
Posto Avançado de Progresso foi filmado no rio Congo, Soyo, Porto do Pinda, Porto Rico e comunidade do Kimpondo, na província do Zaire, em Angola
A África colonial portuguesa é um território tão virgem para o cinema português quanto fisicamente o era para grandes exploradores do passado como Silva Porto ou Capelo e Ivens. Os poucos filmes que se dedicam ao tema têm abordado sobretudo o derradeiro período do colonialismo, o Estado Novo e a Guerra Colonial. Em Posto Avançado do Progresso, Hugo Vieira da Silva tem a originalidade de recuar até finais do século XIX, buscando a montante as causas da nossa história africana e as complexas teias da relação com o Outro. É uma temática inédita no cinema português, cosida com o talento e criatividade de um realizador que se destacou com os filmes Body Rice e Swans (ambos nos antípodas destas temáticas).
Curiosamente, Hugo Vieira da Silva serve-se de um conto do escritor britânico de origem polaca Joseph Conrad para construir a estrutura difusa do filme. Contudo, não esconde a necessidade absoluta de adaptar o texto de Conrad à realidade portuguesa, com diferenças substanciais da inglesa, sobretudo no que toca ao relacionamento com o espaço e com os povos africanos.
Encontramos dois homens, trajados de branco, estabelecidos (ou por estabelecer) numa terra que lhes é estranha. São responsáveis por um posto avançado, no interior de Angola, nas margens do rio Congo, no meio da mata, no meio do nada. Há uma sensação primeira de adaptação ao inadaptável, de dois corpos estranhos introduzidos num ecossistema adverso, prontos a desequilibrá- -lo e a desequilibrar-se. Mas tal rapidamente se converte numa permanente sensação de delírio, terreno fértil à criação cinematográfica, que Vieira da Silva explora entre fugazes devaneios e pontos de equilíbrio, entre o palpável e o fabuloso, entre o simbólico e o contextual, recorrendo também ao burlesco como linguagem para caricaturar uma realidade insólita. Mais do que servir a História (ou a história), tudo ajuda a construir um ambiente, um estado de alma, um desnorte, um quadro de época e de lugar, caracterizado por um permanente estado febril, fruto da inadaptação ao meio físico e emocional, que permite a evocação de figuras históricas e fantasmagóricas, em autênticos delírios, que muito enriquecem o filme.
Por outro lado, é indefinida a relação entre colonizadores e colonizados. Não é uma história pura de exploração do Outro, fica sempre a sensação que o ambiente torna o colonizado indomável, e o colonizador, representado nestas duas figuras, não tem o verdadeiro controlo sobre os acontecimentos. Esforça-se por se adaptar ao meio, mas ali não pertence. Com belíssima fotografia, e grandes interpretações de Nuno Lopes, Ivo Alexandre e David Caracol, o filme foi selecionado para a secção fórum no último Festival de Berlim. Posto Avançado do Progresso é um delirante mergulho na História que nos ajuda a compreender as raízes da por vezes insólita aventura portuguesa em África.
De Hugo Vieira da Silva, com Nuno Lopes, Ivo Alexandre e David Caracol > 121 min