O padrão epidemiológico da Covid-19 mudou. “Embora mantenha uma transmissibilidade muito elevada, há uma menor gravidade de doença e, consequentemente, um menor impacto, quer na resposta dos serviços de saúde quer da mortalidade”, explicou Ana Paula Rodrigues, médica de Saúde Pública do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) esta manhã, na reunião de avaliação da Situação Epidemiológica da Covid-19 em Portugal, no auditório do Infarmed.
Este cenário deve-se, não só, à evolução do vírus como ao elevado grau da cobertura vacinal existente no nosso País.
No entanto, a especialista alertou para a importância em manter a vigilância e conseguir identificar as tendências de evolução do numero de casos, “olhando para as situações que possam ser uma ameaça à Saúde Pública”, como é o caso do surgimento de novas variantes e de uma expectável variação do nível de imunidade populacional ao longo do tempo, “fruto do decaimento da imunidade conferida quer pelas vacinas quer pela infeção”.
Por outro lado, o aliviar das medidas de saúde pública conduzirá a “uma impossibilidade em identificar todos os casos de infeção que poderão existir no futuro”. A estratégia de testagem mudará ao longo do tempo e, gradualmente, “o foco de interesse irá mudar para os casos de doença com impacto que na morbilidade, mortalidade e resposta dos serviços de saúde”, assegurou a especialista.
Sistema integrado de vigilância de infeções respiratórias
Perante esta mudança de foco, e tendo em conta que a característica mais premente da infeção por SARS-CoV-2 são os problemas respiratórios, a proposta da especialista é “olhar com maior detalhe para este quadro clínico de infeções respiratórias, de maneira a conseguir uniformizar ao longo do tempo aquilo que vamos observando”.
Uma vez que existem outros agentes respiratórios com quadros semelhantes aos da Covid-19 e com igual potencial epidémico e sazonal, o INSA propõe vigiar também esses agentes, como a gripe ou o vírus sincicial respiratorio, através de um sistema de vigilância de infeções respiratórias.
“Com este modelo teremos uma potencial capacidade para monitorizar a incidência ao longo do tempo, caracterizar e monitorizar a gravidade das diferentes infeções, identificar fatores de risco para a doença grave, identificar novas variantes e estirpes não concordantes com a vacina sazonal, estimar e monitorizar a efetividade de vacinas existentes e novas, bem como de medicamentos antivirais e identificar padrões anormais na ocorrência das infeções respiratórias, que podem dever-se a novos agentes desconhecidos”, avançou Ana Paula Rodrigues..
Com representatividade nacional e regional, o modelo proposto pelo INSA promete ter uma “ elevada capacidade para identificar o número de casos de doença na população em observação, permitir a completa integração das componetnes clínica, laboratorial e epidemiológica e uniformizar os procedimentos, de maneira a conseguir a comparabilidade de resultados tanto a nível nacional como internacional”.
O modelo terá como parceiros as unidades de saúde, dos hospitais aos centros de saúde, os laboratórios, as ARS, as autoridades de saúde, a DGS, o INSA, os serviços partilhados do ministério da saúde e a administração central do sistema de saúde, “com colaborações, em diversos momentos com a academia, farmácias comunitárias e com o setor social e privado”.
Embora o modelo se concentre nas formas mais graves de doença, esta será “a ponta do iceberg que vamos ver”, segundo Ana Paula Rodrigues. “É importante vigiar todo o espetro destas infeções, de maneira a ter uma perspetiva global, das formas assintomáticas à mortalidade”.