
Quando a ouvimos pela primeira vez (e já lá vão sete anos desde o álbum de estreia!), tornou-se claro que Anna Calvi não só era uma artista com personalidade forte mas também tinha encontrado um estilo, o seu som. A voz grave, a interpretação intensa, o tom melancólico e épico ao mesmo tempo faziam dela uma espécie de Lana Del Rey (que se impôs pela mesma altura) do universo indie, sem grandes cedências aos códigos de uma pop mais mainstream. Calvi teve direito a uma frase dessas que fazem disparar qualquer carreira a uma velocidade supersónica: “A melhor coisa desde Patti Smith”, terá dito Brian Eno.
Sempre a vermelho e negro, a sua carreira tem sido tão sólida quanto discreta. Agora, ao terceiro álbum, faz uma espécie de strip-tease emocional. Aparentemente, nada mudou muito: o tal estilo próprio, coisa cada vez mais difícil de alcançar no mundo da música popular, é o mesmo, muito alicerçado na sua voz poderosa. Mas não é preciso raspar muito a superfície para perceber que algo mudou: há uma abordagem mais direta e pessoal às canções e um tema que percorre todo o disco. O facto de Hunter ter sido escrito na ressaca do fim de um relacionamento longo de Anna Calvi não é uma coincidência (este não é o primeiro, nem será o último, disco a nascer de um momento pessoal de crise e superação, fragilidade e força…).
As questões de género percorrem praticamente todas as dez faixas do álbum (a começar logo em alguns títulos: As a Man, Don’t Beat the Girl Out of My Boy, Alpha...), fazendo entrar, sem grandes subtilezas, Hunter no universo queer. Nesse aspeto, o videoclip de Don’t Beat the Girl Out of My Boy é uma espécie de statement: toda a importância dada aos corpos e nenhuma às fronteiras (construídas?) entre masculinidade e feminilidade. Anna Calvi regressa em grande forma e tem coisas para dizer.

Anna Calvi vai passar por Portugal, para apresentar Hunter ao vivo: há concertos marcados no Porto (Hard Club, 19 de outubro) e Lisboa (Capitólio, 20 de outubro)