanto, eu não farei isso agora. Eu penso que qualquer país soberano entenderá que deve usar os seus próprios mecanismos legais para resolver os problemas que existam, sem estar, enfim, a pôr em causa a própria dignidade, digamos assim, do país, achando que à primeira dificuldade tem que ser chamar alguém estrangeiro para resolver”, disse.
Todavia, acredita ser “desejável que possa haver uma comparação transparente entre os resultados provisórios que a Comissão Nacional Eleitoral anunciou e as informações concorrentes sobre as informações díspares que a UNITA ou qualquer outro partido possam ter. Tem de haver meios para fazer isso internamente”.
Esta foi a segunda vez que Porfírio Silva integrou uma missão de observação eleitoral em Angola. A primeira foi em 2017.
“Eu acho que nós temos de ter a noção de que é importante de que uma democracia precisa de eleições livres e, portanto, nós precisamos que tudo corra bem e que tudo corra de forma igualitária entre as diferentes candidaturas numas eleições. E há manifestamente coisas a corrigir”, defendeu.
“A missão de observação eleitoral da CPLP identificou um conjunto de coisas que têm de ser melhoradas, que é preciso um compromisso das autoridades para melhorar. Agora nós também não nos podemos colocar na posição de que, à partida, achamos sempre que só será livre uma eleição em que nós sejamos vencedores”, vincou.
Segundo dados divulgados pela CNE, quando estavam escrutinados 97,03% dos votos das eleições realizadas na passada quarta-feira, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder desde 1975) obteve 3.162.801 votos, menos um milhão de boletins escrutinados do que em 2017, quando obteve 4.115.302 votos.
Já a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) registou uma grande subida, elegendo deputados em 17 das 18 províncias e obtendo uma vitória histórica em Luanda, a maior província do país, conseguindo até ao momento 2.727.885 votos, enquanto em 2017 obteve 1.800.860 boletins favoráveis.
No entanto, o líder da UNITA, Adalberto Costa Júnior, contestou na sexta-feira a vitória do MPLA e pediu uma comissão internacional para comparar as atas eleitorais na posse do partido com as da CNE.
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