Nos dias úteis da semana, logo pela manhã, não conseguimos evitar o sorriso quando nos entram na caixa de email as histórias bem-humoradas, e por vezes non-sense, do Clube de Leitura da Livraria Plutão. Uma associação de defesa do direito dos animais intercede a favor de Godzilla, o rei dos monstros dava o título, por estes dias, ao conto número 76, levando-nos pelos meandros da perseguição de um lagarto pré-histórico mutante perseguido pela comunicação social. “Se repararmos com atenção, Godzilla é um organismo vivo que impõe uma reestruturação da sociedade e promove um estilo de vida anti-materialista. Por que é que não olhamos para ele como uma ferramenta de incentivo ao replaneamento urbano? Ou um corajoso promotor de obras públicas”, lemos já a soltar uma gargalhada, enquanto imaginamos a caricata situação.
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O envio destes micro contos a quem subscrever a newsletter da livraria independente Plutão – que já editou livros como O Apocalipse das Cedilhas ou As Letras Secretas do Alfabeto – começou em meados de março, no início do primeiro confinamento.
Luís Leal Miranda, 37 anos, editor e autor dos contos, sentiu a necessidade de também ele se juntar aquela “solidariedade” comunitária gerada na altura, escrevendo “histórias que são sempre estranhas, bizarras, que colocam pessoas comuns em situações invulgares ou pessoas invulgares em situações comuns”, resume. Até maio, os contos foram enviados de segunda a sexta a mais de mil pessoas. Com o desconfinamento passaram a ser semanais mas, desde meados de janeiro, com o segundo confinamento, voltaram a ser enviados todos os dias úteis.
Luís acredita ter leitores de todas as idades. “Há pessoas que dizem ler as histórias aos filhos, outros leem porque gostam. Há professores que as leem aos alunos, crianças que me enviam desenhos e até soube de uma universidade sénior que trabalhou os meus textos”, conta. Costuma chamar-lhes “uma espécie de spam benigno”, porque a história entra na caixa de email e pode até nem vir a ser lida na altura.
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No verão, a pensar “num objeto físico” que eternizasse aquela época, a Plutão acabaria por editar História sem Título e Outras Histórias, uma antologia de 26 histórias escritas durante a primeira quarentena (com ilustrações de André Ruivo), numa edição limitada de 300 exemplares para quem quisesse recordar contos como O flaustista de Hamelin vai às audições para a banda do Titanic ou, entre outros, A primeira reunião dos Anónimos Anónimos.
Cada história inclui personagens e situações que vão surgindo na cabeça de Luís Leal Miranda ao sabor dos dias passados em casa, com um bebé de 16 meses. O autor confessa achar “divertido tirar as coisas do contexto”. Como quando, há semanas, nos questionou sobre Os Sons das Plantas (com banda sonora incluída) sob o título: Petição por uma maior representatividade das plantas na literatura infantil; contra o número excessivo de livros dedicados aos animais da quinta; a favor de quaisquer soluções literárias que abordem os sons da flora. “A secção infantil das livrarias está apinhada de livros sobre os animais da quinta. Que som é que a vaca faz? Que barulho emite uma ovelha? A que soa uma galinha? … Mas e a flora? E as plantas da quinta?”, escrevia. E com a imaginação dos sons de uma couve, de um nabo ou de uma maçã, começámos o dia a sorrir, pois.
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