Em toda a sala de Portreto de la Animo (Retrato da Alma, em português), uma frase do pintor Lucian Freud, traduzida em várias línguas, preenche o rodapé: “A minha ideia do retrato vem da insatisfação que sinto com os retratos que se parecem com a gente. Eu gostaria que os meus retratos fossem das pessoas e não como elas.” Antonio Saint Silvestre – que, com Richard Treger, iniciou nos anos 80, em Paris, uma das mais importantes e extensivas coleções privadas de arte bruta no mundo, em depósito no Centro de Arte Oliva, em São João da Madeira –, não a escolheu por acaso. “O que Freud quis dizer é que os retratos reais não lhe interessam. Estes artistas desenham na cozinha, no chão, no hospital, na rua. É essa liberdade que nos importa”, explica o curador da exposição e colecionador.
O retrato é o ponto em comum às 150 obras, de cerca de uma centena de autores, que se dão a ver na sala de exposições temporárias no Museu Nacional Soares dos Reis, pertencentes à Coleção Treger Saint Silvestre, muitas encontradas em armários, em hospitais psiquiátricos. “Não há um fio condutor nem uma imagem que possa definir a arte bruta”, realça o curador sobre a expressão criada em 1945, por Jean Dubuffet, para definir um movimento de contracultura produzido por pessoas sem formação artística.

Entre trabalhos do italiano Pietro Chizzardi (desenhos com pó de tijolo, carvão, erva ou fruta), do norte-americano Jimmy Lee Sudduth (pintura com barro), da alemã Margarethe Held (motivada por espíritos), da finlandesa Stiina Saaristo (desenhos de grandes dimensões com mulheres grotescas a quem empresta o rosto), ou das aguarelas do checo Josef Karl Rädler estão cinco obras de Jaime Fernandes (1899-1969), “o mais reconhecido autor da arte bruta portuguesa” e cujos desenhos (figuras humanas e animais imaginários) foram desenvolvidos durante os 30 anos de internamento psiquiátrico no Hospital Miguel Bombarda, em Lisboa. “Costumo dizer que estes artistas são como uma ostra que faz uma pérola para se salvar. Desenham para se salvar das angústias”, aponta Antonio Saint Silvestre.
Da Coleção Treger Saint Silvestre, constituída por 1500 obras de 350 artistas, em depósito no Centro de Arte Oliva, em São João da Madeira, vieram 150 trabalhos, agora em exposição no Porto.
Portreto de la Animo Art Brut Etc. > Museu Nacional Soares dos Reis > R. D. Manuel II, 44, Porto > T. 22 339 3770 > até 12 nov, ter-dom 10h-18h > €5, grátis dom 10h-14h