Desde a adoção do euro, a taxa de poupança das famílias portuguesas caiu para cerca de metade do rendimento disponível: de um valor de 10% em 2002 passámos para 4,2% em 2015, o que representa uma quebra no fluxo da poupança de pouco mais de 10 mil milhões para 5 mil milhões de euros. Mas esta descida não se deu de forma contínua. Em 2009, logo após a crise financeira mundial, a poupança voltou a tocar os valores máximos registados desde a entrada em circulação da moeda única, provando que as famílias poupam mais quando temem acontecimentos inesperados – como por exemplo o desemprego.
Mas a evolução da poupança em Portugal tem outras particularidades. Dados do Inquérito à Situação Financeira das Famílias referentes a 2013, recolhidos pelo INE e analisados pelo gabinete de estudos do Banco de Portugal no boletim económico de maio, indicam que são as famílias com rendimentos mais elevados, e geralmente mais escolarizadas, aquelas que mais poupam. Sabendo-se que 80% da poupança total é feita por apenas 20% das famílias mais ricas, que se situam no quinto e último quartil do rendimento disponível. Este dado leva o próprio BdP a concluir que “a poupança pode ser encarada como um bem de luxo”. Já os que menos ganham, não poupam tanto – ou mesmo nada. Provavelmente porque não conseguem.
À medida que diminuíram as desigualdades na distribuição do rendimento entre pobres e ricos em Portugal (como sucedeu entre 2002 e 2008), a taxa de poupança também encolheu, até valores próximos dos 7 por cento. A partir de 2009, o acentuar da crise e o aumento das desigualdades e das incertezas sobre o futuro fizeram aumentar a taxa de poupança, que registou uma subida para cerca de 10%, só verificados antes da adesão ao euro. Por precaução, as famílias continuaram a poupar até 2013. Mas o fim do resgate trouxe uma melhoria das expectativas e um aumento do consumo privado e, com elas, uma nova descida da poupança – desta vez, para os valores mais baixos desde 2002, a rondar os 4% do rendimento disponível.
Nos dois últimos anos – 2014 e 2015 -, não foi ainda estudada a relação entre as desigualdades e os níveis de poupança, mas a descida da taxa entretanto verificada poderá ser explicada pelo aumento do consumo de bens duradouros e do acesso mais facilitado ao crédito do pós-resgate.
Poupa-se mais por medo do futuro
Em Portugal, poupa-se por medo do futuro ou para ter uma velhice descansada. A educação e o apoio aos filhos surgem em terceiro lugar entre as razões que levam os portugueses a poupar, seguido pelo recebimento de heranças, pagamento de dívidas, compra de viagens e de férias e compra de casa própria.
O estudo do BdP mostra também que é na idade ativa que os portugueses mais poupam. Entre os 35 e os 44 anos, a taxa de poupança média aproxima-se dos 25% do rendimento disponível. Na idade média de entrada no mercado de trabalho, e também a partir da idade da reforma, a poupança entra em declínio – para um quinto do rendimento disponível, em ambos os escalões etários.
Na União Europeia, Portugal é o terceiro país europeu com menor taxa de poupança, a seguir à Grécia (onde a taxa é negativa) e à Polónia. A taxa nacional de 4,2% só é igualada por países com realidades económicas muito distintas, como o Reino Unido e, fora da Europa, os EUA. No outro extremo, entre os países europeus que mais poupam, estão a Alemanha, a Suécia e França. A média da taxa de poupança da zona euro em 2015 atingiu os 12,5%.
A poupança das famílias, tal como a das empresas e do Estado, tem influência no crescimento potencial da economia a na capacidade de financiamento do investimento.