A carta do Em Carne Viva, no Porto, inspira-se em sabores portugueses, como comprova este prato de lagostim da horta (recriação de um lagostim com fatias de curgete, recheado com puré de raiz de aipo)
Lucilia Monteiro
Há uma nova vaga de restaurantes saudáveis a transformar a forma como almoçamos e jantamos fora, mas também os nossos pequenos-almoços, lanches e até os cocktails de final de dia. Lugares onde se contam nutrientes e não calorias, onde se cozinha para o bem-estar sem que se prejudique o sabor e onde as aparências não iludem quem segue dietas específicas ou apenas quer ter uma alimentação equilibrada e, mais importante ainda, consciente.
Vegetarianos e vegan
A francesinha vegetariana (com seitan, alheira de fumeiro e salsicha vegetal) é um dos pratos mais pedidos no Ao 26 – Vegan Food Project, o restaurante que abriu no início de junho no Chiado, em Lisboa, contrariando, desde logo, a ideia feita de que há pouco sabor neste tipo de alimentação. Na ementa não entra nada de origem animal, mas nela se cruzam receitas inspiradas em diferentes cozinhas do mundo, havendo sugestões para todas as horas do dia, do pequeno-almoço ao jantar. Também recente na cidade, mas já com o estatuto de clássico, o Terra está instalado num prédio oitocentista, no Príncipe Real. Aí, as sugestões vegetarianas, e algumas veganas, servem-se num buffet de pratos quentes e saladas: há (quase) sempre tofu com castanhas, cogumelos à Bulhão Pato e lasanha de espinafres. Ao lado, no cada vez mais movimentado bairro de Santos, o restaurante Pachamama prepara todos os dias dois pratos, um vegetariano e outro de peixe, sempre com alimentos biológicos e sem pesticidas. São, ainda, confecionadas algumas variedades de pão fermentado durante 25 horas, com farinhas biológicas moídas em moinho de pedra, sem recurso a fermentos e amassadas pelo mestre padeiro Mário Rolando.

O Antigo Talho, em Lisboa, junta as refeições vegan a uma loja de produtos sustentáveis
Deixe-se Lisboa e viaje-se até ao centro de Cascais, para se visitar o restaurante House of Wonders, que também é cafetaria, pastelaria e galeria. A cozinha é rawsome, um termo criado a partir da junção das palavras inglesas raw (cru) e awesome (fantástico), o qual designa a alimentação vegetariana crua (raw food). Apesar da rotatividade dos pratos, que variam de acordo com o que há no mercado, o shakshouka – feito com diferentes vegetais grelhados, molho de tomate e ovo escalfado – e o tapenade mezze – que ganha forma com vegetais recheados, chapati (pão) e húmus – são duas boas opções. Na categoria dos veganos, destaca-se o Miss Saigon, em Lisboa. “A nossa ideia foi pegar em pratos típicos do mundo inteiro, em que se utilizam a carne e o peixe, e adaptá-los para a cozinha vegana, utilizando produtos, na sua maioria, biológicos e de pequenas produções”, descrevem os proprietários Cláudia Salú e Paulo Almeida. Entre eles estão o pad thai (Tailândia) e o biriani com tofu ou o tikka (Índia), mas a ementa muda todos os dias. “Se um cliente vier cá dois meses seguidos, não repete um único prato”, acrescentam. Já na Avenida Duque de Loulé, a novidade é O Antigo Talho, aberto no início deste ano pelo apresentador João Manzarra, também ele vegano, e com uma loja de produtos sustentáveis no piso de baixo. Para que não restem dúvidas: nesta casa não entra nenhum derivado de origem animal. Há dois pratos fixos, a quiche de cogumelos e caju e o wrap de húmus – e, para finalizar, nada melhor do que a tarte crua de limão, abacate e pistácio.
O Em Carne Viva, no Porto, é capaz de ser o vegetariano – cada vez mais vegan – com a mensagem mais provocatória do País. O nome é, afinal, “um tributo à vida”, justificam Victor Rodrigues e Eduarda Castro, que abriram o restaurante numa casa do século XIX, com tetos em estuque e uma decoração em material reciclado. A carta é inspirada nos sabores regionais portugueses: destaque para os cogumelos à Bulhão Pato ou o lagostim da horta (recriação de um lagostim com fatias de curgete, recheado com puré de raiz de aipo). Quem desejar pode optar pelos menus de degustação. Também no restaurante daTerra a sustentabilidade é uma preocupação, desde que este abriu há mais de uma década, em Matosinhos. Este vegetariano – que, entretanto, chegou a outras zonas do Porto, Gaia, Viseu e Cascais – usa ingredientes de produção biológica no rolo de massa quebrada com espinafres e nozes ou no caril de tofu e maçã, servidos em buffet. Em breve, abrirá uma loja de rua no Bairro Alto, em Lisboa, e o buffet de pequenos-almoços (por agora, disponível apenas na loja da Rua Mouzinho da Silveira, no Porto) deverá ser alargado a todos os restaurantes da marca. A caminho dos dois anos, vai o Árvore do Mundo, na zona do Bonfim. O restaurante vegano serve cozinha criativa, inspirada em pratos tradicionais portugueses, sem qualquer indício de origem animal: empadão de polenta, rancho, tofu espiritual, desdobrada são alguns exemplos.

A tarte de caramelo salgado do The Paleo Kitchen faz parte do novo brunch
Paleo
Nesta dieta, baseada nos hábitos do Homem caçador-recoletor, não entram laticínios nem cereais nem leguminosas, e só se usam produtos sem glúten. “Tudo o que foi domesticado pelo Homem não tem lugar nesta alimentação”, diz Nuno Carrusca, proprietário e chefe de cozinha da cafetaria e restaurante Água no Bico, no Polo Cultural das Gaivotas, em Lisboa. Na ementa não há pratos fixos, antes sugestões, dependendo dos produtos da época, como o hambúrguer de carnes bravas (veado ou javali) em pão mandioca ou a salada do mar com biqueirão marinado e ovas de peixe. No fundo, “só precisamos de comer o que a Natureza nos dá”, acrescenta o chefe de cozinha, que privilegia mais a pegada ecológica e os produtos locais do que o rótulo biológico. Já no Saldanha, também em Lisboa, o The Paleo Kitchen aposta igualmente em sugestões sem gorduras saturadas, açúcares, leites e óleos convencionais. Os mesmos ingredientes que Sandra Cardoso Monteiro, a proprietária, deixou de consumir há mais de cinco anos. O cardápio baseia-se “numa cozinha natural que, além de saudável, deve ser variada, equilibrada e saborosa, e utilizar os melhores ingredientes certificados”, define Sandra. Há caril de abóbora-manteiga com legumes do mercado, o salmão selvagem marinado e um brunch de lamber os dedos, com uns ovos mexidos com bacon, cozinhados no ponto perfeito, ou a já famosa tartelete de caramelo salgado, que acabámos por levar para casa, tal foi a vontade de repetir.
Bio, natural ou local
Tudo o que é servido na cafetaria do Quintal Bioshop, na Rua do Rosário, no Porto, vem diretamente da terra e sem pesticidas. Quase toda a ementa é vegan, à exceção dos ovos usados na confeção do alho-francês à Brás ou nas sanduíches de queijo de cabra, mel, maçã e nozes. O biológico parece ter cada vez mais procura, e disso tem dado conta Leonor Moreira, que gere a cafetaria com a irmã, Paula. Além do prato do dia ao almoço, que varia de acordo com o que a terra dá, aqui é possível provar os sumos naturais, as chamuças de vegetais ou a raw food (alimento cru) que, uma vez por mês, ao domingo, junta os adeptos no Raw Pizza Supper Club, servindo pizza crua de fusão (crosta de sementes de girassol e azeite, coberta com queijo de caju e molho de tomate seco, com vegetais da estação, dois tipos de cebola marinada & cogumelos). Ainda no Bairro das Artes, o Época só usa “produtos de raiz, produzidos orgânica e localmente”, conta Liliana Alves que, com Tiago Teixeira, abriu, há poucos meses, este café saudável. Dos ovos biológicos da Casa do Aido aos legumes colhidos na quinta Agrobio, passando pelo pão de fermentação natural, tudo o que chega à mesa vem diretamente da origem. É também direto do produtor e com o símbolo biológico que chegam à mesa as refeições servidas na mercearia Grão de Bio, aberta há uns meses, em Matosinhos. Ao almoço, de segunda a sexta, há sempre um menu diferente – lasanha de legumes, caril de frango, tofu com chutney de nectarinas e salada de cuscuz – e uma ementa com 15 propostas, disponível aos sábados. Por estar próximo da praia, acaba de lançar os wraps biológicos, com húmus de beterraba, frango ou palitos de pepino, prontinhos a levar.

O menu do Ela Canela muda todas as semanas, mas há pratos fixos como os ovos com abacate
O mesmo acontece no Ela Canela, em Lisboa, onde a luz de Campo de Ourique entra, sem pedir licença, pelas enormes paredes em vidro. Neste pequeno restaurante, com grandes ideias, faz-se uma cozinha baseada em ingredientes sazonais, locais e sempre que possível biológicos (os legumes e a fruta são 100% bio). Joana Oliveira, a responsável, explica que o caminho passa pelas parcerias estabelecidas com os produtores. Há sempre pratos fixos, como as panquecas e as tostas, mas o resultado muda consoante o que chega. A filosofia estende-se às opções de carne, de peixe e às vegan e vegetarianas, sempre preparadas de forma saudável, sem açúcares refinados nem produtos processados. “Estamos a trabalhar com cada vez mais produtores e juntámo-nos, por exemplo, à Casa a Granel, nossos vizinhos aqui no bairro, que nos fornece os frutos secos e as leguminosas, o que nos permite chegar a novos ingredientes e tornar a nossa cozinha mais independente”, acrescenta. O menu, que se divide entre as opções para os almoços da semana, sempre variadas, e o brunch de sábado e de domingo, vai agora voltar a renovar-se. “Vamos fechar por uns dias e abrir em agosto, com a nossa terceira temporada”, diz Joana.

The Green Machine, do Foodprintz café, com banana, espinafres e superalimentos, está sempre no menu
Já o Foodprintz Cafe, igualmente em Lisboa, junta comida, ioga e educação alimentar, num projeto que é o resultado do encontro entre a alemã Lisa Dickmann e a holandesa Karo Tak. A cozinha é biológica, vegan, sem açúcar e com opções sem glúten. Aos fins de semana, há brunch, com smoothie bowls, granola caseira ou panquecas sem glúten, e o menu adapta-se às estações do ano e à frescura dos ingredientes. “Preocupa-nos a saúde mas também o ambiente e o bem-estar, a todos os níveis”, resume Lisa. E, por isso mesmo, há mais horários de aulas de ioga e pratos para descobrir todos os meses (e que podem ser consultados no site do restaurante). A partir de agosto, o Foodprintz Cafe vai estender o seu horário de funcionamento a todos os dias da semana.
A provar que o saudável não tem de ser previsível, o Juicy, na Baixa lisboeta, é um bar de sumos e de cocktails, que aposta numa cozinha descomplicada, com flatbreads e alguns snacks, inspirados pela cozinha do Mediterrâneo e do Médio Oriente. Os ingredientes são quase todos locais e preparados no momento, e a ementa é constantemente remexida com novos pratos e saladas, sempre coloridos e prontos para o close–up no Instagram. Há noites de cocktails e de DJ set, pelo que, ao fim de semana, é bem possível que o horário de funcionamento se prolongue.
Quem já conhecia o Local, no mercado de Cascais, não estranhará a variedade da ementa do restaurante de Santos, aberto desde junho. Logo à porta, revelam-se as intenções: não há alimentos processados, a comida é saudável e equilibrada, encontram-se alternativas aos laticínios e à proteína animal, e a entrada está vedada aos adoçantes artificiais. Posto isto, escreva-se que se pode comer pokes feitos no momento, guacamole, húmus ou a burrata, nas entradas, bem como ostras da ria Formosa com espumantes ou vinhos naturais, a qualquer hora do dia. Além disso, é possível sentarmo-nos por entre as quatro oliveiras, que decoram a sala principal, e pedir, por exemplo, uma beringela assada com pinhões, tomate-cherry e arroz integral ou um atum braseado, que se faz acompanhar de milho-miúdo, batata-doce e molho chimichurri. A escolha nem sempre é fácil.

Uma das novidades do primeiro restaurante de rua do Go Natural é esta papaia com iogurte, granola e morangos
Dario Branco
Pronto-a-comer
A comida rápida pode ter má fama, mas no universo dos restaurantes saudáveis já existem boas soluções para quem não tem tempo (ou simplesmente não consegue esperar pelas próximas bolinhas energéticas). No Club Life to Go, em Lisboa, todas as opções são para levar, mas também se pode comer no restaurante ou pedir a entrega em casa. Recomendamos, vivamente, o departamento das sobremesas. Primeiro vieram os pronto-a-comer rápidos, depois os supermercados, em Lisboa e no Porto, e agora o primeiro restaurante de rua. No Go Natural, a aposta principal vai para o brunch, em que cabem os clássicos ovos com abacate ou a granola com fruta, mas igualmente a original papaia recheada com iogurte e morangos. Há pratos reciclados do cardápio habitual mas também novidades, como a Middle East Bowl, com tabule, grão, húmus de beterraba e legumes. É um clássico na cidade: o restaurante e cafetaria do supermercado lisboeta Miosótis, um dos primeiros a trazer para Portugal muitos dos produtos biológicos e saudáveis que hoje conhecemos, continua a apostar na preocupação com o equilíbrio alimentar, servindo ingredientes bio certificados, de produção ecológica, não intensiva e com preços justos. Aqui acompanham–se as tendências da alimentação, mas a base mantém-se, com enfoque nos vegetais e nos frutos frescos da estação. A pensar no bom tempo, incentiva-se uma visita ao terraço – para comer bem, entre plantas e raios de sol.
LISBOA
Ao 26 – Food Project > R. Vítor Cordon, 26, Lisboa > T. 96 798 9184 > seg 12h30-1h30, ter-sáb 12h30–23h
House of Wonders > Lg. da Misericórdia, Cascais > T. 91 170 2428 > seg-dom 12h-22h
Pachamama > Boqueirão do Duro, 49, Lisboa > T. 21 598 7650 > seg-qui 11h-19h, sex-sáb 11h-2h
Terra > R. da Palmeira, 15, Lisboa > T. 21 342 1407 > ter-dom 12h30-15h30, 19h30-24h
Antigo Talho > Av. Duque de Loulé, 55, Lisboa > T. 21 357 0953 > seg-sex 12h30-15h, 16h-19h30, sáb-dom 11h16h
Miss Saigon > Av. Boa Esperança, 4C, Lisboa > T. 21 099 6589 > seg-sex 12h-16h (a cozinha encerra às 15h30)
Água no Bico > R. das Gaivotas, 8, Lisboa > T. 91 011 1570 > ter-qua 10h-21h, qui-sáb até 24h, dom 11h-18h
The Paleo Kitchen > R. Latino Coelho, 31, Lisboa > T. 21 010 5612 > seg-qui 9h23h, sex-sáb 9h-24h
Ela Canela > R. Azedo Gneco, 74B, Lisboa > qua-sex 12h-18h, sáb-dom 11h-18h
Foodprintz café > Rua Rodrigo da Fonseca, 82A, Lisboa > T. 21 581 7577 > ter-sex 9h-19h, sáb-dom 10h-18h
Juicy > Rua de São Julião, 70, Lisboa > T. 21 073 8833 > seg-qui 11-16h, sex-dom, 11h-22h
Local – Your Healthy Kitchen > Avenida 24 de Julho, 54B, Lisboa > T. 21 390 0072 > seg-dom 9h-23h
Club Life To Go > Av. Elias Garcia, 84 A, Lisboa > T. 21 581 1543 > seg-sáb 9h-20h
Go Natural Restaurante > Rua do Loreto, 62, Lisboa > T. 93 240 0003 > seg-dom 9h-23h
Miosótis > Rua Latino Coelho, 89 > T. 21 136 9849/21 314 7841 > Seg-sáb 9h-20h (cafetaria), 12h30-15h (restaurante)
PORTO
Go Natural Restaurante > R. Senhora da Luz, 238, Porto > T. 93 662 7835 > seg-dom 8h30-21h
Em Carne Viva, Porto > Av. da Boavista, 868, Porto > T. 22 092 5598/93 235 2722 > seg-qui 12h-22h, sex-sáb 12h-23h
Árvore do Mundo, Porto > R. Duque de Loulé, 228 > T. 22 324 4513 > ter-qui 12h30-16h, sex-sáb 12h30-15h30, 19h30-23h
DaTerra > R. Afonso Cordeiro, 71, Matosinhos > T. 22 937 0853 > seg-sáb 12h-15h, 19h30-23h, dom 12h-15h (restaurantes no Porto, Vila Nova de Gaia, Viseu e Cascais)
Quintal Bioshop > Rua do Rosário, 177, Porto > T. 22 201 0008 > seg-sáb 10h30-20h
Grão de Bio > R. Roberto Ivens, 989, Matosinhos > T. 22 321 9326 > seg-sex 8h-20h, sáb 10h-19h
Época Porto > R. do Rosário, 22, Porto > ter-dom 9h-17h