Parecem personagens míticas, tiradas de alguma lenda, de um conto de encantar… Mas elas existem. Cláudia Varejão encontrou as pescadoras de pérolas, numa remota ilha no Japão. Mulheres que, sempre que a maré ajuda, mergulham, em apneia, até ao fundo do mar, de punhal em riste, tentando extrair o precioso segredo das ostras. É deste encontro que trata Ama-San, o documentário que venceu o último DocLisboa e agora se estreia em sala.
Cláudia Varejão foi descobrir a história que queria contar a milhas de distância de casa. Fez duas viagens ao Japão, sempre com a ajuda de intérpretes, e procurou chegar à essência do seu cinema. Não é de todo um documentário em estilo televisivo, que explore o espanto pelos arriscados mergulhos destas mulheres únicas e as ponha a falar para a câmara, em discurso direto, como uma reportagem.
A realizadora vai além disso e faz um mergulho profundo no quotidiano daquelas mulheres. Mulheres que, sem dúvida, têm em si um lado misterioso. Num estilo não participante que aproxima o documentário da ficção, a realizadora mostra-nos as suas rotinas, em casa e no trabalho, as conversas de circunstância, a ordinária universalidade da extraordinária vida que levam.
Debaixo de água tudo se transforma. O filme, que é sempre muito bem filmado, ali converte-se num deslumbrante poema subaquático. Aquelas mulheres são ninfas e são ninjas. Atravessam-se no mar com destreza, audácia e elegância, tomamo-las por peixes caçadores que nadam num habitat de extrema beleza.
Um filme sem homens, simplesmente porque os homens não são para aqui chamados: ou estão em alto-mar ou não existem. Abre-se assim espaço para também refletir sobre a condição feminina, em contexto original. As pescadoras de pérolas quando chegam a casa têm que cuidar dos filhos, preparar o jantar, lavar a roupa… São heroínas por conta própria.
Ama-San > de Cláudia Varejão > documentário > 113 min