A infeção humana por vírus monkeypox, parente da varíola que, tal como o nome indica, foi identificado pela primeira vez em macacos, em 1958, era uma total desconhecida para a maioria dos europeus até há bem pouco tempo.
Principalmente restrito à África Ocidental e Central, o vírus surgiu entre os humanos nos anos 70, quando já existia uma vacina contra a varíola humana, que também protegia, parcialmente, contra o monkeypox.
Talvez por esta razão, e pela dificuldade com que se transmite entre humanos, o número de casos existentes em todo o mundo nunca foi muito elevado. Ao contrário da varíola, associada a altas taxas de transmissão e uma elevada mortalidade (30%), o virologista do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Celso Cunha, indica que este é um vírus que não se transmite tão facilmente e tem uma mortalidade “muito mais baixa”.
Como evitar a transmissão?
“A longa história da transmissão desta doença em humanos mostra-nos que se transmite por contacto com lesões cutâneas nas mais diversas fases da sua evolução ou com objetos contaminados com a pele dessas pessoas, nomeadamente roupa de cama, roupa de banho, a própria roupa”, afirma Margarida Tavares, diretora do Programa Nacional para as Infeções Sexualmente Transmissíveis e VIH.
Tal acontece porque as ”bolhinhas” que surgem na pele têm dentro de si um líquido com partículas virais infecciosas. Quando o infetado coça as lesões e liberta o líquido, este poderá contagiar quem nele toca.
Precisamente por esta razão, o virologista do Instituto de Higiene e Medicina Tropical Celso Cunha alerta para o facto de o ambiente mais provável de contágio serem os agregados familiares, pessoas que vivem na mesma casa e, inevitavelmente, convivem prolongadamente, partilhando talheres, loiça, lençóis ou toalhas.
Não é como o SARS-CoV-2, não vamos para um café, alguém tosse a transmite a doença
CELSO CUNHA – VIROLOGISTA DO INSTITUTO DE HIGIENE E MEDICINA TROPICAL
Outra forma clássica de transmissão, acrescentam os especialistas, é através de gotículas respiratórias. “Não é uma transmissão fácil, é preciso um contacto muito próximo e face a face”, descansa Margarida Tavares. Ou seja, como sublinha Celso Cunha, “não é como o SARS-CoV-2, não vamos para um café, alguém tosse a transmite a doença”.
Ainda assim, neste momento, a forma de evitar a transmissão é evitar o contacto próximo com uma pessoa confirmada ou suspeita de ter a infeção. Margarida Tavares não quer falar em isolamento de infetados, mas aconselha que os mesmos se abstenham de todo o contacto próximo e prolongado com outras pessoas.
Quais são os principais sintomas?
Os primeiros sintomas são “absolutamente inespecíficos”, nas palavras de Celso Cunha, e vão da febre às cefaleias, cansaço ou aumento dos gânglios linfáticos, podendo depois surgir lesões na pele.
Estas lesões, diz Margarida Tavares, podem ser mais discretas ou expandir-se. “Nas formas clássicas, começam na face e, depois, podem atingir o tronco, os membros e, inclusivamente, as palmas das mãos e plantas dos pés”. Nos casos que têm aparecido em Portugal, estão a ser também observadas lesões ao nível das mucosas, nomeadamente mucosas na região genital.
Como acontece em muitas outras infeções víricas, a médica refere que, em certos casos, podem exisitr complicações, desde infeções locais das lesões cutâneas até pneumonias. “Mas não é de esperar que seja essa a forma habitual. São complicações raras”.
Com um período de incubação que pode ir de seis a 21 dias, durante o qual os infetados estão contagiosos mesmo que não apresentem lesões cutâneas, não há nenhum tipo de tratamento especifico aprovado para esta situação. “Nos casos ligeiros trata-se a febre ou a dor, mas não há mais nenhum tipo de tratamento a fazer”, indica Margarida Tavares.
De onde vêm estes surtos?
Não se sabe. Este vírus, identificado em humanos, pela primeira vez, nos anos 70, transmite-se, normalmente, quando há uma mordedura de um roedor num humano, “sobretudo alguns ratos e esquilos em África”, explica Celso Cunha.
O virologista revela que a maioria dos casos que têm surgido na Europa e nos Estados Unidos, ao longo dos anos, foram importados, nomeadamente da Nigéria ou do Congo. No que respeita os 14 casos confirmados em Portugal, por agora, existem muito poucos dados e, como sublinha Margarida Tavares, “ainda não foi feito um inquérito epidemiológico a estas pessoas”.
Assim, “apesar de, nos primeiros casos, não parecer ter havido viagens a África”, ainda não se sabe quem foi o paciente zero nem onde é que este apanhou o vírus.
Apesar de, nos primeiros casos que surgiram em Portugal, não parecer ter havido viagens a África, ainda não se sabe quem foi o paciente zero nem onde é que este apanhou o vírus.
Outra coisa que os especialistas também não conseguem dizer já é se estas pessoas constituem uma única ou várias cadeias de contacto. “As suspeitas surgiram em diferentes locais, não apareceram todos no mesmo sítio, não se perguntou a todas as pessoas as mesmas coisas. As amostras foram enviadas naturalmente e agora é que estamos a tentar reunir a informação”, explica Margarida Tavares.
Segundo Celso Cunha, estes surtos podem também estar a surgir devido ao facto de a maioria das pessoas mais jovens ter nascido após a varíola ter sido declarada como doença erradicada pela Organização Mundial de Saúde.
“A vacina da varíola, em parte, também protegia para este vírus. As pessoas nascidas depois da erradicação da doença já não foram vacinadas, não estando imunes de qualquer forma, quer à varíola propriamente dita quer à monkeypox”.
De facto, entre os casos confirmados e os casos suspeitos que se conhecem, até agora em Portugal, as pessoas afetadas são homens jovens, entre os 20 e os 40 anos.