Esta é uma exposição para ser lida. De que outra forma, aliás, se poderiam expôr os textos de uma das maiores escritoras portuguesas do século XX num museu? Quase da mesma maneira “como se um livro fosse paginado nas paredes”, explica António Preto, co-curador, com Ricardo Nicolau, de Uma exposição escrita Agustina Bessa-Luís e a Coleção de Serralves. A mostra integra as comemorações do centenário da autora de A Sibila e estará patente até abril de 2023 no Museu de Arte Contemporânea de Serralves.
Pelas quatro salas, 33 obras da Coleção de Serralves dialogam com dezenas de textos de Agustina sobre diferentes assuntos, temas e personalidades, retirados dos livros Aforismos (1988), Contemplação Carinhosa da Angústia (2000), Dicionário Imperfeito (compêndio publicado em 2008, que reúne excertos organizados por ordem alfabética) e Ensaios e Artigos (1951-2007).
Trata-se de uma exposição “totalmente disruptiva”, considera Philippe Vergne, o diretor do museu no Porto. Como se “as obras da Coleção sejam leitoras dos textos”, acrescenta António Preto, também diretor da Casa do Cinema Manoel de Oliveira. O cineasta foi amigo da escritora e um dos seus filmes, Um Filme Falado (2003), serviu de mote ao título desta exposição. “O grande desafio desde o início foi o de como expôr alguém que não é uma artista, daí a vontade de mostrar a escrita da Agustina”, reforça o curador Ricardo Nicolau.
“Tudo o que escrevo se destina a interessar as pessoas na sua própria entidade. Daí, muitas vezes, ela ter um efeito devastador, a obra e a pessoa que a produz. Sobretudo a pessoa, devo dizer. Eu desmascaro os outros da rotina, espanto a manada. Depois os efeitos são maravilhosos, combinam com a imortalidade”, lê-se de Agustina Bessa-Luís (1922-2019) numa das primeiras paredes cobertas de textos que se relacionam com Boxe, um saco de boxe negro feito em aço do artista norte-americano Richard Artschwager.
“O grande desafio desde o início foi o de como expôr alguém que não é uma artista, daí a vontade de mostrar a escrita da Agustina”
Ricardo Nicolau, curador da exposição
O diálogo entre a escrita e as obras de arte – nenhuma coincide diretamente com as palavras de Agustina à exceção de Tritão, uma sereia com cabeça de cão, de Paula Rego – encontra-se, por exemplo, em textos sobre a mulher (que articulam com um vídeo de Bruce Nauman), sobre Portugal (com uma obra de Fernando Lanhas), a água (com uma fotografia de Patrícia Almeida que aborda o turismo no verão no Algarve), as tendências do inverno (com uma serigrafia de Julião Sarmento), a cultura (com obras de Dieter Roth e de Haris Epaminonda que interrogam a perenidade de valores culturais), ou o grotesco (com uma obra de cerâmica de Tony Cragg). Álvaro Lapa, Silvestre Pestana, Didier Fiuza Faustino, Eduardo Batarda, João Vieira, Manuel Alves ou Richard Tutle (obra com uma edição limitada de cinco livros encadernados à mão de cores diferentes) são outros dos artistas presentes que dialogam com textos e pensamentos de Agustina.
“A exposição procura ampliar leituras possíveis daquilo que são os textos e as obras da Coleção selecionadas, e que convida à participação do visitante”, resume António Preto, ansiando que “sirva também para promover a leitura da Agustina, porventura das escritoras mais conhecidas mas menos lidas deste País.”

Uma exposição escrita Agustina Bessa-Luís e a Coleção de Serralves > Museu de Serralves > R. D. João de Castro, 210, Porto > T. 22 615 2500 > até abril 2023, seg-sex 10h-18h, sáb-dom 10h-19h > €12