Roda da Fortuna e da Fantasia está nos antípodas do Japão das mangas e dos filmes de Takeshi Kitano. Quando muito, recupera a beleza dos clássicos, também com um olhar sobre a arquitetura agora aplicado à realidade urbana contemporânea. Contudo, não está assim tão perto de Ozu e de Mizoguchi.
Tal como já havia feito no longuíssimo Happy Hours e em Asako I e II, Ryûsuke Hamaguchi constrói um filme minimal, esquemático e poético. Trata de estabelecer a própria marcação do tempo. Encontramos o seu par em, por exemplo, Hong Sang-soo, realizador de culto sul-coreano. Mas Hamaguchi não leva tão longe a sua vertigem conceptual nem marcas tão fortes como a repetição sistemática da narrativa e dos elementos, como quem quer demonstrar que há muitas maneiras de contar a mesma história.
Em Roda da Fortuna e da Fantasia, o questionamento e devaneio emocional fazem-se de forma mais subtil. Constrói três narrativas que retratam situações amorosas em diferentes momentos no espaço e no tempo, mas que acabam subliminarmente por abordar estados de espírito semelhantes ou complementares.
Na primeira, temos um triângulo amoroso, explicitado eroticamente no texto e não nas imagens, em que as personagens femininas ganham uma ascendência manipulatória. A segunda é deliciosa na sedução de uma aluna a um professor-escritor, alcançando um desfecho realmente perverso e muitíssimo ousado.
O melhor está guardado para o fim. Um encontro equivocado entre duas supostas ex-colegas da universidade transforma-se num jogo de faz de conta que acrescenta uma camada ficcional à própria ficção que o filme nos impõe. Todo o filme funciona como um ensaio sobre as subtilezas e a aleatoriedade do amor.
Veja o trailer do filme
Roda da Fortuna e da Fantasia > De Ryûsuke Hamaguchi, com Kotone Furukawa, Kiyohiko Shibukawa, Katsuki Mori > 120 minutos