Mediante a conjuntura política que define Portugal na atualidade, parece-me bastante oportuno recuar mais de meio século e ressuscitar as teorias de um homem que, ao que tudo indica, cometeu suicídio. Refiro-me, de forma mais esclarecedora, a Walter Benjamin, filósofo, sociólogo e tradutor alemão, que viveu de 1892 a 1940. O seu vínculo encontra-se na Escola de Frankfurt, considerada o último expoente da filosofia germânica no seu período áureo, um dado que não espanta de todo se nos vier à memória o resultado do pensamento excessivo dos alemães, no centenário passado. A leitura das suas “Teses sobre a Filosofia da História” revelou-se bem mais interessante do que esperava, acabando por me elucidar sobre o que considero ser uma perspicaz associação de ideias.
Apesar de ciente de que o autor formulara a sua ideologia com base nos enquadramentos do seu país e da sua época, não pude deixar de averiguar algumas reflexões passíveis de transitarem para a vigente esfera portuguesa, revelando que muitos dos problemas com que nos debatemos no presente vêm praticamente com um século de atraso. Começando por esse vício da social-democracia, o conformismo, que afeta a sua tática política e perspetiva económica, e se traduz em efeitos corruptivos pela convicção de se nadar no sentido da corrente. Facilmente se estabelece aqui uma correspondência de primeira instância com o mandato do social-democrata Pedro Passos Coelho que, à falta de (melhor) estratégia e (maior) núcleo políticos, colocou Portugal inteiro a nadar ao sabor da troika, e impelido à força pela austeridade da moda europeia. A partir daqui, as comparações sucedem-se de modo imprevisível, e enquanto Benjamin reprova a exploradora dose de trabalho como conquista política do seu tempo, a minha mente remete-me, traquina, para a insustentável dose de desemprego como conquista política da minha idade.
Visivelmente influenciado pela conceção marxista que, aliás, caracteriza toda a Escola de Frankfurt, o sociólogo não perde de vista a luta de classes, esse desafio da classe operária que, em nome das gerações oprimidas, leva até ao fim o edifício da libertação. Uma consciência inconveniente para a social-democracia, que pretendia adiar as realizações concretas do propósito e manter os revolucionários como a classe exclusivamente libertadora das linhagens vindouras. Um povo continuadamente exposto e subjugado a todo tipo de tiranias, sob o pretexto dogmático do progresso e melhoria futuros, portanto. “Onde é que eu já vi isto?” Excluindo, claro está, no governo do social-democrata Pedro Passos Coelho que, traído até pelos compadres da troika, cedeu os portugueses a medidas de ajuste brutas e cruéis, que inibem cada vez mais a qualidade de vida no país.
Por fim, outra teoria que achei extremamente arguta foi a de “fazer explodir o curso da história”, com o objetivo de finalizar a tradição dos oprimidos. O que, dito em bom português moderno, é o equivalente a “fazer explodir com a troika“. Uma ideia ligeiramente mais extremada, é certo, mas que não deixa de ser filosófica. E que pode conduzir, com efeito, à libertação de um povo cansado de ser regido pelo leme de credores e entidades forasteiras, que causam a impressão de não estarmos perante um país que é nosso. Ainda assim, sem perder a esperança, espero que essa soberania e independência sejam possíveis sem recurso ao bombismo. A ver vamos…
Ricardo Marques
“Rabanadas de Escrita”
http://ricardofmarques.wordpress.com/
https://www.facebook.com/pages/Rabanadas-de-Escrita/1422751831274904