Os governadores estaduais dos Estados Unidos da América (EUA) já receberam indicações da Casa Branca para se prepararem para começar a vacinar crianças entre os 5 e os 11 anos de idade no próximo mês.
De acordo com as declarações de uma fonte da Casa Branca à imprensa norte-americana, é previsível que a vacina da Pfizer para este grupo etário seja aprovada pelo comité consultivo da Entidade Reguladora para os Alimentos e os Medicamentos (FDA) já no dia 26 de outubro.
O pedido formal de aprovação foi apresentado pela fabricante alemã de vacinas e pela farmacêutica norte-americana à FDA a 7 de outubro, após terem sido enviados os resultados de ensaios de fase 2/3, conduzidos em 2268 crianças entre os 5 e os 11 anos, que mostraram que a vacina é segura e induz resposta imunitária nesta faixa etária.
As vacinas que serão usadas para os mais novos foram criadas especificamente para serem dadas a crianças, uma espécie de versão pediátrica, e não são permutáveis com as dos adultos, que têm diferentes requisitos de dosagem e diluição.
Apesar de ainda não ter sido submetido um pedido formal à Agência Europeia do Medicamento (EMA) e de não existir nenhum posicionamento oficial nem das entidades de saúde europeias nem das nacionais, “é evidente que o assunto tem sido discutido na comissão [técnica de vacinação]”, revela o epidemiologista Manuel Carmo Gomes.
O tema é delicado e Carmo Gomes defende que é cedo para afirmar com toda a certeza que o benefício de vacinar crianças tão pequeninas seja significativo ou mesmo superior ao risco. “A avaliação da administração de vacinas em massa deverá ser feita com base numa análise de benefício – risco e isso não está feito, porque não há informação suficiente”.
Há benefícios em vacinar crianças entre os 5 e os 11 anos?
“Do ponto de vista das crianças muito pequenas, não é nada óbvio que haja um benefício claro”. Segundo Manuel Carmo Gomes, a Covid-19 em crianças com menos de 12 anos caracteriza-se por ser “muito benigna”, registar uma grande percentagem de assintomáticos e acabar por induzir nos infetados uma memória imunológica “que os protege até melhor do que uma vacina”.
“Os eventuais benefícios, parece-me que estariam mais do lado da sociedade do que das próprias crianças”, afirma. E explica: “É evidente que, se vacinarmos esse setor da população, cerca de um milhão, vamos contribuir para interromper a circulação do vírus, mas a pergunta é se isso se justifica, com a situação epidemiológica que temos neste momento”.
E quais são os riscos?
Quando falamos de riscos, Manuel Carmo Gomes, considera que, por agora, estamos ainda a entrar num campo muito desconhecido. Sem países a vacinar em massa os menores de 12 anos, as informações existentes vêm de ensaios clínicos com alguns milhares de participantes. “Registar a ocorrência de eventos muito raros como, por exemplo, miocardites, requer uma vacinação em massa de milhões de crianças”.
Qual a proposta sustentável para o futuro?
Perante as dúvidas e enquanto Portugal e a Europa aguardam um eventual pedido formal da Pfizer para a aprovação da vacina em crianças entre os 5 e os 11 anos, Carmo Gomes sublinha a necessidade de pensar a longo prazo, até porque “vamos todos encontrar o vírus, tem uma contagiosidade tão grande que vai continuar a circular durante, pelo menos, alguns anos”.
O especialista acredita que quem tinha de ser vacinado já foi e defende que, se o vírus circular com uma baixa carga viral na população, “como está a acontecer neste momento”, e de vez em quando o formos encontrando, estando já protegidos, “talvez isso seja mais inteligente como estratégia a longo prazo”, pois permite, a quem está protegido com a vacina, reforçar a memória imunitária através do contacto com o vírus.
A ideia é, assim, vacinar os maiores de 12 anos, dar um reforço aos que têm mais de 70 e “deixar o vírus circular dentro do resto da comunidade que não vai apanhar doença grave em vez de andarmos a dar um reforço às pessoas com menos de 65 anos e a vacinar crianças abaixo dos 12”.
“E depois, daqui a um ano ou dois estamos a fazer o quê? O mesmo? Isso seria muito interessante para as companhias que vendem vacinas evidentemente, mas será o mais inteligente? Eu penso que não é”.