Se precisa de uma razão para ser otimista quanto ao futuro da humanidade, basta pôr os olhos no relatório da consultora Deloitte sobre os Millennials e a Geração Z (os nascidos entre 1995 e 2010). Socialmente empenhados, estes jovens estão comprometidos com o ambiente, com a justiça racial, o combate às desigualdades de rendimento e de acesso à saúde, o ativismo por uma sociedade mais equilibrada.
Podemos dizer que isso é típico dos jovens e cinicamente intuir que mudam com a idade. O certo é que estamos perante uma geração super informada e, com tanto acesso a pensamentos e ideias, esta juventude já não vai em conversa fiada. Isso mesmo mostram os estudos da especialista em tendências Geraldine Wharry, citada pelo jornal The Guardian.
“As audiências querem saber onde é que os influenciadores e as marcas se posicionam para que possam fazer escolhas informadas, tanto sobre quem seguem como a quem compram”, nota. No mesmo jornal, Jeff Fromm, autor de Marketing to Gen Z, afirma: “Os jovens desta geração são muito mais espertos para a sua idade e sabem como transformar as suas ideias em ações com sentido”.
Nas redes sociais, esta atitude dos Z, cujos membros mais velhos têm agora 26 anos, traduz-se numa certa falta de paciência para influenciadores sem conteúdo. “É esperado que os influenciadores sejam agora mais autênticos do que nunca. A transparência também é exigida. Os influenciadores podem facilmente ser alvo de críticas se usarem termos historicamente errados, por exemplo”, continua Geraldine Wharry.
Neste sentido, surge a preferência pelos chamados “genuinfluencers”, um termo cunhado pela WGSN, uma empresa de previsão de tendências. “Eles não se especializam em conteúdos de moda, beleza ou lifestyle. Em vez de publicações sobre produtos, estes criadores divulgam informação importante”, explica uma consultora da empresa.
Mais perto das pessoas
Um artigo recente da Vogue Business mostra como as marcas estão cada vez mais interessadas em ligar-se a estes “genuinfluencers”, não se limitando a procurar alguém conhecido que promova os seus produtos, antes trabalhando com os criadores na promoção de ideias ou de temáticas culturais. “Olhar que a simples métrica do número de seguidores ou das taxas de envolvimento já não chega; é importante ver mais longe. Relevância e autenticidade são agora dois dos fatores mais lucrativos”, nota Jane Lim, da agência Foundation PR.
No top 10 dos “genuinfluencers” eleitos pela Vogue Business surgem nomes como Munroe Bergdorf (modelo e ativista com a injustiça racial e pelos direitos LGBTI) ou Frankie Bridge (modelo que fala abertamente da depressão). Ou a antiga modelo espanhola Ariadne Artiles que, com uma sinceridade desarmante, nunca escondeu os medos de ser mãe aos 40 anos.
A construção exagerada de personalidades como as das manas Kardashian/Jenner (ainda mais agora que terminou o reality show Keeping up with the Kardashians), os imensos retoques e a plasticidade não só do visual como também do conteúdo parecem estar fora de moda. E as marcas investem cada vez mais nos micro influenciadores que, embora tenham muito menos seguidores do que as grandes estrelas, acabam por ser mais credíveis e com públicos mais comprometidos e fiéis.
“É nos micro influenciadores que as marcas estão mais focadas agora, pois é neste segmento que encontram mais ‘genuinfluencers’. Não tentam necessariamente apelar a uma audiência massiva, mas falam antes sobre assuntos que verdadeiramente lhes importam”, explica na Vogue Business Thomas Repelski, cofundador da empresa de marketing Lefty.
E em Portugal?
Por cá nota-se claramente a influência das novas gerações em alguns anúncios de televisão. Quem se choca ao ver uma mulher trans a beijar na boca uma mulher cisgénero no anúncio da Sumol? Provavelmente pessoas que não são claramente o público-alvo da marca. Para a Geração Z, essa questão está mais do que ultrapassada. Já no que diz respeito aos influenciadores ainda há um longo caminho a percorrer.
“O investimento do marketing de influência vai crescer 40% este ano em Portugal para os nove milhões de euros. Existe muita procura por parte das marcas e isso quer dizer que é preciso que haja uma diversidade grande de influenciadores. Mas os principais continuam a ser muito importantes; agora há margem para procurar novos influenciadores”, explica Rui Oliveira Marques, diretor-adjunto do Meios & Publicidade.
Por outro lado, continua o especialista, “as marcas ainda têm medo de se associar a pessoas com mais conteúdo porque não controlam esse mesmo conteúdo”. Ainda que não faltem tentativas para controlar uma linguagem no sentido do politicamente correto, algumas das quais denunciadas pelos “genuinfluencers”. “Ainda há uma grande obsessão pela figura pública que tem milhares de seguidores; as marcas ainda trabalham para ter um resultado imediato”, continua Rui Oliveira Marques.
Mas há exceções. O humorista Diogo Faro tem, sem dúvida, uma grande exposição nas questões do racismo e do ativismo LGBTI e tornou-se num influenciador que viraliza nas redes sociais. A atriz Inês Herédia, lésbica assumida, foi escolhida pela Pantene para ser sua embaixadora, num compromisso da marca com o apoio à comunidade LGBT.

Certo é que a ligação das marcas a um certo pendor ativista ainda está a dar os primeiros passos em Portugal. Mas o caminho vai-se fazendo. “Existe, claramente, uma mudança de paradigma relativamente aos influenciadores. No último ano, com a questão da pandemia e com a entrada em cena das novas gerações, essa mudança intensificou-se. O consumidor quer sentir que se identifica com aquele ‘influencer’, que partilha os mesmos gostos ou ideais e isso leva a que, cada vez mais, se desligue dos macroinfluencidores ou das pessoas famosas, digamos assim, pois sabe que esses estão claramente pagos para fazer aquele patrocínio”, diz Soraia Pedroso da Costa, da consultora BloomCast.
“Em contrapartida, e diria que até mesmo é uma consequência desta mudança, os microinfluenciadores começaram a ganhar espaço. São pessoas “normais”, mas que têm já uma lista superior a 5 mil seguidores e que abordam temas que defendem ou que acreditam ou simplesmente partilham algo que gostam, o que leva a que as pessoas se identifiquem e interessem e por isso começam a consumir os seus conteúdos. Perante esta nova realidade, as marcas começaram a dar preferência a este tipo de influenciadores, porque produzem conteúdos para um nicho de audiência, mas com altos valores de engagement e conexão, por um custo bastante mais reduzido do que um famoso ou um macroinfluenciador. E a forma como estes publicitam os produtos das marcas, já não é de uma forma tão invasiva, mas sim, abertamente e integrado nos conteúdos que já faziam e, por essa razão, as novas gerações acabam por dar mais valor e até consumir/comprar mais”, continua.
Porque, no fim, sejam mais ou menos ativistas, tenham mais ou menos conteúdo, são as vendas que contam para as marcas. Mas se, pelo meio, contribuírem para tornar este mundo um pouco menos injusto, tanto melhor.